Achei que esse fosse ser um episódio sobre a C.C, que alguns mistérios sobre ela seriam esclarecidos, que aprenderia um pouco mais sobre o Geass, etc. Que nada, eu, como Lelouch, quedo frustrado ao final desse quinto episódio sem ter aprendido uma miserável coisa nova sobre a garota, o poder que ela deu ao protagonista ou seu papel na história.

Esse episódio no fim das contas foi uma longa e pedante reafirmação da cena entre Lelouch e Suzaku no episódio anterior, onde ambos rejeitaram completamente a posição um do outro e se posicionaram em fortalezas ideológicas completamente distintas. Claro que o episódio não ficou só neles. Foram apresentadas diversas outras oposições, de todas as naturezas e envolvendo toda sorte de diferentes pessoas. E isso, no fundo, só fez brilhar mais os holofotes sobre aquela dupla principal: Lelouch e Suzaku. Suzaku e Lelouch.

Os dois, que já viveram juntos quando crianças, que já foram praticamente irmãos, se reencontraram apenas ao final do episódio, de forma quase acidental – e construída para ser um gancho para os próximos acontecimentos. A ser como foi com a C.C, não é necessariamente um gancho para o episódio seguinte. Mas essa cena foi pouco importante. A cena que reafirmou as diferenças entre os dois ocorreu bem antes e eles sequer estavam juntos. Foi esse o papel da C.C e da Euphemia nesse episódio: servir de ouvinte para seu respectivo interlocutor enquanto ele faz seu monólogo, montado como se fosse um diálogo, expondo suas convicções e sua determinação.

Os dois percebem corretamente o problema que assola o mundo: os conflitos. Mais especificamente, os conflitos militares. Mas convenhamos que não é preciso ser nenhum mestre enxadrista, filho de Primeiro Ministro ou um sábio bidu para perceber isso, né? Não enquanto age livremente um império xenófobo, militarista, que controla um terço do mundo e continua suas guerras de expansão. E eles chegam a respostas diametralmente opostas: Lelouch conclui que pode acabar com todas as guerras se for ele a vencer a guerra (o que significa derrotar seu pai, com todas as implicações culturais que isso tem, conforme discuti longamente no artigo sobre o episódio anterior). Suzaku não sabe ainda qual é a resposta, mas ele sabe que não é o conflito. Não conseguiu colocar isso em palavras mas expressou em ações nesse mesmo episódio, enquanto intervia para impedir outro conflito.

A primeira vez que Suzaku salva Euphemia

Jeremiah, vítima do Lelouch no episódio anterior, sabia que seu prestígio havia escorrido todo pelo ralo. Incompetente seria o que achariam dele se ele tivesse sorte, mas sorte ele não teve: achavam que ele era suspeito, sabotador, traidor mesmo. Pelo menos essa era a opinião entre os membros de sua própria facção, os puristas (eufemismo para extremistas xenófobos). Kewell, outro purista, guiou Jeremiah até uma armadilha. Com o alarme falso de que Zero estaria lá, Jeremiah foi até Shinjuku apenas para ser cercado por Kewell, que pretendia matá-lo – e o teria feito, se Suzaku não tivesse impedido. Mas antes que se engane pensando que o anime está colocando realmente um dilema ao apresentar o conflito ideológico entre Lelouch e Suzaku, não perca seu tempo: enquanto Lelouch age nas sombras e é capaz de enganar a própria irmã mais nova, cega e cadeirante, Suzaku salva quem era até o dia anterior seu maior algoz, que está sendo ameaçado por alguém tão insano quanto ele. Alguém capaz de, ainda que acidentalmente, quase matar a doce princesa Euphemia, a primeira membra da família real que não está no anime para nos fazer grunhir de ódio, muito pelo contrário. Suzaku nessa cena é, literalmente, o Bem. Por contraste, Lelouch só pode ser o Mal, certo?

Para quem conhece o trabalho do CLAMP, que assina o character design de Code Geass, não é nenhuma surpresa, a essa altura, que o Suzaku tenha o traço do Shoran, o eterno herói abnegado, o príncipe no cavalo branco de Card Captor Sakura e Tsubasa Reservoir Chronicle. Ele provavelmente não é o mocinho de Code Geass, porque não é o protagonista, mas é, sem dúvida, o representante de tudo o que é bom, belo e justo nessa história. A menos que hajam reviravoltas mirabolantes no enredo, será Suzaku a bússola moral até o fim. E faz sentido que ele próprio não esteja certo sobre o que fazer.

A segunda vez que Suzaku salva Euphemia

Code Geass é, como eu disse no começo desse artigo, pedante. Doutrinário, ele precisa apresentar um personagem com quem o espectador consiga se relacionar. Todo personagem aqui parece estar certo demais em seus próprios erros para que isso seja possível. Não que não seja possível se identificar com o Lelouch, mas isso só vai acontecer, de verdade, com quem já pensar de forma mais ou menos igual a ele. Para todos os demais casos, para todas as demais pessoas, a maioria das pessoas, o Lelouch não serve senão como alguém exótico e, vá lá, divertido de se assistir. Mas poucos o seguiriam ou agiriam como ele se estivessem em suas roupas. A verdade é que a maioria das pessoas estaria indecisa, em conflito interno, se estivesse em situação desse tipo. Por um lado é inequívoco que Britannia é o agente maligno que causa dor e sofrimento ao resto do mundo, mas por outro lado poucos teriam sangue de barata de crer que, contra um mal de dimensões colossais, qualquer mal menor ou equivalente está justificado. Mesmo assim, o que fazer? Qual é a solução? Essa é a dúvida de Suzaku. E sem perceber, ele já deu a resposta.

Euphemia que se cuide. Ela foi literalmente a princesa em apuros que o heroico Suzaku salvou nesse episódio sem esperar nada em troca não uma, mas duas vezes. O anime está apenas no começo e ela está firmemente plantada do lado oposto ao de Lelouch. De quebra, pertence à família real e é a próxima na linha sucessória do governo japonês. Sendo esse um anime tão descaradamente formulaico, eu não apostaria que ela viva por muito tempo. Suzaku pode já ser um herói, mas ele ainda precisa ser humano. Um hipotético sacrifício da Princesa Euphemia serviria muito bem a esse propósito – e de quebra tornaria pessoal o conflito entre Zero/Lelouch e Suzaku, construindo um abismo intransponível entre eles.

  1. Eu sinceramente, eu estou hesitante em rever o Code Geass R1, à uns anos quando o vi, não reparei na enorme quantidade de erros que ele tinha, eu gostei dele como ele era. Mas agora, contigo a fazer os artigos sobre a primeira temporada, o meu medo, é verdadeiro, eu confio bastante no teu sentido critico e pela nota que deste a este episódio, acredito que nem tudo neste anime é épico, como eu pensei à 8 anos atrás, quando me tornei fã a sério de anime e cultura japonesa em geral. Mas só tenho uma coisa a dizer, o Lellouch vai sofrer muito nesta primeira temporada, a golpada maior nele, vai acontecer no final do anime, mas não me vou alongar para não dar spoiler. E falando em spoiler, o teu poder de adivinhar o que vai acontecer nos episódios é assustadora, o último parágrafo do artigo é muito perigoso em termos de spoilers.
    Como sempre mais um excelente artigo Fábio.

    • Fábio "Mexicano" Godoy

      É um anime bem legal sim, mas quando falamos das profundezas da psiquê humana ele não passa da superfície. Na verdade mal chega até ela. Os personagens, as organizações, as situações do anime são todas irrealisticamente formulaicas, convenientes, clichê mesmo. Mas é divertido sim. Esse episódio em si recebeu nota apenas mediana porque ele claramente foi apenas reforço do anterior, mas mesmo assim foi legal conhecer a retardada da princesa Euphemia.

      Aliás, Euphemia. O nome dela. Seria um plot twist ele NÃO TER significado. Vou ficar de olho!

      Obrigado pela visita e pelo comentário!

      E assista Code Geass sim 😉

      • O único episódio que eu poderia ter criticado acerrimamente, já o comentaste na semana passada, aquela cena de fanservice entre a Karen e o Lellouch, onde o mesmo vê a a Karen nua no banho. E tens razão, a primeira temporada, tem muitas situações super convenientes, algumas situações são muito favoráveis para um dos lados e vice-versa. Nem me fales da princesa Euphemia eu não gostei nada dela no anime, isso e o cavaleiro da armadura branca dela o Suzaku. Das filhas do Imperador Charles só gosto da princesa Cornelia li Britannia, além de uma grande mulher uma excelente soldado e superior dos seus homens.
        Semana que vem vou tentar ver o episódio que vais fazer o aritgo. Será que o blog vai aguentar um textão, sem o cortar, vamos ver.

      • Eu no inicio também não gostei dela, mas lá para a frente ela, vai se tornar uma personagem muito boa e admirável. Eu até gostava da Euphemia como personagem no inicio, ingénua, simpática e uma princesa que se preocupava com os outros. Só quando ela se juntou, ao inútil do Suzaku que ela fica um personagem quase execrável. Acho que já apareceu, pelo menos umas 5 vezes nesses episódios que já viste, a Shirley vai ser a melhor personagem feminina, junto da Karen (esta boba, tem sentimentos pelo maior vilão daquele mundo).

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