Um episódio bem decente para variar. Achei que a Princesa Euphemia fosse bater as botas nele, mas ainda não chegou a hora. Sim, tenho certeza que ela vai morrer e não, não li nada sobre a história para saber disso. É uma conclusão lógica minha desde o episódio em que ela apareceu – e insisto nela. Ela precisa morrer para alargar a fenda que está se formando entre Zero (que Suzaku não sabe ser Lelouch) e Suzaku (que Lelouch não sabe ser o piloto do Lancelot). Mas Euphemia não tem apenas um papel instrumental. Ela tem dois papéis instrumentais: é também a contraparte da Cornelia, assim como Suzaku é a contraparte do Lelouch. Assim sendo, a Cornelia deve morrer antes. Ou talvez não, já que isso eliminaria um inimiga potencial formidável para o Lelouch. E uma que ao mesmo tempo é mais fácil de desenvolver, está “do outro lado” (é uma britaniana, afinal), e terá a empatia do público – a irmãzinha dela foi morta! E por alguém que diz querer proteger a própria irmãzinha, não menos!

É uma teia de relações simples e construções propositalmente antagônicas que nesse episódio funcionou muito bem. Não à toa um episódio onde os quatro estiveram presentes e ativos. E deixou um pouquinho mais claro como eles tentam racionalizar suas escolhas mas são muito mais humanos do que demonstram.

A informação mais importante revelada nesse episódio foi o cuidado que a Cornelia sempre teve com a Euphemia, que revela seu amor fraternal. Ela é durona até mesmo com a irmã cativa e sob risco de vida, mas não consegue esconder que está sim abrindo uma exceção. Provavelmente a maioria dos seus subalternos vai entender isso como a necessária defesa do sangue real, mas não é só isso. Porque nem mesmo a família real se importa com as vidas uns dos outros, isso é algo que o Lelouch descobriu de forma muito dolorosa e agora faz sentido aquela altercação oral completamente deslocada do resto do episódio entre o então menino Lelouch e seu pai imperador: aquele foi o momento em que se revelou que a sucessão ao trono é muito menos burocrática e muito mais uma espécie de battle royale. Britannia favorece a sobrevivência do mais forte, afinal.

Cornelia tem que ser forte

Talvez meros soldados não entendam isso mas Lelouch já entendia muito bem desde criança. Uma princesa como Cornelia com certeza também entende. Tiro disso que seu comportamento implacável, sua disciplina à favor dos interesses do Império e seu puro poder não são senão meios de proteger a própria família: Euphemia. A princesinha é incapaz de pisar em uma flor, como ela conseguiria sobreviver sozinha? Aí entra Cornelia: basta que ela seja forte pelas duas. O que ela não percebe é que Euphemia é muito forte também, mas a seu próprio modo.

Mas como não querer proteger essa coisinha fofa? Eu te perdoo, Cornelia

Nesse mundo super-simplista de Code Geass é um modo que soa pura burrice, mas mesmo assim deve-se admitir que, no mínimo, Euphemia é uma pessoa muito corajosa. Ela já havia demonstrado esse tipo de força antes e nesse episódio não resta mais espaço para dúvidas. Acredito que ela saiba que tudo o que a irmã faz é para protegê-la, se sinta grata e ao mesmo tempo em dívida. Talvez ela até considere que a Cornelia está de algum modo “presa” a esse estilo de vida por culpa dela, e luta para tentar “livrá-la”. Talvez essa venha a ser sua perdição.

É por isso que a Cornelia se preocupa com a Euphemia…

Lelouch diz à sua recém-formada Ordem dos Cavaleiros Negros, e depois ao mundo todo, que sua luta é por justiça. Mas ele próprio sabe que não é isso. No fundo é apenas vingança contra seu pai e a família real. Mesmo que ele acredite de verdade que o “problema” é o próprio Império e por isso ele deve ser derrubado, ainda assim ele não está lutando por justiça. A não ser que acredite no mesmo tipo de justiça que seu pai, não é? A Lei do Mais Forte. O que não é o caso. É tudo vingança.

Meio Zero, meio Lelouch, quem na verdade?

Cada dia que ele volta para casa e vê Nunnally presa a uma cadeira de rodas e cega ele se lembra do fatídico ataque do qual foram vítimas ainda tão jovens, no qual sua mãe veio a perecer. Se lembra que seu pai não deu a mínima, e pior, os enviou mais uma vez para a morte. Esse ódio molda seu caráter. Supera até mesmo seu desejo provavelmente sincero de proteger Nunnally (que o torna semelhante à Cornelia) e por fim o transforma na existência perturbada que é Zero, sempre dizendo uma coisa e pensando outra.

A memória horrível que Lelouch não consegue esquecer, não pode esquecer, não quer esquecer

Seu antípoda é, lógico, Suzaku. Teve o pai assassinado, o país invadido, a nacionalidade e identidade cultural apagadas, e mesmo trabalhando para seus algozes ainda assim não é reconhecido. E diante de tudo isso, com mais motivos para odiar do que Lelouch, que não é seu irmão mas provavelmente cresceram juntos durante um tempo como se fossem, ele não odeia ninguém. Escolhe o caminho do perdão, escolhe tentar pacificar os diferentes de duas formas: sendo um exemplo ele próprio de que a convivência é possível e fazendo de tudo para apaziguar ânimos e resolver conflitos da forma que menos causar danos que conseguir. Assim como Euphemia, nesse mundo em que vivem o que ele deseja é no mais das vezes impossível.

Não está feliz com sua escolha, Suzaku?

Como ambos são personagens-espelho, criados apenas para servir de contraste a Lelouch e Cornelia, é compreensível que sejam menos desenvolvidos, façam menos sentido e assim sejam menos queridos pelo fandom de Code Geass. Mas ele também é humano e, para seu objetivo, se sujeita a coisas que o fazem tomar decisões difíceis. Como assim ele faz parte de uma organização e deve se ocupar em seguir suas regras antes de se preocupar com seus amigos? Aquilo foi só da boca pra fora. Ele só queria convencer os outros enquanto disse aquilo – e queria convencer a si mesmo também, porque ele realmente acredita que esse é o melhor caminho. Mas assim que teve a oportunidade atacou feroz, totalmente disposto a tudo o que estivesse a seu alcance para salvar seus amigos. Enfim, esses paralelos simples entre os personagens principais tornam Code Geass mais semelhante à especialidade de Lelouch: o xadrez.

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