Antes de Ange e Dorothy aparecerem, a princesa só tinha uma amiga: Beatrice. Dado que as duas na verdade eram espiãs enviadas atrás da princesa, é apenas natural que Beatrice seja contra essas novas “amizades” e fique desconfiada das outras duas o tempo todo, sendo super-protetora com relação à princesa e quase se tornando inconveniente.

Mas ela não é apenas uma garotinha aristocrata vitoriana mimada. Ela é aquela personagem que assustou todo mundo com aquele vozeirão masculino ao telefone no primeiro episódio, lembra? E sua história de vida é bem pouco aristocrática e muito steampunk.

É isso que queremos de Princess Principal, não é? Se é um anime steampunk, quero dizer. Motores a vapor (e à carbonita, que é tipo um carvão verde superpoderoso e com propriedades antigravitacionais), cartolas, e cientistas loucos que fazem experimentos e transformam a si mesmos e às suas filhas em meio-androides, com partes mecânicas. Sério, a mão do pai dela, o olhar psicopata em seu rosto, o laboratório, tudo aquilo foi genial. Como cicatriz, a pobre Beatrice carrega um sistema mecânico com engrenagens no pescoço exercendo a função que deveria ser de suas cordas vocais. A vantagem é que ela pode modular para a voz que quiser, mas o trauma da operação e de depois dela, quando passou a ser zombada por ser “um robô”, provavelmente não a permitem enxergar isso de forma muito positiva. Ela não vê vantagem nenhuma nisso e sofre inconsolável cada vez que o “presente” de seu pai falha. Ao final de sua primeira missão como espiã, Beatrice foi capaz de superar seu trauma pessoal e usou seu modulador de voz para imitar um agente morto e salvar a si mesma e à Ange.

Assumo que a voz que usa normalmente seja a voz que ela acredita que tinha ou devesse ter sem o modulador – por que ela mudaria? Só porque é uma voz de taquara rachada? É a voz dela e ela gosta assim, ora! E como gosta. Não fiz nenhuma conta, mas tenho quase certeza que ela foi quem mais falou nesse episódio. Mas nada de papo-furado: ela usou seu modulador para vocalizar as fortes opiniões que tinha em relação às espiãs e sua recém-estabelecida relação com a Princesa Charlotte, a única amiga que ela tem, a única pessoa que a aceitou depois da desgraça que seu pai fez em sua vida, a sua salvadora pessoal, e quem ela agora sente que é seu dever salvar. A semelhança de Ange e Charlotte e o fato da espiã ter se disfarçado como se fosse a princesa em uma tentativa frustrada de “acalmar” a garota (querendo dizer que a princesa não precisaria fazer nada perigoso) só a deixaram ainda mais desconfiada. E ela acertou na mosca: o plano original era substituírem Charlotte. Bom, nunca foi o plano de Ange, mas isso ela não sabe e para todos os efeitos, oficialmente esse era o plano.

Beatrice fazendo o que só ela pode fazer pela princesa

Nada melhor que uma missão perigosa junto com a “inimiga” para aplacar as dúvidas, certo? A imprudência de Beatrice quase a matou quando ela se agarrou e foi sugada junto com Ange pelo sistema que reabastecia o tanque de água da nave que Ange iria invadir. Você também chegou a pensar por um instante que aquilo fosse combustível e estranhou quando elas mergulharam no líquido e saíram incólumes (bom, mais ou menos, Beatrice quase se afogou) do outro lado? Espero que não! Quero dizer, de estúpido no mundo já basta eu, porque eu pensei que fosse! Por um instante me esqueci que a fonte de energia das naves não é combustível fóssil líquido, mas sim carbonita.

Essa cena toda berrava “Steampunk!!”

Como visto pela versão portátil que a Ange usa, a carbonita aquece demais quando em uso e precisa ser constantemente resfriada. Como ela não precisa usar sua bolota o tempo todo, e para reduzir o tamanho do dispositivo, ele não tem nenhum sistema de resfriamento acoplado: quando aquece demais deve simplesmente ser desligado e resfriado antes de ser usado de novo. No caso de uma nave de guerra enorme isso obviamente não é possível, então, como em um motor à combustão interna comum, um sistema de circulação de água é usado para resfriar as partes quentes da máquina. A própria água por sua vez precisa ser resfriada em seguida, e em um automóvel isso é feito aproveitando o vento que tão mais forte será quanto maior a velocidade do veículo. Nas naves de Princess Principal isso parece não ser o suficiente e muita água deve se perder no processo, razão pela qual precisam reabastecer. Ou talvez nem tenham pensado nisso tudo quando criaram as naves do anime, só acharam que seria legal que elas reabastecessem seus enormes tanques de água assim como locomotivas a vapor – um símbolo steampunk – precisam reabastecer com grande frequência – motores a vapor de fato perdem água, que é o próprio vapor que movimenta o sistema. Enfim, tudo isso pra dizer que, com certeza absoluta, aquilo era água, e isso é tematicamente adequado e divertido.

Gosta de nadar?

Ange não deixou que a preciosa amiga da princesa morresse. O motivo que ela repetiu mais de uma vez era mais do que o suficiente – se a Beatrice fosse pega na nave, eles iriam chegar até a princesa. Mesmo se ela fosse encontrada já morta – e portanto, incapaz de denunciar alguém – conseguiriam através de investigação descobrir seu vínculo com a quarta na linha sucessória ao trono. Mas acho que não fui só eu que fiquei com a impressão que Ange estava preocupada com mais do que apenas isso, ou fui? Ela sabe que a morte de Beatrice entristeceria a princesa. E aposto que a própria Ange não gosta de matar ou ver morrer pessoas boas.

Na verdade, a Ange não gosta sequer da ideia de ser uma espiã. O plano dela era reencontrar Charlotte e fugirem para longe. Estava tudo acertado já. Mas a princesa não achava isso suficiente. Ela pretende realmente consertar o Reino, talvez reunificá-lo, e derrubar o muro que, em primeiro lugar, separou as duas. E com certeza separou muito mais gente, muitos amigos e muitas famílias. Será que Ange está pronta para isso? Ela é desde o começo uma espiã muito competente, e aposto que mataria sempre que necessário, mas entre fazer o que tem que ser feito e viver com a consciência limpa por causa disso há uma grande diferença. Charlotte é irredutível: ela quer se tornar rainha. Ange acaba concordando a contragosto, e é esse o momento que sua compulsão por mentir começa.

Ange e Charlotte discutem o que fazer após o reencontro

Como eu já escrevi antes, de tanto mentir, e pela forma como mente, Ange é na verdade a mais honesta de todas, incapaz de ocultar seus sentimentos e intenções. Beatrice percebeu isso enquanto desciam de para-quedas e, logo depois da queda, no bucólico interior inglês, em meio à ovelhas e cobertas pelo tecido do para-quedas, afirmou de forma serena: “Você é uma mentirosa, Senhorita Ange”. Ange havia acabado de gritar que odiava a princesa.

As diferenças entre elas caíram significativamente após esse episódio

  1. Este episódio finalmente esclareceu as dúvidas que eu tinha sobre a Beatrice (diga-se de passagem que o fez muito bem). Eu desde do episódio 1, que achava que a forma como a Beato modificava a sua voz não era muito normal (como uma garota mesmo imitando uma voz de homem, nunca na vida conseguiria imitar a voz de homem que a Beato usou no episódio 1).
    Claro que tal capacidade de imitar vozes da Beato, teria que ter uma história trágica pelo meio. Naquela parte do flashback da Beatrice, onde o pai dela, com olhos de loucura, lhe modifica as cordas vocais, pai que usou a filha como cobaia numa das suas experiências macabras (nesta cena, tive um pequeno dejá vu, que queria esquecer, mas infelizmente fui relembrado, graças à tua sequência de comentários irónicos nas três primeiras imagens do artigo).
    Depois desse pequeno flashback, é que comecei a entender melhor, a amizade e sentido de protecção que a Beato tem com a princesa Charlotte (eu sempre pensei que a Beato fosse uma nobre mimada, mas aquele passado dela foi bem pesado). Se bem que a princesa é tudo menos parva, mas é sempre bom ter um súbdito leal a seu lado. Questiono-me se a Beato não poderia fazer uma voz normal mais agradável, é que às vezes aquela voz estridente dela incomoda um pouco.
    A cada episódio que passa, fico cada vez mais pasmo, com a tecnologia que o anime apresentada no anime. Aquela carbonita é algo muito interessante, parece até o carvão que impulsionou a primeira revolução industrial sob esteróides. Aquela nave que apareceu no episódio (e que teve algumas das melhores cenas, que eu vi num anime nos últimos tempos), faz-me questionar se os cientistas e os militares não foram longe demais. Em termos de engenharia, aquela nave seria uma conquista enorme, mas um pesadelo em termos de manutenção e dispendiosa em termos de troca de peças e consumo de água e carbonita.
    Por falar na nave, os soldados que estavam dentro dela, ou são muito burros, ou então não sabem o que fazem. Como demónios eles têm dentro de uma nave, canhões de defesa costeira e ainda por cima disparam um para derrubar uma porta (nem mil facepalms conseguiriam transmitir o que senti nessa cena). Além de outras atitudes estúpidas dos soldados ao longo do anime, como aquele que disparou uma metralhadora montada pesada Gattling, contra a Ange, mas só acertava os tiros nas asas da nave e nem sei como ele não danificou as asas da nave (deve ter sido o poder do roteiro só pode).
    Voltando mais uma vez à nave, aquele sistema de armazenamento de água (que eu julgava que fosse para combustível fóssil) gerou uma das cenas mais interessantes do episódio, por momentos achei que a Beato fosse morrer afogada (tudo culpa da ignorância dela aos avisos da Ange). Aquela cena, depois que a Ange e a Beato saem daquela cisterna, foi a parte que mais gostei do episódio. A Beato já fazia um bom tempo que merecia ouvir um sermão, ela mereceu o aviso que a Ange lhe deu quando lhe apontava uma arma, afinal o que importa mais, a segurança da princesa ou as cismas que a Beatrice tem pela Ange, claro que a desconfiança está lá, mas o mais importante era a missão.
    Aquela parte onde a Ange e a Beato ficam encurraladas na sala onde o cientista estava, foi muito boa. Foi nessa parte que a Beato percebeu o quão leal a Ange é para princesa, além que quase rendeu uma segunda cena de tiro de canhão (mas por sorte a voz da Beato é muito útil nessas situações).
    Aquela parte, em que a Ange e a Beato saltam da nave, foi muito bem feita em tudo, desde do seu simbolismo à sua animação (nem imagino o trabalho que o estúdio teve nessa parte, mas valeu a pena).
    Antes que me esqueça, não posso deixar de referir os dotes de sedução da Dorothy, ela engana qualquer homem com quem se cruza e ainda dá uma risada de desdém depois de enganar os coitados.
    Achei bem fora do normal aqueles soldados da nave, usarem uniformes da marinha, os pilotos por norma dos três ramos das forças armadas eram os únicos que usavam um casaco de cabedal (o que faz sentido, já que naquela altitude onde a nave voava, já fazia bastante frio, mas ignoro essa falta de atenção que quem fez o anime teve).
    Como sempre, mais um excelente artigo de Princess Principal Fábio.

    • Fábio "Mexicano" Godoy

      O divertido sobre a Beatrice é que, na prática, ela tem “vários dubladores”, hahaha! Mas gostei, no final das contas ela é uma personagem bastante simples e que vai apoiar a princesa até o final. Suponho que continue apoiando a princesa mesmo se e quando descobrir que ela não é a Charlotte de verdade. Quero dizer, se ela pode apoiar que a princesa esteja na prática traindo o próprio país, todo o resto deve ser fácil. Só a chocaria se a princesa a traísse, mas não vislumbro hipótese disso acontecer.

      (e desculpa pela referência à Fullmetal Alchemist, só achei que tinha muito a ver, considerando que aquele também é um mundo steampunk – embora com menos aço e vapor e com mais magia)

      Sobre a nave, bom, talvez existam modelos menores e mais ágeis, menos dispendiosos, não? Mais ou menos como existem navios militares de vários tamanhos para várias funções especializadas. Se bem que na abertura do primeiro episódio pareceu que todas as naves eram iguais, mas vamos ver ainda, né.

      Sobre a tripulação da nave em si … é, eles foram bastante … para não chamá-los de estúpidos, vou escolher, hmm, imprudentes? Temerários? Ok. A tripulação da nave foi bastante imprudente e temerária. Me pergunto para que eles precisam de metralhadoras em uma nave tão grande em primeiro lugar, até onde entendi as demais nações ainda não dispõe de forças aéreas (o avião tradicional ainda não deve ter sido inventado), e para disparar contra alvos no solo aquela nave em particular é grande demais, caso se aproximasse ficaria desnecessariamente exposta. Aquela nave obviamente é um gigantesco bombardeiro – nem canhões deveria ter, mas vá lá, suponhamos que eles bombardeiem com tiros tensos (???). Enfim, são incompetentes, possuem armamento inadequado, e por isso foram derrotados – o que é muito conveniente para o enredo. E de pensar que é _isso_ que “domina” o mundo… dá para entender porque a Comunidade se separou, suponho.

      Mas o episódio valeu o que valeu pelo desenvolvimento da Beatrice e de seu relacionamento e confiança com a Ange ao longo do episódio. Nada a reclamar naquilo que realmente importa.

      Obrigado pela visita e pelo comentário =))

      • Dos 64 episódios de Fullmetal Alchemist Brotherhood, só um episódio me deixou sem palavras e foi esse cuja referência citaste numa das imagens do artigo. Fullmetal tem muita inspiração nos países da Europa no século XIX (principalmente a Alemanha), tem alguns elementos steampunk, como os famosos trens movidos a vapor e mesmo os automails (mas em todo o resto é a alquimia que ocupa grande parte do anime).
        A nave do episódio fez-me lembrar das aeronaves gigantes que a Alemanha tinha em 1930 (monstros de aço com 4 motores) e estas mesmas naves alemãs também apareceram num trecho do excelente filme do Ghibli Kaze Tachinu. Mas a versão desta nave em Princess, é extremamente exagerada. Pelo tamanho dela só serviria mesmo para ser usada como bombardeiro, esta ficaria muito exposta em missões de reconhecimento devido ao seu tamanho. Aquelas metralhadoras não serviriam na pratica e que sentido faz levar canhões de defesa costeira dentro da nave (só se tal nave fosse um híbrido, no ar serve como avião e na água como navio, é a única hipótese que faz sentido para mim).,E os soldados foram burros, bastava um tiro acertar na parte fraca da fuselagem e a nave ficava gravemente danificada. Além que aqueles soldados são muito mal treinados, disparar um canhão dentro de uma nave já foi grave, mas fazer um disparate desses, quando a nave está em pleno voo é o cumulo da burrice.
        A Beato vai melhorar, e acredito que quando ela descobrir a verdade sobre a princesa, ela vai permanecer ao lado dela.

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