Miss Shachiku and the Little Baby Ghost – Burnout romantizado? – Primeiras impressões
Miss Shachiku and the Little Baby Ghost (Shachiku-san wa Youjo Yuurei ni Iyasaretai.) é um anime do estúdio Project No.9 que adapta o mangá de Imari Arita. Segue abaixo a sinopse extraída da Crunchyroll (o streaming oficial do anime).
“Certa noite, quando a sra. Fushihara, uma escrava corporativa, trabalhava até tarde da noite, ela ouviu uma estranha voz lhe dizendo “vá pra casa!”. Logo ela percebe que a viz vinha de uma pequena fantasminha! A fantasminha quer que a sra. Fushihara vá para casa para preservar sua saúde, mas a sra. Fushihara quer continuar na firma porque achou a fantasminha fofa demais. Uma história fofa e aconchegante sobre duas pessoas (ou uma pessoa e uma fantasma).”
Não foi só impressão minha, né, esse anime propõe uma solução paliativa para um problema sério e que talvez não devesse ser tratado dessa forma leniente mesmo na ficção. E nem falo de fantasmas, serve para qualquer desculpa para seguir no escritório até a madrugada.
Porque, em nenhuma instância, a permanência no trabalho nessas circunstâncias deveria ser incentivada/romantizada, mas é o que acontece aqui. Sei que isso acontece muito para propor uma inversão de expectativa cômica, mas a mim não fez rir muito.
Digo, como rir se a Fushihara só se afunda no trabalho, não vai para casa para preservar a saúde como a fantasminha quer, fazendo o contrário, ganhando uma força que não tinha devido a fofura da fantasma. Que é lindinha de morrer, o que a protagonista fará se continuar assim.
Mas claro, nem tudo é ruim nesse anime. Na verdade, eu diria que ele seria perfeito se, por exemplo, a fantasminha não estivesse no trabalho, mas em casa, agindo como um motivo para que ela saísse mais cedo do trabalho para ter esse cuidado, talvez até trocasse de emprego.
Porque, convenhamos, quais as chances da vida dela mudar se continuar nessa firma? Agora que ela tem esse motivo para fazer hora extra é que não vai largar o osso e morrerá de burnout mais hora menos hora. Ao menos seria esse o caminho natural em uma história séria.
Não que essa história não seja séria, mas ela foi planejada com base nos parâmetros errados. Quando a ficção se propõe a não indicar uma alternativa, mas chafurdar no conformismo e até banalizar certas práticas nocivas, é de se frisar que essa ficção é sim problemática.
Ainda assim, dá para curtir o anime? Eu acho que sim, não é o nosso que está na reta mesmo, e a fantasminha é uma fofura total. Ela me surpreendeu por não ter como objetivo primário cuidar da Fushihara, mas isso ter sido algo que ela decidiu fazer por si mesma.
Inclusive, as melhores cenas desse anime sempre a envolvem, seja quando ela está cuidando diretamente da protagonista, seja quando está pensando em formas de aliviar a barra para ela. Aliás, que fantasminha poderosa, hein? Ela consegue tocar e mexer nas coisas.
E não só isso, ela fala de maneira audível também, não é uma “fumacinha” fraquinha, mas um espírito contundente e que é visível o suficiente para justificar os rumores, como também para ter sido pega. Será que ninguém vai ao depósito ou quando vai ela se esconde?
Em todo caso, não sabemos de onde ela vem e para onde vai (se vai para algum lugar), só que a empresa é o seu habitat e que a Fushihara teve sorte, e ao mesmo tempo azar, por tê-la encontrado, afinal, tem algo que a anima, o problema é que esse algo a destruirá a longo prazo.
Sei que não é a intenção da fantasminha, é culpa da heroína que não tem noção das coisas e parece bem à vontade para ser explorada, o que pode parecer absurdo vendo assim em um anime, mas não se engane, ocorre na vida real. Tirando a fantasma, o resto não é tão ficção…
Conhecendo a fama dos salarymen (nesse caso, salarywomen), diria que é bem crível alguém que fica até de madrugada na empresa e recebe mais trabalho do chefe do que sua carga horária poderia contemplar. Não seja como a Fushihara, aprenda ao menos isso com esse anime.
Voltando a trama, gosto da troca de ponto de vista da Fushihara para a fantasminha, da interação entre elas (certamente a melhor coisa do anime) e da gentileza da fantasminha; tanto que entendo as reações da protagonista, meu problema é com o cerne da questão.
Se você não trabalha ou não liga para essas histórias que “passam pano” para excesso de trabalho (e claro, gosta de slice of life) imagino que pode gostar sim desse anime, apesar de em alguns momentos ele ser muito parado mesmo para um slice of life.
Novas fantasminhas vão aparecer, se integrar a trama e prover interações diferentes, as quais duvido muito que não terão o mesmo efeito da abordada nesse primeiro episódio, mas espero encarecidamente que não joguem pela janela qualquer possibilidade de crítica a situação.
Propor uma solução para o problema que não resolve nada é em si um problema, e um que, por mais que seja romantizado, pode ter efeitos nocivos no público. Não, não espere por fantasminhas camaradas se estiver trabalhando demais, se aparecer é porque você já está morto(a).
Por fim, fica o conselho, só veja Miss Shachiku se a premissa não incomodar você depois de uma mínima reflexão, se incomodar não indico. Em Senko-san, que é parecido, pelo menos a Senko não fica no escritório, mas na casa do protagonista. Fica aí uma dica melhor.
Até a próxima!