Ataque dos Titãs: Temporada Final – ep 20 – Pais e filhos
Há duas perspectivas distintas que gostaria de abordar nesse artigo, pois se diferenciam e se interligam de formas bastante notáveis. A primeira é a dos acontecimentos por si mesmos, os quais já são de grande valor. A segunda é a da substância das ideias defendidas pelos personagens, essas que influenciam totalmente em suas atitudes.
Então que comecemos pelas coisas que aconteceram. O episódio inteiro foi sobre o Zeke e o Eren viajando entre as memórias do Grisha Yeager. O objetivo grande objetivo do Zeke com isso era provar para o Eren que ele havia recebido uma lavagem cerebral do Grisha.
Era deixar evidente como todos os seus pensamentos nacionalistas nada mais eram do que ecos da voz de seu falecido pai. Ideia essa que se mostrou completamente falha. É mais fácil acreditar que o Eren influenciou o Grisha em seus atos do que o contrário.
Tanto que o próprio Grisha, tal como o Zeke imaginava, se mostrou um grande mito. As pessoas mudam, mesmo aquelas que você abomina. De todo modo, foi muito interessante poder ver essa mudança acontecendo de forma gradual. Antes o seu objetivo o cegava, tornando-o uma pessoa pior.
É aquela velha história de “Os fins justificam os meios”, coisa que só pode ser dita por alguém que acredita em fins tão imorais quanto os meios que está disposto a usar. Mas novamente, as pessoas mudam.
A finalidade egoísta de um jovem metido a revolucionário foi substituída por uma finalidade digna de um homem que busca acima de tudo a segurança de sua família e de seu povo.
Mas aí ressurge o problema, pois alguém com fins justos não pode fazer uso de meios injustos, ao menos não sem que o seu próprio objetivo seja maculado com este ato. É por esse motivo que o Grisha hesita tanto ao roubar o titã original. Assim como é exatamente por isso que o Eren não hesita em nenhum momento.
Aparece aqui um problema de cunho paradoxal, onde o acesso às memórias passadas mais parece uma forma de viagem no tempo. Mas levar isso a sério seria somente se distrair com algo irrelevante. Na verdade, a grande questão aberta aqui é sobre as motivações dos portadores do titã de ataque e sobre as memórias compartilhadas por estes.
Sobre as memórias ficou claro que elas são fragmentadas, tanto que o próprio Eren se mostrou surpreso em alguns momentos desse episódio.
Sobre as vontades, em parte ela é influenciada pelo compartilhamento das memórias, mas há muito das atitudes que podem ser na verdade influenciada por outros. Ao ponto que até a questão de livre-arbítrio poderia ser levantada. De todo modo, fato é que o Grisha fez tudo que fez.
E o presenciar dos atos de seu pai foi de grande impacto para o Zeke. Aquela figura que ele viu era muito diferente daquela que ele julgava conhecer. E o mesmo vale para o Eren que também se mostrou alguém muito diferente de quem ele imaginava.
É tanta confusão e surpresa que acho justo que no final o Zeke tenha chorado ao receber um abraço de seu pai. Tanto pelo Grisha que verdadeiramente se arrependia pelo que fez com o seu filho, quanto pelo Zeke que sempre esperou por demonstrações de carinho de seu pai. Agora voltamos para o confronto Zeke e Eren, onde opiniões distintas se embatem.
Na verdade, não, de forma alguma. A própria dicotomia de pensamentos entre o Zeke e o Eren é falsa. Ambos podem discordar em certos pontos, mas no final das contas o mesmo erro está presente na visão de ambos. Isto é, a desvalorização da vida.
O Zeke até diz isso de forma explícita ao afirmar que a inexistência dos eldianos seria a solução para todos os problemas deles. Aliás, uma ideia tão idiota que me assusta que no mundo real existam pessoas que defendam essa ideia. Uma dica, se for ao médico pergunte a ele a sua opinião quanto ao tema.
Porque isso é o mesmo que pensar que a forma para se tratar uma virose seja asfixiar o paciente até a morte, pois assim estaria matando o vírus também.
Agora, se o Zeke diz com todas as palavras exatamente aquilo que deseja… então o Eren também. Sim, ele também diz isso, na verdade ele sempre disse isso. A diferença é que antes ele era uma criança tola, e agora, somente tolo.
Ele deixou claro qual é a sua visão de liberdade, algo que para ser defendida torna válido até mesmo retirar a vida do outro.
Esta parte é muito problemática, muito fácil de ser deturpada e usada para o mal, mas que em si não está exatamente errada. É válido para defendermos a nossa liberdade que restrinjamos a liberdade do outro.
Ainda que afirmar isso não elimine o problema, mas apenas o inicie. É algo a ser discutido, é algo complexo onde cair em equívocos é facílimo.
Porém, a grande questão não é essa. O ponto é que ele afirma com todas as palavras que aquelas pessoas que ele matou mereciam morrer. Isso já é algo completamente diferente. Nesse caso ele está, tal como o Zeke, desvalorizando a vida humana.
Ele está dividindo o mundo entre aqueles que merecem e os que não merecem viver. A legitima defesa, por exemplo, é um caso onde é válido retirar a vida da outra pessoa, pois nesse caso o objetivo é a defesa da própria vida.
Na verdade, em alguns casos como a defesa de outros, não apenas isso é justificável, como pode se apresentar como um dever moral. Mas qualquer pessoa saudável entende que isso é algo que se apresenta de forma indesejável, algo que infelizmente deve ser feito.
Quando o Eren justifica os seus atos alegando que os seus inimigos merecem, daí nós temos um grande problema. Seja esse “merecimento” por serem quem são ou apenas tendo em vista as finalidades de seus atos.
Não apenas porque isto está errado em si mesmo, mas pelo fato de que isso pode ser uma grande ferramenta para justificar os piores tipos de atrocidades.
Esse era exatamente a mesma forma de pensar de figuras como Adolf Hitler e Josef Stalin. Claro que como alguém que já leu o mangá de Shingeki no Kyojin, tenho consciência de que há alguns fatos sobre as intenções do Eren a serem levantadas.
Contudo, tenho que salientar que nesse momento essa foi a justificativa do anime para os atos do personagem. Ponto. E ponto final, pois fico por aqui. Até mais.