Dando continuidade a jornada iniciada no primeiro artigo, agora temos o segundo, baseado no segundo filme de Madoka Magica. Esse segundo filme oferece o fechamento da história, recontando e readaptando exatamente a mesma história apresentada no anime seriado, de 12 episódios. O Terceiro filme deve ser entendido como um spin off, e como possível final alternativo ou definitivo da trama, mas o comentarei posteriormente. Vamos ao segundo filme.

 

 

Mahou Shoujo Madoka★Magica Movie 2: Eien no Monogatari segue os acontecimentos do anterior, temos o cenário seguinte: o representante de uma civilização, chamado Kyuubey, um gato imortal e amoral, vaga pelos agrupamentos humanos recrutando garotas adolescentes em fase bem específica de maturidade emocional.

Ele deseja a energia dessas garotas, e para isso faz uma proposta indecorosa, uma barganha. A garota é inquirida pela realidade brutal, existem bruxas que amaldiçoam e causam catástrofes no mundo, mas é possível combatê-las, os humanos normais, infelizmente, são ignorantes da existência dessas anomalias corruptoras, mas vocês, garotas, podem interagir e destruir essa ameaça. O emissário oferece às garotas a escolha, tornar-se uma garota mágica e lutar pela humanidade contra o mal desconhecido, e ainda mais, em troca de seu sacrifício, oferece às garotas uma barganha, um desejo, qualquer desejo, que lhe será concedido.

 

 

Nasce assim a rasteira situação onde jovens ingênuas e ignorantes são arremessadas em um trabalho escravo de desfecho inevitável, vamos ao desvelar desse mistério.

Kyuubey explica para Madoka, quando questionado, e apenas quando questioando, os segredos por trás de sua função de cafetão de menores. O universo está colapsando, para cada transformação de uma energia em outra, existe, segundo ele, uma perda irreversível de existência, como se aos poucos a realidade estivesse se dissolvendo, e a entropia, consumindo a matéria em vazio. Essa perda de energia é ilustrada por ele ao dizer que quando uma árvore é cortada, transformada em uma mesa e posteriormente queimada, nesse processo, ao contrário do que se imagina, a energia final é menor do que a inicial, ou seja, a madeira queimada tem bem menos energia total do que a árvore da qual adveio. Ao longo de milhões de anos, com esse consumo constante das forças, a existência colapsará.

Essa é uma teoria interna pertinente apenas ao anime, esse universo fantástico particular, e não tem lastro e correspondência com a física como conhecemos, mas é um gatilho mais do que pertinente para o que se segue.

 

 

Kyuubey diz que sua espécie, uma civilização avançada, descobriu um modo de criar energia por fora da mecânica universal, uma energia que está para além do véu que recobre a realidade inevitável para a qual o universo caminha. A energia das emoções, essa energia pode compensar e recarregar a energia que se dissolve pelo ciclo natural das transformações. Ele explica que ele coleta essa energia dos seres humanos, e que o mecanismo desenvolvido para tal, é exatamente o projeto “garotas mágicas”. Esse projeto é o seguinte: contrato uma garota mágica, lhe garanto um desejo e um poder, esse desejo gera uma anomalia no tecido da existência, essa anomalia se corrige, causando catástrofe e dor, voltando esse sofrimento para a garota, que ao sofrer, colapsa e amaldiçoa a si mesma, se tornando uma entidade em agonia. Quando uma garota mágica decai em bruxa, ela libera a energia acumulada de sofrimento, energia coletada por Kyuubey, o incubador. A bruxa tem por missão consertar a anomalia que efetivou na realidade ao se tornar uma garota mágica e efetivar um desejo, ou seja, ela deve destruir e amaldiçoar o mundo até que entre em equilíbrio novamente, ela deve destruir a mesma parcela de coisas que salvou quando garota mágica.

Para evitar essa destruição, Kyuubey continua recrutando novas garotas mágicas para combater as bruxas, isso indefinidamente.

 

 

O que importa aqui, nesse mecanismo criado pelos incubadores, é a energia coletada nessa fábrica de emoções, ou seja, elas salvam o universo ao efetivarem adequadamente a sua função, viver, sofrer, colapsar. O efeito colateral dessa engenhoca é que as garotas mágicas efetivam desejos, e esses desejos não são completamente dissolvidos, ou seja, todo o avança na existência humana acabou por ser efetivado, com altos e baixos, tragédias e conquistas, através dos desejos das garotas desde os primórdios dos tempos.

Observem bem a sociedade e a arquitetura do anime, o avanço, a prosperidade, tudo isso foi devido ao desejo positivo, em sua maioria, das garotas contratadas pelo Kyuubey.

O fator Homura. Homura é uma garota mágica com o poder de voltar no tempo. Quando ela se tornou uma garota mágica, ela sedimentou como condição salvar Madoka, e todo o seu poder se efetiva em torno da menina. Homura, a cada vez que retorna no tempo, refaz o carma de Madoka, o amplifica, o densifica. O carma de Madoka é o seu peso e importância na existência, e ao ser amplificado, mesmo que sem querer, ela começa a ganhar uma densidade ímpar no destino e no fluxo da causalidade. Carma é um acúmulo de energia, um acúmulo de potencial. Madoka tem seu carma inflado absurdamente no decorrer da obsessão de Homura, chega ao ponto onde o potencial de seu carma lhe garante, ao se tornar uma garota mágica, um poder absoluto, e não apenas isso, um desejo colossal.

 

 

O que vemos no clímax da série é exatamente esse desfecho, Madoka pode desejar o que bem entender, e esse desejo será concedido, mas em contrapartida, o carma, ao ser utilizado, se torna uma dívida. Todas as garotas causam distorções na realidade ao materializarem os seus desejos no contrato com Kyuubey, mas o retorno das consequências é lento e gradual, corrompendo o destino das mesmas, e levando-as ao desespero, gradativamente.

No caso de Madoka, conforme o carma desta se torna gigantesco, o tempo para o efeito colateral do mesmo é acelerado, sendo que em certo ponto se torna inevitável que ela se torne uma bruxa quase que poucos minutos após efetivar o contrato de garota mágica. Homura, em sua ânsia para salvar Madoka de seu destino, acaba a amaldiçoando devido ao poder que a ela garante.

Antes de comentar sobre o desejo de Madoka, relato que o anime amarra muito bem essa estrutura pertinente a obra, mas existem infinitas questões interessantes sobre as quais não temos respostas, e não, essa ausência de respostas não desqualifica o anime de modo algum, são só curiosidades que lançarei para refletirem.

 

 

O que nasceu primeiro, a garota mágica ou a bruxa? Quem foi a primeira, ou as primeiras garotas mágicas? O que acontece se o pedido for maior do que o carma potencial acumulado da garota? Quando as garotas perdem a alma devido a quebra da Gema, a energia é coletada? É um cenário incrivelmente intrigante. Existem muitas outras perguntas a serem feitas.

Madoka efetiva um desejo absoluto, ela pede que todas as bruxas sejam purificadas e que tenham a pacificação de seu sofrimento antes que se transformem em bruxas, e quando se refere a todas, ela se refere a absolutamente todas, sejam elas do passado, presente ou futuro, incluindo a si mesma. Isso quebra a toda das leis de equivalência e anula o pagamento do tributo que os Kyuubey coletam, Madoka reescreve as leis segundo as quais os incubadores utilizaram as brechas para desenvolver o seu sistema laboratorial, mas ao mesmo tempo não liberta nenhuma das garotas de seus desejos, ou seja, mantêm os desejos, as consequências dos mesmos, mantém o desfecho, o colapso das garotas e o sofrimento que levou a ele, mas garante as mesmas a libertação do fardo, a morte e o desaparecimento, após a decadência que as levaria a ser transformarem em bruxas. Não é um pedido muito inteligente, pelo menos em uma primeira impressão, mas tem um detalhe aqui.

 

 

Madoka, ao que tudo indica, sabe que se transformará em bruxa, ela não deseja isso, então, para salvar a si mesma, desejar que todas as bruxas sejam salvas é como matar dois coelhos com uma cajadada só. Caso ela não fizesse isso, sabendo disso ou não, ela colapsaria na maior bruxa de todos os tempos. Ela destruiria não apenas o planeta, mas potencialmente o universo, como efeito colateral do carma que ela acumulou. O desejo que ela realiza é quase como um desejo obrigatório, pois qualquer outro desejo efetivado levaria ao desastre. Bem, talvez não qualquer outro, mas isso nos garante boas horas de reflexão. Qual seria um desejo que desse conta dos efeitos colaterais e apresenta-se resultados mais adequados? Não sei ainda, mas só por essa amarração final, considero Madoka Magica um anime sensacional.

Madoka reformula as leis do universo, e pior, ela se torna uma lei do universo, ela dissolve sua existência em constante desintegração e reintegração, ela se apaga da realidade para manter a realidade. E o efeito colateral disso, só saberemos no terceiro e último filme. Temos alguns elementos cedidos nesse segundo, mas deixo para debater isso depois, e também o fato de Homura lembrar de Madoka, pois é um detalhe central, ao que tudo indica, para o enredo do terceiro filme.

 

Comentários