O terceiro filme de Madoka Magica fecha com chave de ouro a história principal do cenário, a espinha dorsal da franquia. O considero como o melhor dos três filmes, o mais incrível e competente em ser ótimo em todos os elementos técnicos e minúcias que compõem a essência da animação. O mistério se revela, e ao mesmo tempo que se desvela o enredo em uma excelente narrativa visual, as perguntas que a obra sucinta, na verdade não são nunca respondidas, pelo menos não diretamente.

 

 

O que podemos inquerir em relação ao anime se multiplica exponencialmente, é uma avalanche de meias informações, dentre as quais muitas só podem ser inferidas pela interpretação da narrativa visual. Não temos linhas, falas ou explicações que dêem fecho ao que assistimos, somos asfixiados pelo desconhecido.
Imperando o desdobrar da situação, temos que relembrar os pilares da obra.

Retomando a partir do segundo filme, temos o seguinte: Madoka acendeu à divindade ao utilizar o seu carma acumulado artificialmente por Homura para efetivar um desejo. O famigerado desejo de Madoka foi o de que todas as bruxas fossem purificadas e expurgadas de seu destino sombrio amaldiçoado e amaldiçoam-te.

Lembrando que os Kyuubey criaram esse mecanismo para coletar energia mágica e suprir a decadência natural da vida do universo. Madoka, ao mudar a dinâmica de coleta, muda a própria realidade, e como efeito colateral, ela não apenas mantém o destino e a estrutura das garotas mágicas, como assume a responsabilidade de salvar a todas elas pela eternidade. A maldição, o sofrimento e a dor não desaparecem, apenas se canalizam em uma outra forma de manifestação.

 

 

Não vem ao caso trazer em minúcias o que já desenvolvi nos artigos anteriores, por isso apenas destaco que os espectros, entidades negativas de sentimentos e rancores, se tornam as novas “bruxas” no sistema das garotas mágicas.

Quem realmente são os Kyuubey? Os incubadores no caso. Qual a quantidade energia de um espectro? O universo seria salvo por esse mecanismo novo de coleta de energia? Qual a relação de Homura com sua família? Que nem sequer é apresentada no anime. O que acontece com a alma de uma garota mágica purificada pela Madoka? Bem, sobre essa questão, ao que tudo indica, elas dissolvem, mas Sayaka diz que elas ficam ao lado da Madoka como secretárias? Enfim, para além do apresentado na obra, as perguntas e dúvidas pululam ao infinito, e para o infinito, já que o anime não tem intenção nenhuma de responder nenhuma delas.

 

 

Retomando o fio da meada. Homura e os Kyuubey resolvem efetuar um experimento interessante. Isolar a Gema de Alma da garota no exato momento em que esta entra em estado de corrupção completa. Quando uma Gema se degrada, imediatamente a “Lei do Ciclo”, vulgo Madoka, purifica a Gema e sequestra a alma da garota para um mundo de pacificação e iluminação. É dito que a lei do ciclo não é algo, é só um preceito da existência, como a gravidade, um conceito e uma regra que dentro do sistema das regras que os Kyuubeys criaram, não faz o menor sentido. Eles estão curiosos com isso, ainda mais devido ao fato de que, convenhamos, foram eles mesmos que criaram o sistema “garota mágica”.

Outro ponto é, como Homura mantêm a memória da existência de Madoka? Mas esse ponto eu teorizo que seja devido ao seu poder e a repetição infinita da mesma realidade, o que fez com que a existência de Madoka, que após se tornar um Deus, deixa de existir, faça com que Homura consiga se lembrar da menina.
De todo modo, Homura não apenas se lembra, mas engendra um plano estranho, isolar sua Gema e decair em bruxa sem que a lei do ciclo a salve.

 

 

Nesse mundo labiríntico, que é de fato o labirinto de uma bruxa em maturação, Homura cria, mesmo sem desejar, uma cidade maquete, e ainda mais, recria a realidade falsa ideal onde ela poderia ser feliz, e trazer felicidade, para pessoas selecionadas que são permitidas de adentrarem esse micro universo separado da existência. Conforme vive dentro dessa ilusão, a própria Homura descobre a sua falsidade, e ao descobrir que ela mesma é a origem dessa falsidade, colapsa o seu sonho labiríntico em um pesadelo psicodélico de tormento.

Não cabe aqui analisar parte a parte cada elemento riquíssimo desse mundo criado por ela, esse anime merece uma tese de mestrado, e não um artigo, então para dar fluxo a este breve artigo, digamos que, em resumo, o objetivo de Homura é cooperar com os incubadores para que possa viver ao lado de Madoka mais uma vez.

Como o mundo fantástico dos sonhos colapsou, e se vendo em inevitável destino amaldiçoado, como uma bruxa que não rompe a casca e só pode amaldiçoar a si mesma, com sua Gema corrompida e a impossibilidade de sua alma ser salva, a lei do ciclo, Madoka, revela que enviou para o mundo de Homura emissárias que tem por tarefa quebrar a casca de sua Gema, e colapsar o experimento dos incubadores para que ela possa salvar a alma de Homura.

 

 

Sayaka e Nagisa, bruxas e garotas mágicas ao mesmo tempo, são auxiliadas por Mami e Kyouko, e Madoka, à qual também possui um reflexo preso dentro do mundo labiríntico de Homura, começam a agir.

Homura quase se rende a purificação nesse ponto. Entretanto, temos o ponto X da questão. Os incubadores desejam exatamente isso, que Madoka, a lei ciclo, manifeste a sua natureza dentro desse ambiente hermético por eles desenvolvido. Com o intuito de compreender como essa lei funciona, observando-a de perto, eles ambicionam coletar dados, e com base nessas informações, desenvolver um modo de revogar essa incômoda lei que os priva de coletar adequadamente o poder mágico das garotas mágicas. Sim, os incubadores gostam do sistema que cria bruxas e libera quantidades massivas de energia para armazenarem.

 

 

O dilema de Homura é que ela não pode deixar Madoka, entidade divina, tomar forma dentro do labirinto de seu coração em decadência, e ao mesmo tempo que combate os planos dos incubadores, ela mesma perde o controle de sua corrupção e se torna completamente em uma bruxa. Madoka, por sua vez, parece estar preparada para o desafio, e o plano implementado por ela e suas auxiliares infiltradas dentro do labirinto de Homura, parece correr bem e dar certo. Elas não apenas conseguem conter Homura em sua forma de bruxa, como conseguem romper a barreira que os incubadores criaram.

E agora vem o Y da questão, a Homura fora de seu labirinto, já desperta em bruxa, consciente de que será purificada, toma para si o poder de sua maldição. É sútil, mas após colapsar em bruxa, seja por ter sido dentro de si mesma, seja por sua vontade e amor, fazem com que ela, ao decair, consiga manter a energia de sua maldição como ferramenta. Ela literalmente engole sua própria alma, sua própria maldição, e em parte se amaldiçoa, em parte controla completamente toda essa energia para utilizá-la em benefício próprio. Ela não apenas faz isso, mas ela transcende a negatividade e escuridão, ela aceita, ela inverte a polaridade de seu destino. Teorizo que ela até mesmo aprende a utilizar o poder que um incubador possui, de armazenar e manipular a energia das emoções como fonte de poder.

 

 

O resultado final desse renascimento de Homura, é que ela atinge o mesmo nível de Madoka, a divindade. Ela não efetivou um desejo, ela materializou a sua vontade. o que Homura quer, e sempre quis, foi salvar Madoka, ela a ama profundamente, e todo o sofrimentos e sacrifício que fez para salvá-la, tinham sido em vão até o momento, mas na força bruta e na base da determinação, ela manipula o desespero e quebra a lei divina que prende Madoka a não existência. É complicado até de entender, ou tentar explicar, o que acontece, mas a consequência literal é que ela traz Madoka de volta para a realidade, para o mundo imanente, e ao mesmo tempo, traz junto todas as maldições que Madoka purificou, ou ao menos parcelas dessas purificações, que nesse novo mundo, não foram completamente efetivadas. Ele revive não apenas Madoka, ele revive todas as garotas mágicas que Madoka salvou.

O caos que a Homura efetiva é indescritível, e é pior ainda. Sabemos que ela não revogou a lei do ciclo, mas sim que a partir em duas, sabemos que ela forçou que a realidade e o labirinto mágico das bruxas coexistissem no mesmo plano e ao mesmo tempo. E sabemos que ela, de algum modo, submeteu os incubadores a sua vontade, a escravidão.

 

 

Homura é o que podemos entender por Demónio, por um deus maligno e decadente que não apenas tomou controle de um deus, como determinou a manutenção de uma ilusão realizada, no sentido de ser real mesmo. Ela não apenas forçou a Madoka a viver no mundo, resetando o mundo, mantendo as estruturas que os incubadores criaram, e gerindo os próprios incubadores, e se mantendo como uma dualidade bruxa, garota mágica, uma humana de poderes sem escala.

E lembremos que assim como Madoka, o carma de Homura, provavelmente, o anime não deixa claro, tem o mesmo potencial e grau de energia e maldição. A resposta de Homura não apenas arruma os erros do desejo de Madoka, como nega o efeito colateral do nascimento de uma bruxa, ou melhor, o manipula, ela manipula a maldição da bruxa e cria um mundo ao seu bel prazer.

 

 

Não é fácil ou imediato, muito menos preciso ou claro, mas essa é a leitura que consigo efetivar após conectar todos os elementos apresentados por esse filme, que como já ressaltei, é absurdamente incrível.

Acabo por aqui, pois já me estendi demais, mas me despeço muito satisfeito desse ramo principal da franquia, apesar de que, como já mencionei, seja um anime que nos force a criar um entendimento para aquilo que ele nos apresenta, pois suas alegorias são completamente artísticas, e lindíssimas, é claro, mas não são discursivas.

 

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