Há desvantagens em assistir tantos animes, não é? A gente começa a ficar “esperto” para o que vai acontecer. É um mesmo processo mental que aplicamos à vida real: de tanto experimentar um tipo de situação, começamos a perceber quando ela está para acontecer. Mais ou menos como quando olhamos para um objeto rolando em direção à beira de uma mesa e sabemos que ele vai cair. Ou como quando vemos aquela pessoa fazendo aquela cara e sabemos que estamos à beira de ouvir um monte. Bom, pensando melhor, não acho que seja uma desvantagem. Claro que vai depender da expectativa, não é? Podemos tanto ficar ansiosos por algo bom que pressentimos quanto tensos por algo ruim. Com ficção funciona igual.

E foi assim comigo nesse episódio. Depois de ver o momento terno que Konatsu e Yakumo compartilharam, depois de vê-los falarem o que sentem sem restrições, sem truques, sem orgulho, apenas a pura expressão do amor que um sente pelo outro, provavelmente pela primeira vez na vida, eles se ajeitaram para escutar Yotaro no rádio. Konatsu sentada no chão, de costas para Yakumo que repousava em paz em um banco. Em paz demais. Acho que mais paz do que jamais vi ele sentir ao longo das duas temporadas de Rakugo Shinjuu. Imediatamente me lembrei que não vieram os olhos vermelhos de Sukeroku na abertura, que representavam a culpa e o medo induzido por ela em Yakumo – mas não obstante, ela foi diferente. Se nos episódios de olhos vermelhos Yakumo quase morreu, o que haveria de ser nesse em que a vela se acendeu? Yakumo estava em paz. E eu estava tenso.

Essa vela

A cada momento em que ele ficava parado de olhos fechados eu me sobressaltava. “Pronto, agora se foi!”, pensava, mas logo ele abria os olhos novamente. Sentado à beira da cadeira, não pude evitar as lágrimas. Eu sabia, eu apenas sabia. O episódio seguiu me dando susto atrás de susto, e às vezes pensei se eu não estava enxergando coisa demais, se não estava enganado. Devia estar! Só podia! Até o Shin chegou! “O Yakumo não vai morrer agora, não é?”, eu raciocinava. Mas não conseguia afastar a sensação incômoda. E eis que … o episódio chegou ao fim. Lá estava Yakumo de novo no corredor da morte. Sukeroku conversou com ele e não deu chance para dúvidas do que estava acontecendo. Não era mais o Sukeroku de olhos vermelhos, o shinigami que apavora Yakumo, ainda que ele tenha soado um pouco assustador também. Yakumo não pareceu tão surpreso quanto das outras vezes. Agora é para valer. Eu sei que é.

O momento mais tocante do episódio

Lembro de quando escrevi no artigo sobre o episódio 4 que o mestre Yakumo já havia feito tudo o que tinha para fazer em vida. Meu raciocínio, leia lá, é que ele já tinha feito tudo o que devia fazer da própria vida, havia criado a Konatsu, havia mantigo o rakugo vivo, essas coisas todas. Ele de fato já tinha feito tudo o que ele tinha que fazer individualmente, por assim dizer. Cumpriu todas as responsabilidades que tinha para consigo mesmo. Mas ainda restavam coisas não resolvidas, não é? Coisas que não são individuais. Coisas que envolvem várias pessoas. Coisas sociais. Porque, afinal de contas, seres humanos somos animais sociais.

Yakumo viveu boa parte de sua vida junto com Sukeroku, Miyokichi e seu mestre, o antigo Yakumo. Sozinho ele não seria nada do que ele se tornou. E sem ele por perto, eles não teriam sido tudo o que foram. Para o bem e para o mal. Essa segunda temporada é sobre Yakumo e Konatsu, Yakumo e Yotaro. Yakumo e várias outras pessoas – ei, isso está até explícito na abertura, não é? Todos aqueles personagens olhando para o Yakumo, no centro, cada um preocupado a seu modo. Somos sociais. Essa não é nossa segunda natureza: é a primeira mesmo. A conversa que Yakumo teve com Konatsu era algo que os dois precisavam ter tido há muito tempo. Yakumo pode ter criado bem a Konatsu, pode ter mantido vivo o rakugo, pode ter ensinado bem o Yotaro, mas ele ainda não havia terminado tudo de verdade. Não antes daquela conversa. Não antes de contar para a Konatsu que ela nunca foi um fardo para ele – e de ouvir que ela se preocupava que esse pudesse ser o caso. De sentir o carinho dela e retribuir. E, claro, de abrir a porta para o futuro do rakugo: no fim, não é ele quem irá ensinar Konatsu, infelizmente, mas sua aceitação sorridente do pedido da filha para que a inicie na contação de histórias permitirá que a arte evolua, se adapte e sobreviva.

Yakumo deve ter rido poucas vezes assim, se alguma

Oh, sim, e Konatsu está grávida de novo, e Yakumo sabia disso e parecia orgulhoso e preocupado como um pai deveria estar. Tenho certeza que ele também se sentiu assim quando Konatsu esteve grávida de Shin, mas a relação entre eles era bem diferente na época. Ela tinha até mesmo mudado de casa, lembra-se? E retornou porque engravidou. Voltou para o Yakumo mais uma vez cuidar dela, ainda que fosse daquele jeito turrão dele. Agora ele se foi mas o pai do bebê estará presente então a Konatsu não terá nenhum problema. Bom, nenhum problema além da tristeza de perder um pai, quero dizer. Uma tristeza que ela conheceu tão jovem e sempre a aterrorizou, mas ela sabia que essa hora ia chegar. Força, Konatsu! E Yotaro, tente não chorar demais, a Konatsu precisa de você mais do que nunca.

O Yotaro demorou para entender que a Konatsu estava grávida

  1. Este episódio de Shouwa, merece bem as cinco estrelas que lhe deste, ele além de épico foi lindo. Eu já sabia, desde o início que este episódio ia ser emocionante, mas nunca pensei que seria tão cheio de feels. Eu já estava como tu, em relação ao Yakumo, mesmo que o Sukerou de olhos vermelhos não tenha aparecido na opening, a minha mente estava com um pressentimento de death flag para o Yakumo neste episódio. Mas começando pelo inicio do episódio, como foi triste ver o velho teatro em ruínas. Aquele teatro já era sagrado para quem praticasse Rakugo, à várias gerações, vê-lo em ruínas foi desesperador. Mesmo que o dono dele com alguma ajuda, tente reerguer o teatro, a alma do mesmo, já não será a mesma.
    Finalmente a Konatsu, contou para o Yotaro que estava grávida dele, já nos dois últimos artigos de Shouwa, eu estava a prever este acontecimento, mas como foi lindo, ver a reacção do Yotaro, ao saber que ia ser pai. A cara de felicidade dele e da Konatsu, não em preço, eles merecem ser felizes um com o outro. E como é bom ver a família do velho Yakumo, aumentar, ele merece passar os seus últimos dias com as pessoas que ama e que são tudo para ele. O Yotaro, na cena do trem, quando o Higuchi lhe dá novas histórias para ele apresentar, ainda continua a teimar, que quer que a Konatsu deve seguir o seu sonho de criança e se tornar contadora de histórias, tal como ele e o seu pai Yakumo. A audácia que o Yotaro, teve ao perguntar ao Higuchi, se não haviam histórias que focasse melhor contadas por mulheres. O Yotaro parece burro, mas de burro não tem nada, ele é aquele que mais apoia e incentiva a Konatsu no seu sonho de ser contadora de histórias.
    Agora a melhor parte do episódio, aquilo que eu chorei, nesta parte, chorei de alegria, por a Konatsu e o Yakumo se terem desfeito das suas desavenças e chorei mais ainda, cada vez que o Yakumo fechava os olhos, ele poderia morrer a qualquer momento nesta parte. Foi tão lindo ver a Konatsu e o Yakumo, terem aquela conversa, a Konatsu foi verdadeira nas suas palavras e o Yakumo também. Ver a Konatsu agradecer ao Yakumo, por este ter cuidado dela e não a ter abandonado, foi uma cena muito bonita por si mesma, para quem segue o percurso de vida do Yakumo desde o início tal cena teve um grande impacto emocional. Ver os dois a ouvirem a rádio, onde o Yotaro estava a apresentar Nozarashi, peça preferida da Konatsu, foi muito emocionante, o velho Yakumo sentado no banco e a Konatsu sentada de costas para ele, ambos felizes por terem resolvido as suas desavenças e a ouvirem atentamente a peça do Yotaro, é daquelas cenas que ficam marcadas na nossa memória. Pela primeira vez o Yakumo riu de felicidade, ele já tinha tinha feito tudo, o que tinha para fazer, e neste episódio resolveu o que faltava e que o atormentava, aquele riso dele, foi de alivio, ele já não tinha nada que o atormentasse. Como fiquei feliz de ver o Yakumo tão feliz e alegre, já era hora de ele poder descansar. Mas eu sabia que o Yakumo ia morrer, neste episódio e a minha certeza ficou confirmada, quando o Shin aparece e começa a cantar a música que o pai dele estava a cantar na rádio. A Konatsu, rapidamente repreende o Shin, mas o Yakumo disse que não fazia mal, e que queria que o Shin espalhasse um monte pétalas de cerejeira para ele ver. Aquele último momento antes de aparecer aquele mundos dos mortos, eu tive a certeza que o Yakumo tinha partido em paz, aquele último destaque que deram à Konatsu quando esta tira uma pétala de cerejeira da cara do Yakumo e depois dá destaque a um monte de pétalas de cerejeira a voar no alpendre onde o Yakumo estava, percebi que o Yakumo tinha partido em paz. Aquela cena do mundo dos mortos, foi apenas uma simbologia, para a partida do Yakumo para o plano superior com o seu irmão Sukerou. E tu a alguns artigos, colocaste esta situação como possível, e adivinhaste o Sukerou acabou por ir buscar e acompanhar o seu irmão Yakumo para o céu.
    Houve uma parte deste articulo que achei muito boa. A parte em que referes, que nós seres humanos, somo animais sociais. O Yakumo, como tu bem tinhas dito no artigo do episódio 4, o Yakumo, já tinha cumprido todos os seu deveres, mas tais deveres tinha sido apenas a nível individual. Ainda faltava o Yakumo resolver as coisas com as pessoas que o rodeavam e isso aconteceu neste episódio. Aquelas visões da Miyo e do Sukerou demoníaco que o assombravam e atormentavam, eram sinais que ele ainda tinha coisas para resolver antes de partir. O Yakumo não podia morrer, sem resolver a sua situação com a sua filha Konatsu, não poderia morrer sem verificar se a arte que ele tanto amou ia ficar em boas mãos. Para mim o Yakumo nunca deveria morrer, mas tal como a realidade, ninguém fica neste mundo para sempre.
    Aquela cena, onde a Konatsu, pede ao seu pai, se este podia lhe ensinar Rakugo, foi das cenas mais tocantes, que eu já vi num anime. A cara de felicidade de ambos, tanto da Konatsu como do Yakumo foi muito bonita, e aquele sorriso de orelha a orelha do Yakumo foi ainda mais bonito.
    Provavelmente no próximo episódio, deve mostrar o funeral do Yakumo (mais um episódio triste), eu até estranhei aquela prévia do próximo episódio sem a voz do Yakumo, ou do Yotaro. O clima do próximo episódio vai ser bem pesado.
    Como sempre, mais um excelente artigo de Shouwa Fábio.

    • Fábio "Mexicano" Godoy

      Puxa vida, levaram anos para reconstruir o teatro! Não esperava que fosse demorar tanto. Mas acho que assim valorizou mais, não é? Você disse que ele perderia sua “alma”, mas não acho que isso tenha acontecido. Metade do elenco de artistas escalados para o dia de sua reestreia eram parentes do Yakumo: Konatsu, sua filha adotiva, Shinnosuke, seu neto adotivo (e filho??), e Yotaro, como o novo Yakumo, seu pupilo e genro. Como um lugar sem alma poderia abrigar tal evento? Como uma constelação de Yuurakuteis poderia brilhar em um lugar que não tivesse a mesma alma onde sua família tradicionalíssima na arte já brilhou tantas vezes? Se Yakumo e Sukeroku estão “vivos” em Shinnosuke, o Novo Teatro também traz em si o Velho Teatro.

      Mas que episódio. Se fosse para eleger o melhor episódio de Rakugo Shinjuu, das duas temporadas, seria esse. A maior alegria (a gravidez desejada de Konatsu, a futura filha de sangue do Yotaro), a resolução dos últimos grandes conflitos da história (a conversa franca entre Konatsu e Yakumo sela a paz definitiva entre os dois), e um momento de grande tristeza, mas esperado: a morte do grande artista. Do protagonista. Da criança manca rejeitada, acolhida por um artista de semblante despreocupado mas que guardava uma profunda insegurança em seu peito, do irmão da outra criança que originalmente veio se “vingar”, mas essa coisa de vingança era complicada demais para ele então resolveu apenas curtir a vida e o rakugo, do amante da mulher cheia de sonhos em um Japão em transformação e que se tornou cada vez mais amarga conforme era deixada para trás, do homem que abriu mão do que não deveria e quando tentou recuperar perdeu tudo, mas que ganhou uma nova vida, do pai adotivo da criança que nasceu da relação entre as duas pessoas mais importantes em sua vida, do artista que brilhou mais do que qualquer outro em um tempo em que todas as luzes estavam se apagando e temia acabar sozinho em um palco escuro. Yakumo, o Oitavo. Kikuhiko, Bon.

      Mesmo sabendo que a separação era inevitável, ela foi tão difícil, não foi?

  2. Cara, esse episódio foi genial. A ambientação melancólica e ao mesmo tempo tranquilizadora que ele trás nos prepara de forma esplêndida para a possível morte do Yakumo. A paz nas feições de cada personagem, os takes diferentes pela cidade na apresentação do Yotaro, a chegada do Shin com as flores, a paleta de cores, a iluminação, tudo desenhou muito bem a morte de Yakumo. Uma obra prima. Na minha opinião, o melhor episódio dessa segunda temporada, o trabalho de direção aqui é fantástico, mais ainda do que nos outros episódios da série. Episódio emocionante.

    • Fábio "Mexicano" Godoy

      O melhor episódio das duas temporadas! E digo isso já tendo assistido os episódios finais também =)

      Desculpe pela demora em responder, estava em uma correria danada aqui no blog! E ainda estou, mas resolvi tirar um tempo pra começar a responder todos os comentários acumulados porque já está dando quase um mês que não respondo nada!

      Obrigado pela visita e pelo comentário =)

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