Shirobako – Sonhar exige trabalho duro
Série para TV, 25 min24 episódiosEstreou dia 9 de outubro de 2014
Informações técnicas
Enredo | Original |
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Estúdio | P.A. Works |
Diretor | Tsutomu Mizushima |
Roteirista | Michiko Yokote |
Produzir um anime é coisa séria. É um trabalho como qualquer outro: é estressante, você é obrigado a lidar com pessoas que não necessariamente você gosta, é obrigado a cumprir prazos e requisitos insanos, e ninguém de fora se importa com o quanto você se esforçou: só enxergam o resultado e é por isso que vão te julgar. Mas produzir anime é um trabalho diferente de qualquer outro: o resultado não é uma apólice de seguros, números em um banco na Suíça ou um entediante banco de dados. É um anime! Acho que não preciso explicar para alguém que veio a um blog sobre animes o que animes têm de especial, tenho? Mas eu explico mesmo assim porque sou pedante. Animes são produto de trabalho criativo com o objetivo expresso de divertir. Nem todo mundo que trabalha na produção de um anime trabalha em funções criativas ou sequer artísticas, mas todos trabalham em um ambiente permeado pela criatividade e pelo desejo de produzir arte para divertir pessoas.
Pendendo às vezes para a visão fria do processo, um trabalho como qualquer outro, e às vezes para a visão artística do ambiente criativo obrigatório para a produção de um anime, Shirobako conta a história da Aoi Miyamori, uma novata nesse meio, de suas amigas dos tempos do colégio que estão cada uma a seu modo tentando trilhar esse mesmo caminho, e da Musashino Animation e seus vários personagens nesse conto de sonhos e de trabalho duro.
O anime possui 24 episódios divididos claramente em dois arcos, cada um deles acompanhando a produção de um anime diferente na Musashino. Pessoalmente eu gostei muito mais do primeiro arco e acho que com poucas alterações o anime poderia ter acabado ali, mas isso de forma alguma significa que o segundo arco seja ruim. Com o cuidado para evitar spoilers, detalho um pouco de cada um e deixo o julgamento final para você, principalmente se já tiver assistido Shirobako ou se esse artigo conseguir convencê-lo a tanto. Eu particularmente recomendo muito que assista esse anime, então ficaria muito feliz se conseguisse convencer alguém; se decidir assistir por minha causa, me conte por favor, ok?
O primeiro arco começa quando o primeiro episódio do anime Exodus, um original do estúdio, vai para o ar. A Musashino há anos não produzia um anime; suponho que nesse tempo tenham feito trabalhos para outros estúdios, e Shirobako tem a Aoi e outros personagens responsáveis pela produção contatando outros estúdios para encomendar episódios inteiros, animação de cenas e outros trabalhos afins, para mostrar que esse processo existe e como ele funciona. O diretor em particular estava traumatizado ainda desde o seu último anime porque o final atrasou demais e deu tudo errado: foi um fracasso retumbante, e a culpa foi principalmente do diretor que atrasou os storyboards. Esse trauma vai ser lembrado e relembrado várias vezes durante esse primeiro arco e algumas vezes até no segundo.
Quando o anime está no ar é o momento em que sua produção pega fogo. Dependendo de vários fatores, há alguns episódios já prontos mas a maioria ainda precisa terminar de ser produzida ou ser produzida totalmente do zero durante a exibição, um curtíssimo período de três meses que é o que duram as temporadas de animes. Muita coisa pode dar errado durante todo o processo, e nessa fase erros podem ser catastróficos ao destruírem prazos e tornarem impossível a entrega do produto. É claro que a Musashino enfrenta muitas coisas dando errado, algumas por culpa deles próprios e outras nem tanto, mas que importa de quem é a culpa? No final é o nome da Musashino que está em jogo. E claro que a protagonista, Aoi, é quem tem que resolver a maioria desses problemas.
O ritmo é frenético e é quase impossível parar de assistir nesses primeiros doze episódios. E sem parar para respirar a Aoi ainda tem que se preocupar com o dilema: é isso mesmo o que ela quer fazer? Qual o objetivo de carreira e de vida dela? Histórias paralelas dos demais personagens funcionam como metáforas perfeitas para mover a Aoi um passo adiante e para contar para nós, espectadores, o que exatamente está em jogo. As histórias das amigas da Aoi são muito boas também, especialmente a da Zuka, a dubladora que não está conseguindo sequer começar direito na carreira. A situação dela é dramática, desesperadora. E no final, será que vai dar tudo certo para a Aoi, para suas amigas e para a Musashino?
Já o segundo arco trata da produção de Garotas Aéreas, adaptação de um mangá famoso (do mundo do anime, claro), e começa desde a pré-produção do anime. Aqui os principais problemas são típicos dessa fase e de adaptações: relacionamento com outras empresas que estão bancando o projeto, com o autor original, escolha de elenco de dublagem e montagem da equipe de produção. O ritmo é mais tranquilo, tendo alguns episódios inteiros bastante lentos quando comparados ao primeiro arco. A Aoi ainda não sabe o que quer da vida, mas Shirobako abre mais espaço para suas amigas e outros personagens. Mais ou menos.
A Zuka tinha bastante potencial mas sinto que ela acabou muito subaproveitada no segundo arco. A Ema (ilustradora) já havia resolvido seus maiores dilemas no primeiro arco e já era uma veterana agora. A Aoi ainda precisava saber o que fazer e o projeto teve vários problemas de novo mas sinto que o fato dela estar mais experiente somado à mudança de ritmo do anime me deixou com a impressão que ela passou esse segundo arco inteiro no piloto automático. A Misa (modeladora 3D) foi das garotas quem acabou tendo o maior e mais completo arco de desenvolvimento pessoal nesse segundo arco, e ele foi curto – e nem precisava ser longo de todo modo. Não é como se ela realmente tivesse grandes problemas, a sua história serviu mais como metáfora para outras histórias. E a Midori (escritora) simplesmente não teve problema nenhum.
Personagens novos foram introduzidos nesse segundo arco e eles são excessivamente caricatos quando comparados aos personagens do primeiro arco. Me pergunto como a dubladora da Kunogi se sentiu tendo sido contratada apenas para resmungar e pronunciar monossílabos durante doze episódios. Ela não é um mascote, é uma pessoa real, de carne e osso, uma ilustradora que trabalha em equipe mas é incapaz de conversar com alguém. O primeiro arco foi crível (não digo realista ou fiel à realidade porque não a conheço, mas já tendo trabalhado em equipes eu consigo imaginar aquilo como sendo uma realidade possível), mas o segundo não foi, entre outras coisas, por conta desses novos personagens ultra-caricatos.
Foi uma história diferente, foi boa também mas foi bem diferente em comparação ao primeiro arco. Para manter o tema que construí na introdução do artigo de duas faces diferentes e complementares, duas visões, os dois lados de uma mesma moeda, o primeiro arco foi mais realista, falou mais sobre a rotina de trabalho e os problemas duros que as pessoas precisam resolver, enquanto o segundo falou mais de sonhos e de como se esforçar (no sentido mais normalmente encontrado em animes, de “força de vontade” apenas) para realizar seus sonhos. Ou não os seus sonhos exatamente, mas produzir um sonho em forma de animação. Os dois são bons. Eu gosto mais do primeiro. Recomendo que assista ambos e me conte depois o que achou.