A maior conquista de alguém pode ser algo completamente sem valor para outro. Mesmo que seja obtida a duras penas, o completo desprezo pode ocorrer, seja por ignorância ou simples ódio. E isso dói ainda mais quando se é criança.

Essa é a história de Gotou ni Naritai, um movie que acompanha a vida de uma garotinha chamada Ritsuko, que sofre de uma doença que dificulta sua locomoção, resultando em uma forma torta, lenta e hesitante. Ela vai para a escola e começa a sofrer bullying por sua deficiência. Crianças são mesmo impiedosas.

 

 

Eu me identifiquei com esse animê porque, no ensino médio, fazia educação física com um rapaz que tem uma deficiência parecida com a da Ritsuko. A diferença é que a dele afetava também o movimento das mãos. Lá na escola nós tínhamos opção de escolher um esporte para praticar nas aulas de educação física, a que fazíamos juntos era tênis de mesa.

E acontecia algo muito legal na relação da turma com esse rapaz: inclusão. Não existia preconceito e nenhuma forma de isolamento, muito pelo contrário, todos buscavam ajudá-lo, mas de uma forma que ele se sentisse bem. No lugar de fazer por ele, numa espécie de assistencialismo, nós jogávamos com ele normalmente e incentivávamos para que ele continuasse até conseguir acertar. E era incrível quando ele conseguia, porque todo mundo vibrava e ficava verdadeiramente feliz pela conquista. Eu não posso afirmar que isso ajudou ele de alguma forma, mas tenho certeza que foi uma experiência muito gratificante e um grande aprendizado para todos que ali estavam. Diminuir um pouco o ritmo para que o outro possa acompanhar é uma lição que nem todos aprendem.

 

 

Voltando ao animê, fica bem explícito a importância de todos no processo: pais, médico, professor. Se existir um ambiente em que a pessoa se sinta segura e tenha apoio para seguir em frente, a luta contra a deficiência é menos difícil.

A doença da Ritsuko (que não é dito o nome) impedia que ela andasse quando era menor, obrigando que vivesse sentada e isolada. A busca incessante dos pais por um médico que pudesse fazê-la andar resultou em achar um que, com muita empatia e cuidado, conseguiu o feito que parecia impossível. Ela conseguia andar! Mas com muita dificuldade. Com infinitas sessões de fisioterapia e sapatos especiais, ela foi conseguindo melhorar o caminhar.

 

 

O sonho dela era ter amigos e ela acreditava que, como conseguia andar, iria conquistá-los. Mas não foi isso que aconteceu. As crianças da escola foram cruéis e faziam bullying, isolando, maltratando. Chegou ao ponto da mãe ir à escola contar a história da Ritsuko para tentar sensibilizar o coração de pedra das crianças, mas não obteve sucesso.

Aliás, a mãe dela é um caso interessante. Desesperada em ajudar a filha, ela tentava fazer tudo pela Ritsuko. Sempre tomando a frente, impedindo que ela pudesse se desenvolver e tentasse buscar soluções. É impossível criticar a atitude de uma mãe desesperada, mas o animê deixa claro que isso não é o melhor a ser feito. O apoio é importante, mas é vital que o deficiente seja visto como alguém que pode resolver os seus problemas. Uma simples ajuda para levantar pode ser algo que incomoda, afinal, ela pode levantar sozinha.

 

 

Gotou ni Naritai trata de todos esses temas de forma muito fluida e natural, sem forçar a barra para arrancar lágrimas. E é bem interessante ver um animê que fala sobre deficiência, já que eles não são muito comuns.

Demora bastante tempo até que a Ritsuko consegue a inclusão na turma e o bullying acabe. E isso passa muito pela aceitação da própria deficiência e do entendimento de que todo mundo possui problemas, sejam eles físicos, emocionais ou familiares.

 

 

Foi muito prazeroso ver um animê que me recordou da melhor fase da minha vida: o ensino médio. E de uma faceta dessa época que me ensinou a importância da diversidade, porque só convivendo com uma pessoa com deficiência para entender as dificuldades e aprender qual a melhor forma de se relacionar. E é sempre bom lembrar como a inclusão é algo incrível e faz bem para todos.

 

 

Sayonara. Bye, bye o/

 

  1. Não fiquei sabendo deste anime até a publicação da resenha e fui correndo para ver…
    Lógico, que vc dá aquela torcida de nariz para uma animação que parece o “inspetor bugiganga” e 1995 vc quando tem ainda seus “vinte e poucos” está ainda no hype de “Gunsmith Cats” (nunca um anime exibiu tanto bom gosto automobilistico…). Era uma epoca bem diferente…Animes eram exuberâncias visuais e este não o é e não o pode ser pq é um apelo a sociedade para parar de ser estúpida e para uma sociedade parar de ser estúpida os autores não se deram ao luxo (ou ao engodo) de enganar com visuais exuberantes e eles foram muito bem sucedidos nisso. Não há superpoderes, não há momentos “deus ex machina” nada apenas um “slice of life” (em 1995 era uma novidade revolucionária) de uma familia japonesa classe média muito da resiliente e uma filha pra lá de resiliente ainda.
    É o que define “Gotou…” resiliência e o conforto de que um dia a estupidez cai por si só…E que o mundo luta contra a sua estupidez desde antes de 1995…
    Quando acabei de ver, lamentei não ter visto à epoca, poderia ser um ser humano um pouco melhor por mais tempo…

    • Fico muito feliz que o texto tenha te estimulado a assistir esse animê.
      Eu gosto muito de obras antigas, principalmente da década de 70 e, sempre que posso, faço a divulgação delas. Os meus artigos aqui tem esse objetivo: apresentar animês desconhecidos (apesar de escrever numa coluna que não é sobre isso).

      A parte técnica de Gotou ni Naritai é bem fraquinha, mas a história compensa. E eu acho interessante a forma que ele mostra a crueldade das crianças. O senso comum costuma dizer que crianças são anjos na Terra, mas a realidade não é bem assim. Pelo menos, na minha experiência quando era criança, presenciei vários acontecimentos cruéis, como bullying, intimidação, apelidos.

      A respeito da estupidez do ser humano, eu sou bem pessimista, não acredito que isso vá mudar.

    • Não conheço esse, vou pesquisar.
      No mesmo estilo de Gotou ni Naritai tem o Happy Birthday: Inochi Kagayaku Toki (já assisti, é bacana, mas têm questões demais para pouco tempo de desenvolvimento) e o Momoko, Kaeru no Uta ga Kikoeru yo (ainda não vi).

  2. Prezado se vais falar de obras dos anos 70 estarei pronto como comentarista!!! Também são os meus preferidos…Agora crianças são seres em formação social, como bem dito não são anjos, mas também não são demônios reagem instintivamente…Mas se o lado do “mal” é recompensado e alimentado pelos que as cercam aí sim teremos adultinhos bem problematicos…Aguardando a proxima resenha compadre!!!

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