O singelo aprendiz que ainda é puro, que se expressa sem os ditames, os vícios ou as rotinas da indústria. Eis aqui um exemplo do que uma obra sem nenhuma ambição ou ego manifesta, um percurso de esmero e fantasia, um conto efêmero dentre a neblina e o vento.

Kaze no Matasaburou é um anime de alguém de fora, alguém desvinculado das fórmulas, mesmo que, é claro, se utilize dos mecanismos narrativos e de enredo já tão batidos, mas o faz por este ser o seu referencial, e não por isso ser a sua corrente.

 

 

Hiroki Yamada conduz o filme que nos conta a história de Takada-san, uma jovem garota que acompanha o pai, se fixando na cidade onde ele trabalha, uma cidade pequena do interior. Sua mãe, ao que descobrimos, está se preparando para uma longa viagem de trabalho. Sob os cuidados do pai, a menina tem que se matricular e frequentar a escola local.

Takada-san se mostra incomodada com a situação, um tanto contrariada e desconfortável. Na sua nova sala de aula, a menina evita interagir com os colegas, seja pela timidez, seja pela estranheza. Seus amigos são animais humanizados.

 

 

É bem interessante e confuso, não entendemos se Takada-san tem aversão aos amigos, ou se é apenas um momento passageiro de repulsa, pois quem em sã consciência não sentiria um mínimo de asco ao se deparar com um sapo e uma minhoca conversando com intimidade conosco.

No fim, essa situação a pressiona ao ponto da fuga. O único menino humano na sala, Kouichi, age naturalmente com os amigos animais, considerando-os não apenas iguais, mas interagindo com afeto e gentileza para com eles.

Nesse cenário, esse é o maior paradoxo, pois Takada e Kouichi representam polos opostos de realidade. É dado como normal que animais falem, andem em duas patas e frequentem a escola, ou que não existe diferença entre eles e os humanos. Takada representa o choque em sua essência, caindo de paraquedas em um universo desconhecido, e Kouichi representa a normalidade, pois essa é a realidade local, e não tem nada demais.

 

 

Estabelecido o fato, no decorrer da história Takada é incluída e abraçada por todos do grupo, e com grande eficiência, os animais e Kouichi, quebram as barreiras que a isolavam, transformando a sua repulsa em humanidade, e humanizando um ser humano que se deparou com uma diversidade completamente avessa da qual estava habituada.

Por outro lado, temos, da perspectiva dos diversos animais que compõem a sala de aula, a infância em sua máxima potência. Takada é uma aluna nova, e ao chegar, um grande vento a acompanhou. É sabido pelos jovens que existe um grande vento, o Kaze no Matasaburou, e por brincadeira e ingenuidade, eles pensam que Takada pode ser essa entidade fantástica.

Os animais não a tratam com qualquer tipo de agressão, não existe opressão no ambiente escolar, apenas a magia da imaginação de crianças curiosas e que misturam a fantasia com a realidade, mesmo que no cenário, essa distinção de fato não exista.

 

 

Takada, quando em fuga e confusão pela adversidade de sua impressão inicial pelos seus novos colegas de sala, é atropelada pelo vento, literalmente, e o vento se chama Fuujin, um dragão gente boa que gosta de voar pelos céus com seus leques poderosos que emanam rajadas de vento.

O dragão parece apressado, e acaba se desculpando sem jeito com a menina, indo embora e deixando-a atordoada. Takada chega até a reclamar com Fuujin, pois percebe que ele está com o seu chapéu, o qual foi varrido pelo vento no começo dessa mesma manhã escolar, entretanto, ele já estava longe, e em sua pressa, uma das penas de seu leque se desprende, mas ele não percebe.

Kaze no Matasaburou é uma obra que não se prende e não tem ambição em inflar as situações para que elas sejam impactantes, o filme apenas conta uma história, os eventos fluem tranquilamente, nos guiando pelo cotidiano e pelas emoções dos protagonistas, pelos pequenos conflitos e pelos laços de amizade que se formam naturalmente.

 

 

Kouichi tenta se aproximar de Takada, e com isso consegue efetivar uma amizade de verdade, construindo essa ponte, os demais amigos de Kouichi também se aproximam da menina. Takada, que antes se sentia angustiada, com vontade de voltar para casa, começa a apreciar a todos os novos amigos, se sente incluída e abraçada, seja pelos colegas, ou até mesmo pelos adultos do local, como a avó e a mãe de Kouichi.

Ela carrega a pena do dragão Fuujin apenas por capricho, e descobre o poder da mesma, mas só o usa em segredo e para diversão, ou em um momento, para auxiliar os amigos, novamente, em segredo. Ela não revela que em parte se transformou no Kaze no Matasaburou, o vento poderoso.

E por fim, para concretizar esse singelo filme, a conclusão é brutal e abrupta. Takada se vê em um novo conflito e impasse, refém de uma nova situação. Sua mãe cancelou a viagem à trabalho por algum motivo, e ela tem que se mudar novamente para outra cidade, nisso, esquecendo a pena de Fuujin na escola, e até mesmo não tendo coragem de encarar e se despedir dos novos amigos que formou.

 

 

É um final triste que virá de ponta cabeça a realidade de Takada, é muito rápido e incontrolável. Nos deixa sem chão. O mal estar dessa conclusão é intenso, mas não há o que fazer, a vida é assim, uma força natural irresistível, inevitável.

Fuujin entra em contato com Kouichi em busca de sua pena perdida, o confunde com Takada, mas efetiva a troca, sem que Kouichi entenda absolutamente nada do que está acontecendo. Ele conheceu o Kaze no Matasaburou, recebeu dele o chapéu de Takada, e ficou sozinho e sem a sua amiga.

Termina assim esse filme que nos conduz por esses efêmeros momentos da vida desses jovens, a vida continua, e quem sabe Takada retorne, já que seu pai ali reside e trabalha, mas o vazio que final da obra nos arremessa, implica o quanto o anime consegue nos cativar, o quanto ele é incrível e pleno, mesmo sem querer.

 

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