Bom dia!

Para quem está chegando agora, o Café com Anime é um bate-papo sobre alguns animes da temporada entre mim, pelo Anime21, e Vinícius Marino (Finisgeekis), Gato de Ulthar (Dissidência Pop) e Diego (É Só Um Desenho). Cada blog irá hospedar as transcrições das conversas de um anime: ao Anime21 caberá publicar os artigos sobre Violet Evergarden; ao FinisgeekisCardcaptor Sakura Clear Card; ao É Só Um DesenhoKokkoku; e ao Dissidência PopMahou Tsukai no Yome e Junji Ito: Collection.

Sem mais atraso, leia a seguir a conversa que tivemos sobre o episódio 2 de Violet Evergarden.

Fábio "Mexicano":
Oh, então o que o super cientista inventou foi só a máquina de escrever mesmo, e sei lá por que raios a chamou de “boneca”. Mentira, eu sei sim: o autor da novel quis forçar a barra para que víssemos sua protagonista como um robô. Não posso dizer que aprovo esse tipo de pista falsa, mas acho a história sólida o suficiente para que isso não a prejudique.

Inclusive, lembram toda a nossa discussão steampunk vs eletropunk vs dieselpunk? Ela não importa também. O único elemento que realmente destaca Violet Evergarden de um cenário vitoriano normal são seus braços mecânicos, mas eles também só estão ali para a vermos como um robô. Mas isso já passou.

Fábio "Mexicano":
Eliminado o que o anime não é, vamos ao que ele é, e já era visível desde o primeiro episódio. A minha sensação de que o Hodgins está escondendo mais do que apenas o trauma do sobrevivente aumentou, e eu não duvidaria se ele próprio tiver enviado Gilbert para sua missão derradeira. A Cattleya parece ser a mais transparente dos personagens importantes e deve servir de ponto de vista ou de voz da razão mais vezes, como já aconteceu nesse episódio. Sobre as outras dolls, a Erica defende a Violet porque ela própria se sente incapaz, e ela nem precisaria ter dito isso (duas vezes!) para que eu percebesse, e parece que também esconde alguma coisa. Já a Iris parece ser apenas uma antagonista, pelo menos por enquanto.
Vinícius Marino:
Um belo segundo episódio, que vendeu com força o potencial da série. Aprendemos que as autômatas não são apenas escribas, mas “ghost writers” de correspondências pessoais. Isso abre uma possibilidade interessante: não apenas a de mostrar o desenvolvimento da Violet diante das cartas, mas de usar sua ingenuidade como veículo para expor as hipocrisias e contradições humanas.

A cena da pretendente esnobe foi muito bem sucedida nesse sentido. É o tipo de mote que consigo ver explorado à exaustão. Eventualmente, pode culminar numa própria reavaliação do Hodgins e suas omissões sobre o Major Gilbert. Treinada nas contradições humanas, não se tornaria a Violet capaz de “ler” suas mentiras?

Fábio "Mexicano":
Gostei dessa hipótese! Agora é exatamente o que eu quero ver acontecer 😃
Gato de Ulthar:
As críticas ao anime estão sendo completamente furadas. Houve quem chamou este segundo episódio de chato, uma grande inverdade! Foi um episódio muito bonito! Vários momentos chamaram minha atenção. A Violet pouco a pouco tentando se adaptar a nova função, com o interessante paralelo que ela faz entre a máquina de escrever e uma arma. Gostei bastante da animação dos braços mecânicos dela, possuem uma riqueza de detalhes Fenomenal.

Além disso, ver como a Violet aprende a ser humana com as próprias contradições humanas é impagável.

E gostei bastante da Erica! Acho que vai ser uma das minhas personagens favoritas.

Fábio "Mexicano":
Quero muito ver mais Erica também!
Diego:
Minha experiência foi bem parecida com a do Gato: para o tanto de gente falando mal desse segundo episódio, eu gostei bastante dele, mais até que do primeiro. Sinto que o pessoal está forçando hate só pra contrariar o hype que o anime teve (ou o hype atraiu pro anime um público que não é o dele, talvez?). Seja como for, o episódio em si foi bem legal de assistir, e dá um bom contraste entre a honestidade seca, quase grosseira, da Violet, e o comportamento mais resguardado e “falso” dos secundários, muitos deles, como já apontaram, aparentemente tendo muito a esconder.
Fábio "Mexicano":
Tem nada de “quase”, ela é grosseira sim, e muito, hahaha!
Diego:
Eu digo “quase” por não ser intencional kkkkkkk
Fábio "Mexicano":
Imaginei ☺️

Enfim, o ponto todo da Violet é que não só ela não entende sentimentos, como ela não entende as nuances da comunicação e da interação social. Ela toma tudo pelo seu valor de face. Mas espere! Se nem tudo é o que parece, será que o “Eu te amo” do Gilbert significava o que deveria significar mesmo? Ela nem sabe o que é esse significado ainda, e já tem motivo para se questionar se um dia sequer vai poder saber. Entender o significado das palavras não é o suficiente.

Gato de Ulthar:
Por isso o objetivo de vida da Violet é saber o que significa o “eu te amo”.
Fábio "Mexicano":
Sim. Mas entende como agora que a Cattleya disse para ela que as palavras “têm dois significados” isso ficou muito mais difícil? Mesmo entendendo o que é “amar”, o que significa “eu te amo”, ainda restará a possibilidade do Gilbert ter dito isso com algum significado “alternativo”.
Gato de Ulthar:
A Violet pode mesmo chegar a pensar isso. Acho que sou muito romântico, mas acho que o Gilbert foi sincero.
Fábio "Mexicano":
Eu tenho certeza que ele foi. Nós podemos ter certeza, e provavelmente todos temos. Mas a Violet ainda não sabe e não sabia interpretar as nuances das relações sociais quando ele disse isso, ela vai precisar não só aprender esse significado como reinterpretar tudo o que eles fizeram juntos para poder ter certeza.
Vinícius Marino:
Gosto da ideia de que o anime subverta nossas expectativas em relação ao Gilbert e outras personagens. Acredito que já lançou as cartas para tanto (não creio que a Iris continue uma “vilã” até o fim). No entanto, quanto mais ele fizer isso, mais vai de encontro aos interesses dos mesmos “fãs” que estavam caindo de pau sobre ele

Violet subverteu suas aparências bem demais, e acho que isso é parte da origem do backlash. É um steampunk, só que não exatamente. É uma ficção especulativa, pero no mucho. É uma história de amor… que não pode se concretizar, pois o mocinho está morto.

Mais do que isso, prevejo que será uma série bem lenta e claustrofóbica. Salvo grandes reviravoltas, imagino que o grosso da ação se passará nos próprios correios. É, para todos os fins, uma história “de escritório”.

Não há nada de errado com a premissa. Muitas das melhores obras da ficção são histórias assim. Mas é inevitável que seja tachada de “chata”.

Fábio "Mexicano":
O anime é bastante sério mesmo, acho que é, sim, um tipo de história que não agrada muitos. Apesar de toda seriedade, há alguns assuntos que parecem mais bobos, principalmente quando os colocamos em palavras. Por exemplo, a Violet parece ter uma tendência a morder tudo – suas luvas sempre que vai pô-las ou retirá-las, a roupa do Gilbert (ok, ali ela não tinha mesmo braços, mas mesmo assim morder pareceu bastante pateta), seu broche. Quero dizer, houve quem visse nessa cena a Violet “beijar” o broche, mas a conhecendo, não consigo ver outra coisa que não ela levando-o a boca para morder.

Por que a Violet morde tudo? Que tipo de mania é essa que deram à personagem, o que isso deveria significar?

Vinícius Marino:
Olha só! Eu não tinha reparado nisso. De fato, é uma mordida, não um beijo.

Parece-me um detalhe bem pensado de caracterização. É bem comum pessoas reais terem tiques. Menos comum é ver um anime se preocupar em mostrá-los.

Fábio "Mexicano":
Em qualquer outro anime isso seria um beijo. Está bastante sutil mesmo, se eu já não estivesse com a mania da Violet em morder as coisas na cabeça, nem teria notado.
Gato de Ulthar:
Não sei se pode dizer que essa mania de morder as coisas tenha algum significado especial. Pode ser mesmo só uma caracterização da personagem, e se for só isso mesmo, já está de bom tamanho, pois demonstra o nível de detalhamento na construção da Violet
Fábio "Mexicano":
Concordo. É alguma coisa, um traço de característica, de fato.
Vinícius Marino:
Mas agora, vamos falar sobre o serviço em si? Vi algumas críticas dizendo que toda a firma de ghostwriting é um tanto inverossímil. Sobretudo no caso da mulher esnobe, que sequer teve chance de ouvir sua carta antes de enviá-la (ao contrário do outro cliente, que prontamente a destruiu).
Vinícius Marino:
Pensando em termos de lore, também me surpreendeu não ver ninguém consultando manuais de estilo. Geralmente, há todo o tipo de fórmula para os gêneros mais formulaicos de correspondência. Aliás, redatores prolíficos de mensagens e documentos oficiais geralmente memorizam dezenas de fórmulas, quando não usam formulários prontos.

(BTW é assim que muitos “poetas” improvisadores operam. Eles decoram alguns versos e só trocam nomes na medida do necessário.)

Fábio "Mexicano":
Talvez ela não saiba ler? Mas bom, alguém deveria ter lido para ela, e ela deveria ter pedido isso, de fato.

Sobre fórmulas, sim, existem inclusive para notícias, blogs, para tudo o que lide com comunicação de massa. Mas é um detalhe que não acrescentaria nada, eu acho. As pessoas querem comer salsichas e ler notícias, não saber como elas são feitas.

Vinícius Marino:
Ah sim, não acho que isso deveria ser mostrado em todas as cores. Mas decerto facilitaria a vida das bonecas. Sobretudo da Erica e da Violet, que são mais ineptas.

De novo, pensando na lore

Diego:
Acho que a mulher não ter lido a sua carta pode ter relação com o horário que ela chegou na agência. Já era bem tarde, se não me engano, ela pode ter só dado o endereço e decidido deixar as coisas nas mãos da Violet. Não sei dizer o quanto isso soa verossímil, mas é uma explicação plausível, eu acho… Sobre manuais, talvez eles não existam naquele mundo? É complicado, qualquer explicação possível parece que obrigatoriamente será extra-história, e acho que o anime não está realmente preocupado em desenvolver o seu mundo. Parece uma história que vai se focar mais em seus personagens, mesmo que talvez em detrimento de outras áreas.
Fábio "Mexicano":
“Foco em personagem” é quase o sobrenome do KyoAni. Puxando pela memória, não me lembro de anime deles que não seja assim, bom ou ruim.

Enfim, querem especular um pouco sobre a Erica? Será que ela é só insegura mesmo, ou será que passou por alguma coisa? Quero dizer, teve um momento em que ela pareceu “sacar” a condição da Violet, de ser como é por só ter conhecido a guerra, isso me pareceu muito específico.

Gato de Ulthar:
Não vejo a Erica como alguém que esconda alguma coisa. O que deu para perceber é que ela sempre teve o sonho de poder descrever de maneira satisfatória os sentimentos das pessoas e etc. O fato dela sacar a condição da Violet não me surpreendeu. Mesmo que ela não tenha lutado na guerra, se levarmos em comparação nossas 1ª e 2ª Grande Guerra, a população, principalmente das zonas atingidas diretamente, estavam fortemente envolvidas nos “assuntos” de guerra.
Vinícius Marino:
De fato, na guerra total todo mundo sofre. Não importa quão distante do front. Dito isso, também acho que ela deve ter alguma história chorosa escondida na gaveta. Talvez não semelhante a da Violet, mas referente a sua dificuldade em se auto-afirmar.
Diego:
Não duvido que a Erica tenha algum tipo de passado trágico, mas menos por conta das atitudes da personagem e mais porque Violet parece bem o tipo de anime a dar um passado trágico à maior parte do seu elenco [rs]. Mas se estamos falando de como ela se conecta com a Violet, imagino que a Erica apenas tenha perdido alguém próximo. Um amante, namorado, marido, alguém por quem ela nutria um forte sentimento de amor e que acabou perdendo (na guerra, provavelmente?).
Fábio "Mexicano":
Perfeito. Não sei bem o que pensar sobre a Erica, acho que há sim alguma história que ela esteja escondendo e que o anime ainda vá revelar, mas por outro lado talvez não seja nada demais – ou melhor dizendo, nada realmente inesperado ou fora do comum.
Fábio "Mexicano":
Para encerrar, o que acham do anime manter esse ritmo, que é episódico nos fatos, mas linear no desenvolvimento da Violet, com esse segundo em tamanho destaque que quase não se percebe o primeiro?
Diego:
Eu preferiria perceber mais o primeiro rsrs. Gosto de histórias episódicas, especialmente quando bem conduzidas. E dá pra mesclar episódico com progressão de forma que um não se sobreponha ao outro – vide Girls Last Tour na temporada passada. Claro que é importante termos um desenvolvimento da nossa protagonista, mas imagino que o mundo e as pessoas de Violet Evergarden tenham histórias interessantes para contar – e eu realmente quero ouvir.
Gato de Ulthar:
“Episódico nos fatos, mas linear no desenvolvimento da Violet”, me parece uma ótima definição. Se continuar por este caminho, ficarei contente.
Vinícius Marino:
Sobre a linearidade, li na internet que a novel original “invertia” as coisas, revelando a morte do Gilbert só no final. O anime deliberadamente resolveu nos entregar todas as cartas logo de cara. Então sim, acho que a linearidade é inevitável. O suposto “twist” da história (se é que havia um para início de conversa) já nos foi dado.
Fábio "Mexicano":
Essa é uma informação interessante e vem de encontro a algumas críticas um pouco mais bem elaboradas que li desde o primeiro episódio. Diziam, conhecedores da light novel, que o anime teria “estragado” o mais importante. Pelo que vi até aqui, discordo. Talvez tenha sido muito interessante da forma como foi na novel, mas da forma como consigo imaginar é pelo menos igualmente interessante vermos desde o começo a Violet como uma coitada, enganada, alimentando um amor impossível que ela nem mesmo entende. Se eu não soubesse que o Gilbert está morto, estaria eu aqui metaforicamente morto de curiosidade com esse mistério – um mistério desnecessário se o objetivo é apenas o desenvolvimento da personagem Violet. Prejudicial até, na medida em que tira dele a atenção.
Fábio "Mexicano":
Mas bom, como essa discussão já está avançada, vamos encerrar por aqui conforme eu planejava. Acredito que podemos voltar ao assunto em futuras sessões, porque ele dá muito pano pra manga. Até a próxima!
  1. Eu também achei esse episodio bem mais interessante que o primeiro.
    Mostrou o tanto quanto ela é insensível com relação a sentimentos humano normais, tava um tanto em dúvida no primeiro episodio com relação a sua “natureza”, mas ela aparenta ser uma humana “diferente” digamos assim. Quanto a isso acho um tanto difícil acreditar eles colocando crianças em guerra, num entendo o propósito disso e espero ser esclarecido quanto a isso, claro se for conveniente a história.
    Agora aquela revelação final com relação ao Major dela, se ele morreu então qual motivos ele teria para não contar isso pra ela? Penso eu que teve ter tido algum tipo de promessa do Major com o ruivinho lá, num sei.
    As patadas que ela deu na garota de óculos, e a carta que ela escreveu lá kkkkk, aquilo foi hilário. Deu pra perceber quer aquele trabalho num se trata somente de escrever carta, e sim conseguir colocar os sentimentos de uma pessoa no papel, o que é bastante complicado eu acho. O ser humano é complicado demais, o exemplo foi a maluca lá bancando a dificio kkkkkk.
    Bom é isso, me descupem se eu falei bobagem, mas é assistindo mais pra ver a Violet saber o que é EU TE AMO.
    Ótimo Café com Anime, até o proximo capitulo.
    XD

    • Fábio "Mexicano" Godoy

      Seres humanos enviando crianças e adolescentes para a guerra é algo que acontece desde que existem guerras e desde que existem crianças, provavelmente =D A própria natureza disruptiva de uma guerra garante que necessariamente alguma coisa muito errada vai acontecer, e entre as tantas coisas erradas que acontecem em guerras, pode ser que crianças sejam enviadas para os frontes de batalha. Normalmente não se trata de maldade ou sadismo, mas de necessidade – algum tipo de necessidade, desde a falta de pessoas em idade mais adequada até o simples estabelecimento de exemplos e padrões ideológicos. No caso da Violet, parece ter sido um tema comum em ficção: quiseram criar um tipo de “soldado perfeito”, criando-a desde criança para isso. O resultado é essa personalidade quebrada que ela possui, anti-social mesmo. Fosse no mundo real, ela precisaria de terapia, mas isso não daria uma história interessante =)

      E me parece já bem estabelecido desde o primeiro episódio que o Gilbert está morto. Há várias razões possíveis para o Hodgins não querer contar isso para a Violet, tanto as boas intenções (a garota já é toda ferrada da cabeça, ele pode achar que ter que lidar com mais isso vai ser demais para ela) quanto as mais egoístas, algum motivo ou motivos pessoais. Como até mesmo para a Cattleya, que parece ser a pessoa mais próxima dele, talvez uma confidente mesmo, o Hodgins se recusou a dizer que o Gilbert está morto, preferindo o eufemismo “ele não vai mais voltar”, tendo a acreditar que ele carrega um fardo pesado sobre seus ombros. E também precisa de terapia.

      Obrigado pela visita e pelo comentário! Volte sempre =)

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