O episódio 5 de Comic Girls tem um curto momento praia. Afinal, é verão. Mas é generoso com quem aguarda meninas fofas de biquini. Porém, o fanservice serve ao enredo, já que contribui para apresentar a estrela do episódio: Koyume. A garota extrovertida, sempre alegre, que tem facilidade para fazer amigos, pois é muito comunicativa. O seu problema? É que a sua editora acredita que Koyume não tem experiência amorosa suficiente para manter uma série. A dramédia está posta. Apaixonar-se seria a solução. E é Tsubasa o interesse romântico da garota. Será Koyume capaz de confessar os seus sentimentos?

A primeira parte do episódio aproveita o verão para levar as mangakás a praia. Uma ideia de Koyume que pega todas de surpresa. Entre a exibição de corpos (os seios volumosos de Koyume, a beleza esguia de Ruki [o humor com o seu complexo de não alcançar o seu pseudônimo “Peituda” Himeko-sensei continua], a perfeição de Tsubasa e a fofura de Kaos) e o divertimento das garotas, a personalidade de Koyume ganha destaque. Toda a sua autoconfiança no convívio com as pessoas, resultado de sua expansividade e simpatia, esbarra no fato de não ter tido uma experiência amorosa que indicasse como casais se relacionam quando estão verdadeiramente apaixonados. E na praia, o seu fascínio por Tsubasa fica em evidência, escutando-a descrever um dia memorável (proporcionado pela impetuosidade de Koyume).

Aquele episódio de praia, mas com muito conteúdo.

Em sua segunda metade, o episódio traz uma separação entre os gostos das integrantes do dormitório. Tsubasa e Kaos jogam videogame, já que não vão as compras com Koyume e Ruki, que são mais afeitas à moda. O desleixo de Tsubasa faz parte do seu charme e a vincula à despreocupação de um herói shounen. Enquanto Kaos, apesar de sua preferência pelo moe, não demonstra aptidão no que concerne à arte do bem-vestir (e por isso recebeu um banho de loja em episódio anterior). Koyume e Ruki compartilham um gosto parecido em relação ao seus hobbys e também atenção ao que um visual atraente-fashion pode conquistar. Essa delimitação de preferências rompe estereótipos (apesar de alguns equívocos, como o comentário de Tsubasa para Kaos de que ela não é ruim jogando videogame, ainda que seja uma menina) ao mesmo tempo que a colocam confortavelmente em suas zonas de conforto em paralelo com o tipo de mangá que cada uma delas produz. O anime tem investido nesse jogo, e até o momento tem obtido excelente resultado, pois o humor explora esse contexto, assim como o desenvolvimento das personagens.

A diversão no shopping de Koyume e Ruki rende a apresentação do drama da autora shoujo, algo que a acompanha desde o primeiro episódio: o desconhecimento das relações amorosas, principalmente segundo a sua editora, que a cobra um melhor progresso do cotidiano de um namoro e de sentimentos como paixão e amor.  Para a editora, Koyume só é capaz de desenhar um one-shot, não a serialização de um romance, justamente pela falta de um romance para chamar de seu na vida real.

Garotas gamers: Tsubasa e Kaos em duelo no escuro.

Como se porta uma heroína shoujo quando arrebatada pelo amor? É a pergunta que atormenta Koyume, inexperiente com essas questões. Ruki a aconselha a escrever (com a prática atingirá o êxito), que não é preciso ter namorado para criar histórias românticas que sejam envolventes e convincentes. A autora ecchi tem sucesso sem ser expert naquilo que retrata: namoro e sexo. No ciclo da vida de Ruki, namorar seria muito dispendioso em relação ao tempo, prejudicaria a entrega dos volumes de sua série. Condição que ela aceita com certa resignação (ou muito drama?). Entende que relacionamento amoroso não é algo para ela.

Será que a insistência da editora de que Koyume precisa experienciar algo para poder escrever/desenhar é legítima? Uma autora pode construir uma história e criar suas relações a partir da observação, intuição, especulação e/ou da teoria? Pode-se dizer que a editora promove um tormento desnecessário a aspirante a mangaká. Uma pressão por acúmulo de aprendizado in loco que não significa necessariamente descrições que superarão a construção de uma idealização baseada na percepção do real.

Ruki em mais um pensamento (em voz alta) indecoroso. A sua imaginação assusta a funcionária.

Ainda assim, Ruki pergunta se Koyume tem interesse em alguém (e Ruki entende que a garota conseguiria escrever mangás mesmo se tivesse um namorado, diferentemente dela). O óbvio é dado a se perceber quando Ruki declara saber da queda de Koyume por Tsubasa. Para espanto da menina, a amiga propõe que ela convide Tsubasa para um encontro. Entre a surpresa e a tensão, a frase “mas somos duas garotas” surge. Mas a atração de Koyume é mais forte do que a sentença heteronormativa de que um casal é formado por um homem e uma mulher. Ruki lembra que Tsubasa recebe com bastante frequência confissões de amor vindas de meninas. E a autora shounen sempre interpreta como algo relacionado ao seu segredo profissional, já que ela assina os mangás como um pseudônimo masculino.

Para Koyume, Tsubasa faz o ideal de um garoto perfeito, algo que está ligado ao seu visual e aos modos que ela considera como a de um príncipe, gentil e determinada, mas que é inocente e fofa. Contudo, o que a move para Tsubasa ultrapassa a aparência tomboy, pois ela admira a garota/jovem profissional, sua dedicação, esforço e generosidade. Koyume é fascinada por Tsubasa, porém sente-se confusa com o sentimento que nutre pela jovem.

Para o encontro entre elas ocorrer, entra em cena a  zeladora Ririka, que  oferece duas entradas para o parque de diversões. Com o arranjo de Ruki, apenas Koyume e Tsubasa vão ao parque. Encontro em ação. Ruki, Kaos e Ririka espionam a dupla, aguardando a confissão e torcendo pelo melhor resultado para a iniciativa de Koyume.

Encontro no parque de diversões. Coração acelerado e o desejo de confessar o amor.

No entanto, o nervosismo e a vergonha acompanham Koyume. Elas andam na montanha-russa (e descobrimos que Tsubasa tem medo de andar no trem em alta velocidade), percorrem todo o parque, mas Koyume não consegue engendrar meios de abrir seu coração. Antes da roda gigante, Tsubasa pergunta se Koyume não se divertiria mais se chamasse o namorado para ir com ela. Quando a menina revela não ter ninguém em sua vida, Tsubasa elogia a amabilidade e beleza de Koyume e propõe encontrar um rapaz para confirmar suas palavras. Isso expõe a falta de delicadeza de Tsubasa (ela é muito direta), um defeito em um mar de qualidades, e o desejo da romântica Koyume sobre o primeiro amor: afável e inesquecível. O encontro ideal entre o shoujo e o shounen, com suas falhas e virtudes.

Na roda gigante, Koyume fica frente a frente com aquela que a desnorteia e a deslumbra. Desviar o foco para o problema – o maior incômodo em relação à sua arte – de precisar de experiência para escrever uma série shoujo, é sua estratégia para salvar-se da insegurança, contudo, o ato apenas a aproxima mais de Tsubasa, que novamente revela sua gentileza e sabedoria, declarando que a garota precisa se divertir e seguir seu próprio ritmo, até iniciar a sua vida profissional. Isto é, sem queimar etapas ou inventar a necessidade de vivências para desenhar suas histórias. Desse modo, opondo-se fortemente a defesa de que é preciso viver (e sofrer) para criar ficção.

No fim, Koyume não se confessa e se interroga sobre o amor, sobre o que sente por Tsubasa. Os próximos episódios revelarão se Koyume tomará coragem para uma declaração de amor ou se compreenderá que seu encanto tem mais a ver com admiração que com paixão. Algo normal para quem tem 15 anos. Ainda que desejemos que as personagens saibam o que querem e a vida seja preto no branco.

Como o “inusitado” desse episódio, temos a descoberta de Miharu Nijino, professora de Ruki, Kaos e Tsubasa no ensino médio, e Mayu Amisawa, editora de Kaos, como cosplayers. Quando flagrada por Koyume, e depois por Ririka, Miharu foge, envergonhada por ter sido vista em plena atividade de seu hobby. Talvez por desejar uma vida em segredo. A sua fantasia, para dar um toque especial a situação, era de Herói das Trevas, personagem do mangá de Tsubasa.

Kaos continua a adorar e se empolgar com meninas fofas (a cena na praia é muito engraçada, quando ela se distrai pensando em biquínis e no mundo das garotas e leva uma bolada no rosto, mas mesmo com a dor, não esconde a sua felicidade) e a exibir um humor destruidor contra si mesma. Para Kaos, um dia de autoestima claudicante, outro de ansiedade social indomável.  E  Ruki, com pensamentos indecorosos relacionados a  strip-tease de garotas vestidas com roupa de marinheiro (para espanto da funcionária da loja), permanece revelando seu gosto pelo lado pervertido do erotismo – mais abusando da graciosidade.

E para concluir, fica a frase de Ririka para Mayu, quando ela revela a amiga que Koyume e Tsubasa estão em um encontro: “não era assim no nosso tempo”. Agora é! Mesmo que hajam dúvidas e não aceitação na vida real e falsas expectativas na ficção. O entusiasmo de Ririka durante todo o percurso da “investigação” evidencia que em Comic Girls o yuri está no ar. Ainda que seja como gênero de mangá (e de anime) a serviço da arte e do humor.

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