Listeners – Saca só essa playlist!
Mas não vai ter playlist, desculpa. Não tem My Bloody Valentine no Spotify e parei por aí a busca. Eu sei que ainda tem o youtube, mas estou com uma internet horrível e quero focar naquilo que Listeners não tem: história. É hora do rock “salvar o mundo” no Anime21!
Listeners é uma grande carta de amor ao rock inglês e americano, no máximo eu posso dizer que a banda alemã homenageada em um episódio é prova de que o anime é baseado na playlist de favoritos da mente por trás da empreitada, pois, se a exceção comprova a regra, a regra é charfurdar em histórias populares…
Você pode não ouvir música, mas tenho certeza que já ouviu Beatles. Você pode não achar que rock é coisa do diabo, mas já deve ter ouvido falar de um músico que vendeu a alma a ele. Você pode não saber o que a história do rock conta, mas reconhece suas figuras.
É assim que Listeners opera, mesclando conceitos e ideias relacionados a personalidades do rock a uma história que se propõe a ser original, mas na verdade se perde na referência. O trabalho de pesquisa para o anime não foi mal-feito, como usar esse material foi o problema.
Na história acompanhamos Echo, um jovem catador que em um belo dia no lixão encontra Mu. Mas quem é Mu? Ela é uma Player, um tipo de herói que se pluga a um amplificador, dá vida a um mecha e o usa para derrotar os Earless, criaturas cujo nome já diz a que vieram (“Sem Ouvidos”). Mu sofre de amnésia e eles partem em uma jornada para descobrir a origem da garota. Para isso a chave é Jimi, o Player que esteve envolvido em um estranho incidente dez anos antes.
Listeners tem vários problemas e um deles com toda certeza é o seu mundo, que parece mais a concha de retalhos de um fã de várias vertentes do rock que um mundo coeso, que faça sentido em aspectos básicos como organização social e política.
Os Players têm o papel de proteger os humanos dos Earless, mas não ficam só nisso, eles centralizam o poder acumulando funções políticas e militares. Inclusive, há países em suas posses, os holofotes se viram todos para eles… isso não faz sentido, ao menos não se o mundo não é diferente do nosso, exceto a existência dos Players.
Além disso, a ligação entre drama pessoal, a heroína não saber quem é; e o problema do mundo, o conflito entre humanos e Earless, não é ruim, é coerente dada a ligação que ela tem com Jimi Stonefree. O que faz a trama não fluir é a tentativa de encaixar uma história entre referências a bandas, conceitos e movimentos; não o contrário, porque normal seria ter uma história primeiro para só depois encaixar referências, extras…
A interação entre os protagonistas é boa, mais devido ao trabalho de voz dos seiyuus que ao roteiro, o qual usa e abusa de citações diretas ou indiretas ao rock, mas quando não faz isso também não foge do lugar comum, tanto é que o problema da heroína parece aquém na maior parte do anime, assim como ocorre com o amadurecimento do protagonista, ganhando fôlego só na reta final e de uma forma questionável.
O Echo só deixa de ser um bebê chorão praticamente no final, e a Mu passa por uma fase rebelde em uma construção de crise de identidade muito confusa, tanto que não fica claro o quanto há de Mu nela e o quanto há da pessoa que ela era. Do meio para o fim o anime segue uma sucessão de eventos definitivos, contrariando a construção episódica da primeira metade e me deixando insatisfeito com o que vi dos personagens; divertidos, mas só seguindo a música.
O desenvolvimento dos protagonistas não é nulo: há briga, há carinho, uma amizade se fortalece, e se eles sentem inseguranças, encontram apoio um no outro. O problema é que são reféns da estrutura narrativa, a qual sempre os leva até o Player do episódio, inventa um conflito às vezes pouco produtivo para a trama. e foca em contemplar a biografia/discografia de quem é homenageado.
A estrutura se torna mais volátil na segunda metade, mas na primeira sinto que se perde tempo útil nisso, com falas exageradas de Players e a distribuição de pouca informação útil sobre Jimi, assim como praticamente nenhum esforço a fim de viabilizar o cumprimento do objetivo paralelo, que é a coexistência entre raças. Menos mal que o Echo nota a importância do problema, mas a maneira como ele é resolvido é outra bola fora. É num passe de mágica.
Para não dizer que não falei de flores, os específicos encerramentos de cada episódio podem não ser dos mais originais, mas dão cor ao anime, ainda mais por a edição de imagens mudar a cada episódio e ser um “remix” do que foi exibido ao longo dos mais de 20 minutos. A abertura tem uma música animada e boas cenas que encaixam muito bem dentro da proposta.
Inclusive, a animação não é um grande problema em Listeners (mesmo que o CG pudesse ser melhor e que tenha uns episódios mais fracos). O estúdio MAPPA não encantou com ela, mas também não horrorizou e o compositor de trilha sonora chamado para trabalhar no anime talvez tenha sido o que mais merece elogios, porque as músicas que complementam as cenas são de qualidade ímpar, têm um charme à parte.
Em visual e áudio eu não mudaria nada no anime, só na direção e no roteiro. Só não tudo porque dava para manter os personagens e ficar bom, era só adicionar outros personagens, elaborar subtramas melhores e encaixá-las em uma trama central mais coesa e com a intenção de resolver melhor os problemas maiores.
Enfim, terminar o anime resolvendo o problema social em um passe de mágica foi um desserviço à música, que é um canal de comunicação para várias críticas sociais que precisam ser constantemente incentivadas ou movimentos sufocam sem voz.
Sim, talvez esteja esperando demais de um anime feito com base em uma playlist, mas de que adianta homenagear a música sem aprender nada com as letras? Listeners poderia mais, mas nada conseguiu.
Aliás, conseguiu ser uma decepção completa já que até mesmo os problemas dos protagonistas foram resolvidos de forma clichê, sem se aprofundar em pontos que poderiam e deveriam ser respondidos, e de uma maneira tão inconsistente e insatisfatória que nem o clichê bom, o do beijo no final, como se a simbolizar a formação do casal, o anime teve. Não entregou nada que pudesse agradar quem não é um apaixonado pelas bandas referenciadas que nem eu.
E eu sou mesmo assim, morri de felicidade com as referências, mas nada disso salvou o anime. Não vou negar que me diverti, mas o final botou tudo a perder, me fazendo não perder um encanto que é nostálgico para mim (a maioria das bandas exploradas no anime eu já ouvi e adoro), mas qualquer esperança de que Listeners pudesse não ser tão ruim.
Por fim, Listeners só vale a pena para o otaku muito rockeiro mesmo, aquele que ouve o cd, pesquisa sobre a banda, assiste a shows, compra camisa etc. Sim, eu estou falando de mim; estou falando de você?
Se já tiver visto o anime sinta-se à vontade para dar sua opinião, se não, mas vai ver, olha, boa sorte para você. Espero que ao menos tenha a ligação afetiva que eu tive, mas reconheça que Listeners é uma droga, infelizmente, daquelas que não dão uma viagem daora…
Até a próxima!