Shuzo Oshimi é meu mangaká favorito, mas leio seus mangás sem pressa, pois gosto de apreciar as obras desse autor maravilhoso. Okaeri Alice (Seja Bem-Vinda, Alice) é seu mais novo mangá em lançamento na Bessatsu Shonen Magazine (revista mensal em que sai Shingeki no Kyojin e onde o autor já lançou alguns de seus títulos).

Na história acompanhamos três estudantes; Yohei, Kei e Yui. Os três se conhecem desde a infância e enquanto Yohei começa a ter consciência do desejo sexual, ele presencia uma cena que muda seu mundo.

Okaeri Alice trata da descoberta da sexualidade com clichês, mas também com originalidade. Inclusive, eu acho que o mangá irá além no tema, extrapolando o romance ao adentrar territórios mais sensíveis.

Desculpe a indiscrição, mas você já se masturbou? Parece uma pergunta sacana, mas não é, faz sentido no contexto. Se você já fez isso e já falou disso com algum amigo ou amiga, então sabe pelo que o Yohei passou no primeiro capítulo. Aliás, neste artigo de primeiras impressões comentarei os dois primeiros, pois só no segundo o mangá mostra a que veio.

Yohei é incentivado pelo amigo, Kei, a se masturbar e não é incomum e nem feio que faça isso pensando na garota pela qual está apaixonado, Yui.

Quem nunca fez o mesmo passando pela puberdade? Isso talvez role mais com os homens, mas com certeza rola também com as mulheres e já no início Oshimi dá indícios de que não vai se prender a convenções.

Na verdade, quando ele fez isso em seus mangás? Já leu Happiness (lançamento da New Pop)? Indico muito e é uma prova do que estou falando.

Enfim, concorda que se masturbar é algo natural? Fazer isso após ver o amigo beijando sua paixonite, que está afim dele, talvez não, mas quando se trata de desejo sexual esse normal varia muito de pessoa para pessoa, então é mesmo aceitável julgar alguém apenas por ser diferente de você? Ainda mais se a pessoa ainda está na fase de descobrir o que gosta?

A princípio é disso que o mangá trata, da descoberta do desejo e da externalização dele, ainda que ela se dê no íntimo e venha carregada com uma dose de culpa. Você muito provavelmente já se masturbou e se sentiu culpado depois, não sentiu? Eu tento me libertar desse sentimento, mas sei que não é moleza. Inclusive, tem uma cena do Yohei culpado assim…

E é aí que o Oshimi pisa de novo em um território que explora como ninguém, o do fetiche. Se masturbar depois de ver um beijo, meio que um amasso, é uma introdução quase que embrionária a isso, mas não é como se dá em um mangá que visa agradar ao leitor e pronto. A situação é desconfortável e desconforto também pode ser fonte de prazer. Nasce aí o fetiche. Não que também não possa surgir do simples prazer.

O ponto é que o autor mexe com esse tema a carreira toda e para a construção de personagens dessa faixa etária, jovens e jovens adultos, a sexualidade é um aspecto quase preponderante da personalidade, então faz sentido que ele explore isso, o que se faz necessário é o equilíbrio entre o clichê e a originalidade e Okaeri Alice prova que dá para ter o melhor dos dois.

O tema central nem me parece ser tanto o sexo, mas o conhecimento de um prazer conquistado com mais facilidade por meio dele, ao se descobrir o que se gosta e como gosta. O por que também pode ser relevante de se refletir sobre, mas nem todo mundo chega a essa resposta, o mais comum é que apenas descubramos nossos fetiches e os soterremos ou…

Aceitemos, aceitemos que sentimos prazer de uma maneira tão pessoal e peculiar que não pode e não deve ser considerada errada por ninguém (exceto se leis forem infringidas). Estou mais confabulando sobre o que acho que também vai ser o mangá, a eterna discussão entre moral e desejo, mas né, vai ser estranho se não tivermos um tanto disso.

O Oshimi é um autor bom o suficiente para trabalhar o mundo e os personagens com qualidade. Sendo assim, os clichês bons (triângulo amoroao, “traição”, reencontro, etc) servem para nos situar facilmente no mundo, estabelecer uma fácil associação, enquanto a criatividade e originalidade (a representação do orgasmo, as intenções do amigo, a apresentação na sala, etc) tornam a trama interessante, até instigante.

Aquilo que é melhor que a masturbação obviamente é o sexo, mas sexo não é só penetração e eu imagino que você saiba disso, então há um caminho vasto para se chegar até ele, assim como para ir além.

Eu mal posso esperar para ver o que vai acontecer, mas já tenho certeza de uma coisa, abandone qualquer esperança de um triângulo amoroso convencional, não é o que veremos aqui, até porque quem estimula o Yohei não é convencional, muito menos parece “limitado” por uma paixão, mesmo se for apaixonado por ele.

Como corre o risco de você ainda não ter lido o segundo capítulo, ou até mesmo ainda não ter lido nada do mangá, não vou comentar a fundo o que aconteceu, já basta comentar as intenções de Okaeri Alice e pontuar porque você deveria ler.

Os mangás do Oshimi costumam começar bem, mas vão ficando ainda melhores (mais intrigantes e fascinantes) a cada capítulo, então ainda acho cedo para mensurar seu potencial.

Indico que leia Avant-garde Yumeko, mangá de volume único, e o one-shot Waltz; os dois não têm exatamente a sexualidade como tema, mas são duas obras que dialogam com criatividade sobre o assunto.

Yohei, Yui e Kei vão se descobrir e permitir e eu mal posso esperar para ver isso. Claro, esperando que o autor trabalhe bem todas as liberdades as quais sou a favor quando se trata da sexualidade.

Preconceito existe, não deve ser ignorado, mas há um mundo tão diverso e bonito além dele que me faz defender não só a naturalidade do buscar prazer, como também o quão recompensante deve ser se descobrir por isso.

Até a próxima!

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