Moriarty: O Patriota – ep 2 – As chamas da revolução ardem pela primeira vez
Ainda que Moriarty seja baseado em um personagem icônico o protagonista dessa história é completamente diferente do presente nas histórias de Arthur Conan Doyle. O personagem do anime tem ideais e motivações muito próprias. Além do mais, no episódio anterior ele parecia mais um detetive do que um bandido. E tendo em vista sua inspiração literária eu me questiono sobre seu futuro como personagem.
O Moriarty formará sua gangue e se tornará o Napoleão do crime das histórias ou será apenas um detetive justiceiro? Isso ainda é algo que o anime deve responder. De qualquer forma o Moriarty original nunca foi um detetive, pois é bom lembrar que o Sherlock se dedicou ao conhecimento de uma grande gama de assuntos dos mais variados, todos de alguma utilidade para seu ramo, além de trabalhar durante anos desenvolvendo e aprimorando suas técnicas de dedução. Que está mais para uma ciência do que para qualquer outra coisa.
Mas isso não significa que o Moriarty não seja capaz de fazer boas deduções, o ponto é que eu acharia interessante que ele utilizasse de habilidades próprias. Na minha visão, das histórias de Sherlock Holmes, o famoso detetive é apenas a terceira pessoa mais inteligente da obra. Sendo o seu irmão Mycroft o mais genial e o professor Moriarty vindo logo em seguida. Nas palavras do próprio Holmes “…um gênio, um filósofo, um pensador abstrato.” é tudo isso e ainda é uma celebridade matemática.
E aqui voltamos ao anime. Logo no começo do episódio ele mostra ser capaz de acertar os vencedores das corridas de cavalos com uma grande precisão. No caso do Sherlock ele iria procurar informações, pois não há deduções sem fatos.
Mas nesse caso o Moriarty pode muito bem não ter nenhum fato concreto a sua disposição, apenas com dados e uma folha de papel ele pode fazer suas “deduções”. Seus fatos seriam números e suas deduções seriam compostas por fórmulas matemáticas. Enfim, seria interessante utilizar das habilidades particulares desse personagem, gostaria de ver isso.
E gostaria de entrar agora em um assunto que julgo necessário. O contexto histórico. Pois a visão ideológica do Moriarty nada mais é que uma oposição ao sistema social vigente. Ele se opõe à soberania aristocrática. Mas é importante lembrar que estamos falando de uma sociedade impactada pela revolução industrial. E a nobreza da época estava em decadência. A revolução francesa que derrubou a nobreza e alçou a burguesia como classe dominante é um acontecimento do século XVIII, século anterior ao ambientado pelo anime.
Contudo para a conservadora Inglaterra o fim da aristocracia significava também o fim das liberdades e do próprio Estado como era entendido. Ou seja, era uma situação política muito própria. Como consequência ocorre uma harmonia entre as classes, e até certo ponto uma homogeneidade.
A nobreza decadente se plebeiza e a burguesia tenta imitar os hábitos aristocráticos. A luta de classes tem seu impasse, ou melhor, é formada uma aliança. Ou seja, a visão dos protagonistas faria mais sentido numa França pré-revolução onde os privilégios da nobreza significavam abusos aristocráticos do que na realidade britânica.
Claro, a ideia vaga de que há desigualdade e de que há uma classe “opressora” e outra classe “oprimida” é contemporânea ao período ambientado. O anime não erra igual Arte ao colocar uma feminista em pleno renascimento. A ideia de desigualdade e de injustiça social é condizente com a época aqui ambientada. É até mais velha para dizer a verdade.
Contudo, o anime erra tanto na exposição daqueles que são os “opressores” quanto daqueles que são os “heróis” que salvarão os “oprimidos”. Pois os protagonistas de uma história serem falhos, e não apenas isso mas deliberadamente pessoas erradas e imorais é algo muito condizente com esse tipo de proposta.
O erro do anime está em não saber criar nuanças e nem saber contrasta-los com aquele mundo falho, pois a função do personagem nesse tipo de história é ser o redentor do mundo, ainda que essa pessoa-herói seja tão ou ainda mais falha que o mundo que planeja salvar.
O Light Yagami de Death Note por exemplo é um personagem que faz isso, pois não importa se você concorda ou não com suas ideias e atitudes elas ainda mostram o quão podre é o mundo. Qualquer lado que você escolha te dará a visão da mesma coisa, porém de perspectivas diferentes. Aqui não há contraste, e não há porque o anime trata os seus “inimigos” da forma mais estereotipada e vazia possível.
E por fim tenho que falar da composição narrativa do episódio. Porque ela é simplesmente horrorosa. Faz muito tempo que não vejo algo tão ruim. Alguns pontos só são entendíveis após alguma reflexão. E não é como se fosse pelo mistério, é apenas porque o anime não consegue apresentá-los corretamente. É até triste de ver.
O anime não soube conectar uma cena à outra. Ele te obriga a lembrar de coisas que quando seu sentido é revelado nenhuma alusão à cena que na teoria deveria explicar é feita. Além da transição temporal que é confusa e mal executada.
Não sei dizer se isso é um problema de adaptação ou se é algo já presente no material original. Mas se for o último caso acredito que a obra poderia ter feito alterações cirúrgicas que salvariam o episódio de inúmeros problemas narrativos.
Mas enfim, não tenho mais muito para dizer ou reclamar. Até mais.