BNA (Brand New Animal) é mais um anime original do estúdio Trigger, a produção apresenta um traço mais cartunesco e um formato mais light, com abertura e encerramento menores e menos tempo de duração por episódio.

Foram lançados seis episódios adiantadamente como pré-estreia e é esse pedaço do anime que comentarei abaixo aqui no Anime21!

Na história acompanhamos Michiru, uma garota que misteriosamente se transformou em besta (um ser antropomórfico de outro ramo evolutivo) e parte para Animacity (a cidade das bestas) a fim de evitar a discriminação e descobrir como voltar a ser humana.

BNA é um misto de aventura, ação, comédia e drama desenvolvido na medida certa. O anime aprofunda a personagem em meio as confusões que ela se mete.

Logo de cara a Michiru chega na cidade e um festival de aniversário de dez anos começa. A forma como a população se concentra na praça para comemorar é meio boba, mas se você entender como uma quebra cômica típica do cartoon a cena faz sentido, além de ser um momento menor, o que importa é o encontro dela com Shirou, o lobo branco protetetor das bestas.

Ele quem captura as bestas criminosas que sabotaram o evento, mas a base de violência excessiva e isso assusta a garota.

Humanos estavam por trás de toda a confusão e ao longo dos episódios o anime dá pequenos vislumbres da discriminação que as bestas sofrem fora de Animacity. Contudo, senti falta de um pouco mais de contextualização histórica e social na série.

Não acho que isso seja um grande problema, até porque o Shirou levanta uma bandeira anti-humanos e eventualmente a questão deve ser aprofundada, mas os pedaços em que o assunto é abordado acabam apenas deixando subentendido a desavença sem explicar melhor porque chega-se ao extremo de humanos caçarem bestas e Animacity ser o refúgio.

Isso é relevante porque em algum nível o anime dá a entender que diz respeito a Michiru, a transformação dela e da amiga em besta. Que há uma conspiração envolvendo isso tudo.

As tomadas em que aparece o presidente da companhia farmacêutica que opera na cidade dão aquele ar de que a garota se trata de um experimento humano, e, honestamente, deve ser isso mesmo.

Sua constituição diferenciada de outras bestas, a permitindo mudar a forma do corpo, é sinal mais que suficiente para levar o público a essa conclusão, ainda mais porque a amiga dela também vira besta e ambas sofreram um acidente de trânsito antes disso. Deve ter sido ali que elas tiveram seus corpos modificados, qualquer explicação diferente vai ter que se esforçar muito para me convencer.

Enfim, voltando a Shirou e a relação de “irmão mais velho” que ele desenvolve com Michiru, posso afirmar que gosto bastante do personagem, de sua altivez, de seu jeitão misterioso e da segurança que ele passa.

Se Michiru é a personagem principal ds trama, Shirou é o protagonista, aquele que resolve as pelejas usandos os punhos e seu olfato excepcional.

As coisas incríveis que ele faz e a forma como ele e a garota são observados dão a entender que não é só ela que tem um corpo diferente, mas ele também.

Seria Shirou o tal lobo prateado, o deus lobo das bestas? E se näo for, como Michiru teve um vislumbre desse ser ao chegar a cidade, e em um momento que sequer o conhecia?

Pensar que ele é essa entidade é o raciocínio mais lógico e apesar de BNA não nos apresentar a grandes reviravoltas o anime diverte e flui bem, tomando mais o caminho de justificar muitas de suas revelações a partir de pequenos detalhes que são distribuídos ao longo dos episódios.

A trama segue uma estrutura episódica, mas nada é descartado ou repetido desnecessariamente, entregando o desenvolvimento necessário e gradativo a Michiru em meio a situações não menos criativas e divertidas.

Aliás, você pode achar a Michiru meio irritante a princípio (não foi o meu caso), mas ela melhora bastante ao passo em que vai sendo mostrado ao público as dificuldades pelas quais ela passou e como mesmo renegando a cidade a garota acaba se afeiçoando aos seus moradores e seu dia a dia.

Michiru tem uma personalidade forte, é corajosa e não foge de um problema, além de ser prestativa. A garota desvia o caminho para ajudar outras pessoas e é muito por isso que conseguimos ver nuances suas que dificilmente seriam vistas se ela só agisse em prol de seus próprios objetivos.

Inclusive, a cada episódio fica claro o conflito dela entre voltar a ser humana e viver em Animacity. Eu não duvido que no final da história ela decida ficar na cidade e assim abraçar sua nova “identidade”. Seria um desfecho previsível e clichê, mas não necessariamente ruim.

Identidade é mesmo uma palavra que associo a obra, porque tanto se trata da aventura da personagem em busca da sua, quanto enxergo valores muito bons na produção, seja em animação e trilha sonora ou como a história é contada.

BNA não é inovador sob nenhum aspecto, mas faz o serviço de casa em proporcionar divertimento com reflexão adequada sobre o drama que explora.

Não é estranho eu ver um anime desse estúdio e notar uma forte identidade da produção (não à toa mesmo sem saber o estúdio é fácil advinhar) que vai bem além do simples produto que muitas produções parecem ser.

Voltando a trama, todos os seis primeiros episódios são bons, mas destaco o segundo, o quinto e o sexto (além, é claro, da chamativa estreia).

O segundo mexe com um tema muito coerente dado o fato da personagem principal ser uma mulher, que é o lugar da mulher naquela sociedade, da mulher marginalizada que precisa tomar atitudes cruéis a fim de defender seu próprio território.

Eu sei que isso parece desumano, mas não é bem assim se você pensa que as bestas são animais “animais” e na selva impera a lei do mais forte…

Animacity não é uma selva, mas também não apresenta um distanciamento aparentemente tão grande, muitas vezes ilusório, de uma como ocorre na “civilizada” sociedade humana.

Então sim, entendo a situação do grupo de mulheres e a revolta da Michiru contra esse determinismo social que impera, principalmente, entre os marginalizados, passando a ideia de que é necessário se aproveitar do próximo para sobreviver.

Ela luta contra isso e ao mesmo tempo em que presencia coisas horríveis escondidas entre os prédios da cidade, também se depara com o carinho e os anseios daqueles que nela habitam.

Acho que a beleza indescritível de uma cultura é algo que você só consegue compreender vivenciando-a no dia a dia, ainda que muitas das situações em que a Michiru se envolve não sejam o melhor exemplo de cotidiano…

No quinto episódio o beisebol mortal me cativou com personagens pelos quais não esperava me sensibilizar, muitos momentos engraçados e um desfecho até imprevisto para um episódio em que a Michiru se destacou e merecia algo que a premiasse.

Mas mais importante que um troféu ela obteve uma vitória moral e esse é o tipo de coisa que agrega ao seu sentimento de pertencimento a cidade.

Por outro lado, a amiga dela aparece com tudo no sexto episódio e isso a faz focar suas atenções nela, na tentativa de recuperar o que teve com ela um dia, enquanto humana. Porém, isso não é mais possível porque ambas mudaram.

Nazuna mudou, mas Michiru também, e não é fácil conciliar desejos em uma situação dessas, diria até que é impossível e o proseguimento da trama deve mostrar isso, que um lado vai ter que ruir para só assim (talvez) se alinhar ao outro.

O culto suspeito em que Nazuna se encontra é o que deve desmoronar, mas nada garante que mesmo após isso a amizade possa ser restabelecida. Acho, inclusive, que ela jamais poderá voltar a ser o que foi um dia. Ainda que elas continuem amigas, a amizade precisará ser “reconstruída”.

O que é bom, afinal, a vida como humana de Michiru ficou para trás, pertence a um passado que não vai voltar, ou não deve voltar caso o desfecho da trama seja coerente.

Não penso que seria incoerente ela voltar a ser humana, só humana, mas seria incoerente apagar tudo o que viveu e a mudou, porque Michiru muda um pouco mais a cada episódio.

Mudou ao ser apresentada a um novo mundo e a uma violência que ela desconhecia no episódio um, mudou ao ter sua vida posta em risco no episódio três, mudou ao perceber que não pertencia ao mundo humano como estava no episódio quatro.

Na verdade, é quase leviano da minha parte não comentar com mais carinho a estreia, o terceiro e o quarto episódio; mas acho que esse artigo já está grande demais e se eu escrever que esses episódios também são muito bons já é o suficiente.

BNA é um anime que vai crescendo a cada episódio, adicionando camadas e reforçando seus pontos fortes.

Houve um momentos em que tive a impressão de que a trama poderia ser encurtada. Se a Michiru tivesse questionado os cientistas sobre o que eles sabiam talvez ela fizesse logo a conexão entre sua transformação e a empresa farmaucêtica, mas não é como se tivesse sido incoerente se afastar naquele momento, ainda mais com a presença da polícia, né.

Quanto a transformação das bestas em humanos, deve haver uma boa explicação boa para ela e deve ser revelada mais a frente. Eu acho que as bestas se transformam por costume (muitos anos fazendo isso para se misturar entre os humanos) ou talvez seja uma bizarra exigência dos humanos para manter a cidade? Não sei, mas não deve ser nada complexo.

A maneira como as bestas são tratadas é realmente bem triste, ela me lembra a segregação de minorias nada incomum na história humana e até por isso eu espero que toda essa problemática social seja ainda mais abordada, mesmo que não tão profundamente.

Ademais, não tenho o que reclamar do anime. Não é uma obra-prima nem nada assim, mas diverte, é bem produzido e a história se sustenta, inclusive com uma ou outra saída não tão previsível assim. O que me agrada e mostra como a história é pensada com cuidado, e não só isso, a forma de contá-la também.

BNA é o maio barato, duvido você não gostar!

Até a próxima!

Comentários