Para quem foi tão odiada quanto a Gabi, ela merece ser reconhecida pelo que fez nesse episódio. Sem dúvidas ela foi a grande heroína do episódio.

Esse que se destaca pelo quão confuso as coisas continuam para os personagens. É preciso destacar isso, pois muitas das decisões, inclusive as de cunho moral, estão sendo tomadas nesse tipo de cenário. Um exemplo disso é o Connie e o Jean em suas falas e atitudes.

No caso do Connie ao decidir sacrificar a vida de uma criança para poder salvar a da sua mãe e o Jean naquela sua análise sobre como as coisas chegaram até aquele ponto.

Na verdade, o Jean não está totalmente errado, porque é verdade que foi o fato de verem os eldianos como monstros que os levou até aquela situação onde eles de fato agiram como monstros ao tentarem destruir o mundo todo.

Claro que ainda aqui haveria uma generalização, coisa que deve ser destacada. Pois há uma grande diferença entre o ato de um indivíduo e o de toda uma nação. Em verdade até podemos dizer que uma nação ou um povo nas faz nada e que toda afirmação desse tipo não passa de uma figura de linguagem.

Sempre quem faz algo é alguém específico. Sendo assim não é Paradis e nem os eldianos quem estão se voltando contra a humanidade, mas Eren Yeager quem está o fazendo. Ele, apenas ele e seus poucos apoiadores. Isso é importante, porém mesmo nesse caso nós estaríamos esquecendo de outros pontos importantes.

Por exemplo, que se Eren se tornou um monstro, então foi por que antes alguém o viu como um monstro. Porque pessoas em Marley realmente enxergavam ele e seus conterrâneos de tal forma.

Muitas pessoas na verdade, porque além de terem motivos sociais e históricos (ainda que isso não justifique o ódio em si) ainda é preciso ressaltar que o Estado de Marley doutrinava as pessoas para verem os eldianos dessa forma, em especial os de Paradis.

Ou seja, criaram um monstro em suas imaginações e por consequência de seus atos ele se tornou realidade. Isso é verdade e nesse sentido o Jean possui toda a razão.

Mas se de um lado o episódio nos trouxe esse pessimismo, de outro eu diria que nos trouxe certo otimismo. Uma das coisas mais marcante da morte da Sasha, ao meu ver, é ter em conta que de todos os personagens ela era a mais alheia a todo esse ciclo de ódio que esse episódio tratou, pois ela era realmente alguém inocente de coração.

A sua morte tem, portanto, um grande valor simbólico para o anime. E eu diria que nesse episódio nós vimos, de certa forma, o renascer da personagem. Ou melhor, o renascer daquilo que ela representa, em especial na personagem da Gabi.

Claro que a Gabi não é alguém inocente, tanto que ela admite a sua culpa durante esse episódio. Mas justamente por entender os seus erros e ser capaz de compreender esse ciclo de ódio é que ela pôde se redimir.

Sendo assim, ela também se tornou alguém alheio a todo esse ciclo. Ainda que claro, alheia apenas num sentido estreito do que seria estar alheio. A própria Sasha foi para a guerra e matou muitas pessoas, inclusive sendo esse um dos motivos que levou o pai da Sasha a perdoar a assassina de sua filha.

Mas note, quando digo estar alheia quero dizer que ela, uma vez tomada a consciência desse problema, se propõe a lutar contra esses impulsos e essas ideias que a fez perpetuar o mesmo ódio que atribuía a seus inimigos, se tornando dessa forma semelhante a eles.

E note que isso não significa não ser influenciado por tudo isso, mas apenas lutar contra isso de maneira consciente. Saber que você está sendo levado pela correnteza, por si só, não faz com que você deixe de ser carregado pelas águas, mas é o princípio de toda reação que vise distancia-lo do destino ao qual as forças fluviais estão a leva-lo.

No final das contas não se pode fugir da floresta, pois a floresta não está apenas no mundo externo. Não, a floresta está também no mundo interno. E esta floresta irá com você para qualquer canto que você for, não importa o quão distante esse lugar seja.

E o grande problema de se “estar nessa floresta” é que no final das contas você se tornará um monstro assim como aquele que pretendia combater. Nas palavras de Friedrich Nietzsche “Aquele que luta com monstros deve acautelar-se para não se tornar também um monstro.

Quando se olha por muito tempo para um abismo, o abismo olha para você”. E a ideia do anime me parece ser que quando desumanizamos as outras pessoas, acabamos por desumanizar a nós mesmos. É nesse sentido onde acredito que o “sair da floresta” esteja apontando.

Quero dizer, que ver as outras pessoas como monstros é algo central para a perpetuação do ciclo de ódio. O que levanta a necessidade do contrário, de humanizarmos as pessoas, mesmo aquelas que nos parecem mais desprezíveis e detestáveis.

É por isso que eu diria até que o anime é bastante ousado, não se prendendo a simplesmente negar as justificativas que desumanizam o ser humano.

O que parece que esse núcleo narrativo está dizendo é que devemos estar realmente dispostos a perdoar as pessoas, mesmo aquelas que vemos como monstros. É devolver a sua humanidade por meio da nossa humanidade. O que convenhamos, já é bem mais complicado.

Mas apesar de todos os seus problemas e complicações, de fato acredito que a resposta “definitiva” para o problema do ciclo de ódio de Shingeki no Kyojin esteja personificado na personagem da Gabi.

E digo isso em especial pelo seu caminho trilhado. Tanto na apresentação e problematização dessa questão, quanto também em sua solução.

Sobre isso gostaria de citar Vinland Saga, um anime muito bom e que acredito ter chegado até uma conclusão muito similar dessa que apresentei. Então fica aqui a recomendação desse anime para quem se interessou por essa questão.

Eu até poderia me aprofundar mais no problema, mas já tive que sacrificar diversas coisas interessantes desse episódio só para falar dele. Além do mais, de forma alguma poderia fechar essa discussão e conclui-la de fato. Minha intenção aqui foi somente apresentar ideias e compartilha-las. Até mais.

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