No penúltimo episódio de Comic Girls, o fechamento do Dormitório Bunhousha é uma realidade. Contudo, o que poderia ser um drama, torna-se motivo de inspiração e força para descobrir o caminho a se seguir. Mensagens deixadas por ex-moradoras na parede do depósito, encontradas por Kaos quando auxilia a zeladora Ririko na limpeza, iluminam a menina a se dedicar ainda mais em um novo projeto. Novos projetos, pois ela apresenta quatro manuscritos a sua editora Amisawa e um deles é aceito. A série investiu em uma ligação emocional entre Kaos e o público e não deixa de ser recompensador ver seus esforços finalmente resultarem em reconhecimento. Assim, a História – outras estiverem na mesma condição e enfrentaram com coragem as dificuldades – comunica a Kaos que ela não está sozinha e que a única saída é se empenhar mais, acreditar (mesmo com certa dúvida) em suas habilidades e buscar ser natural, isto é, ter em perspectiva suas preferências (quando Kaos para de se exigir demais, ela acerta “a mão”).

No começo, as mangakás estão envolvidas com a resposta do questionário de carreira futura. A solicitação da indicação de uma segunda opção em relação à profissão revela certezas e dilemas. Para todas, mangá é a escolha número 1. E as asseverações/impasses destinadas a alternativa são condizentes com cada uma das garotas. Ruki mostra sua maturidade, ao expor com segurança a opção de lecionar na Educação Infantil. O futuro como mangaká pode, adiante, não reluzir tanto quanto o presente sinaliza. Apesar de suas inseguranças (com o corpo, a revelação de seu pseudônimo e o fato de não ter vivido ainda um relacionamento amoroso), Ruki sabe que frustrações e crises financeiras podem surgir e ter um porto seguro – algo em que se amparar – é essencial. Já Koyume não se sente constrangida com a possibilidade de trabalhar na loja de doces dos pais. A mesma opção se apresenta para Kaos, cujos pais são donos de uma confeitaria. Mas Kaos não alcançou a técnica necessária para ser atendente e nem possui a habilidade de se comunicar com o público, a sua autoestima e timidez não permitem tal desenvoltura. Excetuando mangá, não há nada em seus sonhos ou realidade. Problema semelhante ao de Tsubasa, que, não obstante a família ser abastada, apenas pensa em ser mangaká. E, para Tsu-chan, seguir as determinações familiares apresenta-se extremamente doloroso. Para aliviar a tensão (tensão sempre conduzida com leveza), surge Fuura-senpai, em uma entrada espetacular, do sótão para a sala escorregando por uma corda, para anunciar que a sua alternativa à profissão de mangaká é ser uma assombração de respeito. Ela tem o terror no sangue. O que nos conduz a uma lamentação: Suzu poderia (merecia) ter mais tempo em cena.

O que elas podem ser além de autoras de mangá? Certezas e dilemas para jovens talentos.

Kaos não esconde seu pânico, as dúvidas que a corroem. Se a pressão de ser mangaká já a abala, indicar uma outra rota para a vida é demasiado desgastante. Ririka vem em socorro das meninas e conta sua história. Enfim, a sua identidade mangaká é revelada, e diferentemente de Mayu e Nijino-sensei, ela chegou a publicar um mangá quando estudante (como as meninas do dormitório), contudo não prosseguiu na carreira, já que as limitações editoriais e os julgamentos tornaram cinza a alegria de desenhar. Kaos conhece o volume de Ririko que chegou às lojas (assinado como Rika Sonoda. Ririko não comenta sobre a obra em si e nem mostra os desenhos atuais – ela continua a fazer seus manuscritos –, assim, não fala abertamente sobre ter sido uma artista de mangá yuri), e mostra a zeladora que ainda hoje o seu trabalho é elogiado e procurado. Não conseguir corresponder às expectativas gerados por seu mangá de estreia – a popularidade e fãs alcançados – fez Ririko desistir da profissão. A pressão externa e interna que uma autora pode sofrer são discutidas na intervenção de Ririko. Ser jovem e ter em perspectivas suas metas e vê-las em emboscadas (nem sempre criadas pelo artista) podem ser um pesadelo ou gerar desânimo quando os obstáculos começam a brotar. Só que Ririko é feliz com sua escolha, permanecendo no mundo dos mangás auxiliando aspirantes na busca de seus sonhos, recepcionando-as e cuidando delas.

A entrada espetacular de Fuura-senpai, especialista na arte de ser uma assombração.

Em outro momento, ao contribuir na limpeza do depósito, repleto de mangás, livros e histórias, Kaos se depara com desenhos e frases motivacionais em uma parede que reforçam a importância de se levantar depois de cada queda e, no dia seguinte, esforçar-se ainda mais. A rejeição (ou rejeições) fazem parte da aventura, apenas não devem ser a sentença final. O depósito é um lugar que guardou mais que material relacionado a mangá, conservou as esperanças de muitos sonhadores.

Está chegando a hora da despedida. Lembranças de ex-moradoras para ajudar a seguir em frente.

Com o seu ânimo renovado, Kaos coloca “a mão na massa” e usa toda a sua criatividade para engendrar quatro manuscritos e, mais uma vez, apresentar-se diante de Mayu Amisawa. O curioso é que as histórias estão estritamente vinculadas ao que viveu no dormitório. As três primeiras são inspiradas na demografia ou gênero desenhado por cada uma das amigas-mangakás: shoujo, erótico e shounen. Só que Kaos não é bem-sucedida (é hilário ver como as personagens masculinas desses esboços se parecem com alguém próximo a menina Kaoruko, realizando um único gesto e fracassando na tentativa de parecer atraente ou descolado), e a editora é obrigado a rejeitá-los. No entanto, quando Mayu se depara com desenhos no estilo da própria Kaos, um mangá de 4-koma intitulado Comic Girls, que também segue as experiências no dormitório, girando em torno de quatro garotas do ensino médio em sua vida diária, ela percebe o talento e a vivacidade nos traços e no texto que sempre esperou de Kaos. Esse é um momento de duplo reconhecimento: da sua aposta se confirmando e do desabrochar de uma promessa artística. Sem dúvida que, para Mayu, a segunda sensação supera de longe a primeira. Todo o sofrimento de Kaos, as semanas de ansiedade e rejeição de suas histórias, chega ao fim, com o apoio e a inspiração de suas companheiras de dormitório.

Mayu, admiradora e editora de Kaos. Tudo o que se precisa é de alguém para confiar em seu talento.

Coerência ao máximo com a dinâmica entre as mangakás demonstrada desde o princípio. E o triunfo de Kaos é menos a publicação na revista de seu Comic Girls (e dependendo da recepção dos leitores, há a chance de ganhar uma serialização) que o fato de não perder de foco o seu objetivo, na única coisa que a deixa menos inquieta e dá uma direção a um vida de luta constante contra a ansiedade (e a autodepreciação também), que é desenhar mangá.

Nasce Comic Girls, resultado do esforço de Kaos-chan. Enfim, alguns minutos no paraíso.

Um episódio que consagra a determinação de Kaos e mostra que é importante seguir os sonhos, mas que a decisão de tomar outro rumo, não significa o fim do mundo.

Até o momento, a leveza e o cuidado com as emoções e perspectivas das garotas em relação a afetos, desejos e sonhos têm dado estofo para a sustentação da série, tornando-a crível (a respeito do universo ao qual pertence) e bem-humorada.

O fechamento do dormitório está próximo e o último episódio deve ser de despedida e juras de amizade eterna, ou seja, lágrimas e sorrisos. Enfim, as últimas emoções e risadas para os espectadores.

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