Denpa Kyoushi – ep 1 – Professor otaku
[sc:review nota=3]
Talvez seja mais preciso dizer que é um otaku que por acaso vira professor. Profissão de prestígio, não é o sonho de qualquer otaku? Ah, mas espere: antes mesmo de ser otaku, Junichirou era um gênio que emplacou um artigo científico em revistas acadêmicas mundialmente reconhecidas. E durante a faculdade concluiu a pesquisa teórica para uma tecnologia tão avançada que sequer pode se tornar realidade ainda nesse século. Então, acho que ser um otaku foi completamente irrelevante para sua contratação, não é mesmo? Você é um otaku e quer um bom emprego? Estude. Ou nasça gênio de anime. Mas bem, ainda não saí nem da sinopse de Denpa Kyoushi, deixe-me começar a falar logo do conteúdo desse anime.
Esse é mais um anime escolar do ponto de vista do professor. Sim, aquela mesma coisa que já falei de Assassination Classroom, o professor improvável e incomum que chega para transformar a vida de seus alunos. É uma história já contada várias vezes, mas eu sempre me divirto. Ou sempre me divertia, não sei, Denpa Kyoushi não me convenceu ainda. Talvez seja porque eu tivesse expectativas altas demais, ou talvez seja porque o anime glamuriza demais o otaku e isso me dá vontade de revirar os olhos as vezes. Provavelmente um pouco de cada. Vi comparações com Great Teacher Onizuka, mas devo dizer que por enquanto ainda acho essa comparação exagerada. GTO é muito superior e não vejo por onde Denpa Kyoushi possa sequer se aproximar dele ainda. Curiosamente não vi ninguém comparar com Assassination Classroom; acho que é porque eu sou um dos poucos que o assiste como uma história de um professor e seus alunos.
O recém-formado em física Junichirou Kagami se tornou um otaku NEET (Not in Employment, Education, or Training, acrônimo em inglês para definir pessoas, normalmente jovens, que não trabalham nem estudam nem estão procurando nenhum dos dois, equivalente no Brasil ao que se tem chamado de geração “nem-nem”). Ele não é um recluso (hikikomori), já que ele não tem dificuldades de interação social, mas apenas um folgado preguiçoso que gosta de dizer que sofre de “Só faço o que eu quero fazer”, o que, bom, volta a minha definição: folgado preguiçoso. Ele é tão inconveniente que sua irmã mais nova age para tirá-lo da acomodação e arranja um emprego para ele no que eu achava que fosse a escola dela, mas é um colegial então eu não sei porque ela parece nova demais para ser colegial. Talvez a mesma escola tenha primário também, sei lá. Balançando uma marreta ameaçadoramente sobre sua coleção de figures como argumento, ela convence o irmão mais velho a aceitar o emprego.
Nesse ponto há uma diferença gigantesca entre Denpa Kyoushi e Assassination Classroom ou Great Teacher Onizuka: nos dois últimos, Onizuka e Koro querem se tornar professores (as razões para isso são pouco importantes), enquanto Junichirou não quer. Imagino se ele irá mudar durante a história, porque o meu engajamento com o anime até agora está no mesmo nível de determinação dele em ser um professor, e eu acho provável que essas duas variáveis estejam relacionadas. Quero dizer, Onizuka é um maloqueiro e precisa fazer um esforço hercúleo para ser, da forma que é possível para ele, um bom professor, e o Koro é literalmente alvo de assassinato inclusive por seus alunos. Enquanto isso, Junichirou só precisa que as coisas caiam no colo dele: ele é um gênio nato, sua irmã arranja o emprego e ele o mantém mesmo desrespeitando o diretor em sua primeira conversa – sequer é questionado, cobrado ou odiado por isso, o diretor apenas ficou um pouco confuso, e só. Pô, ele é o protagonista! Eu gosto de protagonistas que se esforçam! Tem muita coisa que ele precisa se esforçar ainda, então continuo com esperanças, mas vamos ver.
A primeira lição dele foi boa, em que pese toda a falta de motivação até aqui. Enquanto estava conversando com o diretor, Junichirou escuta alguém cantando um tema de anime no terraço da escola, e ele sai correndo até lá porque ele é um otaku (nota: otakus não fazem isso, idiotas fazem) e quer chegar antes que a música acabe. Chegando, encontra Minako Kanou cantando, a aplaude e até elogia, mas quando ela diz que pretende se tornar uma dubladora profissional ele vira outra pessoa. Porque você vê, dubladores de anime são “deuses” ou coisa que o valha, a chance de alguém conseguir se tornar um dublador famoso é ridiculamente pequena então ela está sendo apenas prepotente ao dizer que vai se tornar uma dubladora. Que professor horrível! Sério, que tipo de professor diz a um aluno que ele não vai conseguir se tornar o que quer? Ela nem quer ser astronauta ou presidente dos Estados Unidos, só dubladora, por favor! Claro que há muita variável em jogo aí, mas a primeira coisa que ela precisa para conseguir é sim se esforçar, e isso ela está fazendo, e ele nem cita as outras variáveis que realmente importam (ter quem indique, por exemplo), faz um discurso irritante e meio místico sobre dubladores e … e eu nunca fiquei tão feliz com um soco bem dado em um anime. Não foi um tapa, não foi arremessar o que tiver à mão, a Minako deu um soco de verdade bem no meio da cara do Junichirou. E ela não se deixou abalar com o que ele disse não! Falou na cara dele que ela vai ser uma dubladora porque ela quer ser uma dubladora e está se esforçando para ser uma dubladora! Aqui, quem deveria ter aprendido a lição era o professor. Mas não era essa a lição.
Ainda que determinada, Minako é bastante ingênua. Ela foi de uma gangue de garotas da mesma classe que ela mas as abandonou em algum momento e, como resultado disso, passou a ser maltratada por suas ex-amigas e ignorada pelo resto da classe que tem medo de se aproximar dela e sofrer maus-tratos também. Abro um parêntese aqui para contar a história de maloqueira dela: aparentemente por causa de problemas familiares não especificados e até onde pude entender até hoje não resolvidos, ela entrou para a gangue das outras três garotas apenas porque queria encher a cabeça de qualquer coisa. E ao contrário da forma como “delinquentes” são retratados na maioria dos animes e mangás, elas não só ficavam até anoitecer na rua jogando fliperama. Elas faziam isso também, mas além disso faziam o que torna um delinquente realmente delinquente: compravam brigas. Até mostra a Minako apanhando brevemente. Ao contrário do estereótipo do otaku, pelo menos o estereótipo do delinquente juvenil não é glamurizado em Denpa Kyoushi, ponto positivo. E explica como ela aprendeu a socar tão bem. De todo modo, ela fazia isso mas no fundo continuava sendo infeliz. Pensava em se matar quando alguém a respondeu em um fórum online que se heróis não existem no mundo dela, Minako só precisa se tornar uma heroína ela mesma. E foi por isso que ela decidiu se tornar uma dubladora (a garota é realista! Quase não acredito que ela existe em um anime…), porque assim ela poderia fazer papéis de heroínas em animes.
Retornando ao presente, se essa história de virar uma heroína por um lado a salvou da depressão suicida, por outro sua ingenuidade a fez levar isso um pouco longe demais. Ela considera que o passado de delinquência é algo que ela precisa superar (muito bom), e que isso inclui suportar os maus-tratos das suas ex-amigas e suas consequências sem reagir (péssimo!) e sozinha, pois heróis são solitários (muito ruim!). O professor Junichirou percebe que isso é uma furada e está fazendo mal a e ela tenta conversar com Minako quando as garotas a fazem beber um suco qualquer com pó de giz e ela vai parar na enfermaria. Ela se recusa a aceitar qualquer ajuda, não demonstra nenhuma fraqueza na frente do professor, mas desaba aos prantos assim que ele sai da sala. Ela está motivada, mas ainda é muito frágil para aguentar tudo isso, muito inocente para saber lidar de alguma outra forma, e muito teimosa para aceitar qualquer ajuda. Mas o professor sabe que Minako precisa de ajuda, quer a garota queira quer não. Essa será a lição dela. Com isso em mente ele parte para dar uma lição nas delinquentes: as faz acreditar que seus dados pessoais, incluindo número de telefone e endereço de e-mail, foram divulgados publicamente em fóruns cheios de depravados (como elas haviam feito com a Minako, aliás). As máscaras de garotas valentes que as três vestem se espatifam enquanto elas caem no choro só de pensar o que isso irá trazer de consequência para elas, quando o professor Junichirou diz que era falso e que ele não havia publicado nada, só elas haviam visto. Apenas para que soubessem como a Minako estava se sentindo, essa foi a lição delas. A Minako viu o final e ficou brava com ele, porque afinal ela tinha que lidar com isso sozinha! Mas revelando que havia sido ele em primeiro lugar quem havia dito para ela se tornar uma heroína, antes mesmo que eles se conhecessem e dele ser um professor, o professor Junichirou faz Minako perceber que ela não havia chegado onde chegou sozinha, que ela precisava sim da ajuda de outros. Antes, e também agora, ela nunca esteve solitária.
Junichirou tem um longo caminho ainda, mais longo que o de outros protagonistas na mesma situação em animes congêneres, e o fato de tudo ser muito fácil para ele me incomoda, além da glamurização do modo de vida otaku. Mas acho que Denpa Kyoushi tem potencial para ser pelo menos divertido. Torço para que seja mais do que apenas isso, mas por enquanto não vou fazer nenhuma grande aposta nem ter nenhuma grande expectativa.