O episódio 10 revela a vida dupla levada por Tsu-chan: em Tóquio, uma mangaká, autora de obras shounens, que prefere vestimentas que a deixam mais confortável – que são roupas masculinas – e exibe uma segurança a ponto de aconselhar e proteger suas amigas (como um típico herói shounen). No entanto, em casa, com a família, Tsubasa é retraída, usa roupas de “princesa” e é obediente, e precisa esconder seu talento como desenhista de mangá dos pais, que são rigorosos e estipularam como condição de sua mudança para a capital japonesa, que ela abandonasse suas aspirações em relação ao mangá. Afinal, a garota tem um nome de família a zelar.

Essa nova situação nos leva aos mundos secretos de Tsubasa, já que a assinatura de suas obras é feita por meio de um pseudônimo masculino, e o medo de que o público não aceite sua verdadeira identidade move a manutenção do segredo. A liberdade de ser quem se é e experienciar seus desejos e decisões sem restrições, é algo que Tsu-chan desconhece. Por que ela se submete a essas interdições e mentiras que precisam ser sustentadas? O fato de ser uma autora de 16 com relativo sucesso artístico e comercial pode explicar a condição em que se encontra. Pressão do mercado editorial, o temor da controvérsia que o descompasso existente na imaginação do público entre a persona poética e o autor empírico poderia causar (o “biografismo” ainda acompanha o leitor) e as expectativas familiares baseadas na reputação e tradição que um nome nobre acarreta são os elementos que a constrangem.

Ruki e o desconforto com o Natal: a solidão da autora de mangá teen’s love.

Mas, apesar de viver de (e nas) aparências, Tsubasa está realizando o seu sonho. Talvez a identidade que precisa ocultar seja um mal menor se comparado as experiências acumuladas e o quanto já avançou em relação ao seu projeto de vida.

Não só Tsu-chan está em foco no episódio 10. São as festividades de fim de ano, e no Natal, Ruki sente a solidão bater forte. E a crise deve-se ao fato dela ser uma artista de mangá “teen’s love”, com cenas eróticas, e, ainda que seja convincente nas histórias que cria, não ter ela mesma experimentado o amor a deixa deprimida, e, para piorar, é uma das épocas do ano em que o amor é mais exaltado, e casais estão em primeiro plano (como iscas para o consumo).

Fuuru-senpai consolando Ruki: duas almas solitárias que quase se entenderam.

Todas tentam animá-la, mas cada ação para aliviar Ruki da dor de um “coração solitário” resulta em fracasso. Nem as cartas das fãs auxiliam, já que na imaginação delas, Himeko-sensei deve viver um romance maravilhoso. A jovem busca amparo/consolo em Fuura-senpai, que, como autora de mangá de terror, compreende o sentimento de isolamento, a sensação de ser sentir solitária que atinge Ruki no período natalino. Porém, a identificação encontra seu limite na morbidez de Suzu, já que a garota é dark, e se alimenta do que há de obscuro no ser humano, enquanto Ruki é romântica e a sua infelicidade não chega ao ponto de desejar que o êxito dos bem-aventurados seja devastado por uma maldição. Fuura-senpai, melhor personagem.

É então que Ruki ganha uma festa surpresa, o seu aniversário é na véspera de Natal. Ela sente que é amada. E o componente inusitado que fará o sorriso e a vontade de trabalhar em seu manuscrito voltarem é o presente de Kaos-chan. O cosplay de um dos seus personagens favoritos, como uma “mamãe Noel” com rabo de gata. Sexy e com o ego alimentado pelos elogios de Kaos, Ruki retoma a sua motivação e os dias difíceis são superados. Apesar do drama de Kaos, que considera que errou no presente, pode-se dizer que em seu gesto, há a sombra das segundas intenções. O presente para Ruki é um presente para a própria Kaos. Um desejo de natal realizado.

No Ano Novo, todas partem para casa, são as férias de inverno, e Kaos, distraída como sempre, não avisa a família. Com a mãe em viagem, sobra para Tsubasa acolher Kaos. Como já tratado aqui, Tsu-chan é de família abastada, que valoriza sobremaneira o seu nome na sociedade. Desde a transformação de Tsubasa no aeroporto na filha delicada e refinada que os pais esperam que ela seja, Kaos está atordoada com a situação e suas reações – além de sua inadequação à mansão chique – dão o tom cômico a essa passagem, que nos apresenta mais da fragilidade de Tsubasa. Diante de uma Tsu-chan aflita (que perdeu os hábitos de menina rica – até alguns femininos – no período em que está no dormitório) e de uma Kaos desajeitada, abusando de seu desajuste social (o que significa a ansiedade no ápice para ambas), surge Ruki para salvar a pátria. A jovem, com seu jeito gracioso e inteligência notável, convence a família Katsuki que sua preciosa herdeira é uma aluna dedicada e exemplar em uma escola que testa em exames de alto grau de dificuldade as habilidades de seus alunos.

Tsubasa e Kaos em um jantar sob pressão. Tsu-chan não tem o apoio da família em seu sonho de se tornar mangaká.

Há ainda a adaptação, ou regressão, de Tsubasa ao refinamento de uma residência da alta sociedade, esquecendo-se da talentosa mangaká shounen que ela é. Tsu-chan apenas desperta quando Kaos ameaça enviar fotos “comprometedoras” de sua versão fofa a Koyume. Tsubasa se importa com a imagem que Koyume tem dela (na verdade, a autora shoujo iria delirar com as fotografias), acrescentando mais um elemento ao subtexto yuri.

Na terceira parte, Kaos, Ruki, Tsubasa e Koyume se reúnem para voltar ao dormitório, e juntas, elas vão ao templo fazer os pedidos de Ano Novo. Kaos preocupando-se em agradecer o ano que passou (ela realmente está feliz), deixa escapar a oportunidade de apresentar seus desejos aos deuses, além disso, na hora de tirar a sorte, vem um “grande azar” para ela. Kaos sendo Kaos.

Ano Novo, e Kaos já na batalha contra a má sorte.

De volta ao dormitório, elas encontram a zeladora Ririka assando batatas. É uma espécie de ritual para a queima dos esboços e rascunhos descartados que se acumulam nos quartos. Kaos fica com pena de ver indo para o fogo as páginas que as amigas colocarem todo o seu esforço e talento. Então, ela decide “sacrificar” os manuscritos rejeitados pela sua editora, Mayu Amisawa. E Kaos tem tanto. O gesto chega a ser simbólico, livrar-se do peso do passado para abrir espaço para novas esperanças e mais trabalho. E nesse rito, Fuuru-senpai rouba a cena, dando voz as personagens das páginas que estão sendo queimadas.

O ritual da queima dos esboços e rascunhos rejeitados. “Combustível” para assar batatas.

Este episódio avança mais na personalidade de Tsubasa e mostra Kaos lidando com sua inadequação, porém não possui os elementos dramáticos de alguns dos episódios anteriores, sendo mais leve e bem-humorado, apostando nas reações das mangakás as necessidades da amiga. A dinâmica entre as garotas permanece como um dos seus principais pontos fortes. E Fuuru-senpai brilha em suas pequenas aparições.

Agora, é aguardar os dois últimos episódios. Com o dormitório prestes a fechar e Kaos engajada na luta pela tão almejada serialização.

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