Bom dia!

Bem-vindo ao Café com Anime, um bate-papo que eu e Gato de Ulthar (Dissidência Pop), Vinicius (Finisgeekis) e Diego (É Só Um Desenho) temos todas as semanas sobre alguns animes da temporada. Cada um publica em seu blog as transcrições das conversas sobre um anime diferente.

No Dissidência Pop vamos acompanhar Hanebado!. No É Só Um Desenho vamos acompanhar Shoujo Kageki Revue Starlight. No Finisgeekis vamos acompanhar Happy Sugar Life. E aqui no Anime21 vamos conversar sobre Banana Fish.

Nessa edição do Café com Anime, leia a nossa conversa sobre o episódio 5.

Fábio "Mexicano":
Após a publicação do Café anterior, travei uma discussão feroz (no bom sentido) com um comentarista que já leu o mangá e me garantia que o Ash, ao contrário do que falamos aqui, não está buscando vingança. Eu não mudei a minha opinião, que era baseada na impressão que tive nos quatro episódios iniciais, mas prometi ficar mais atento a isso.

Mais atento fiquei. E acho que nesse episódio, mais do que em qualquer outro, Ash queria matar o Dino por vingança, acima de qualquer outra coisa. Ele estava em liberdade condicional, tinha policiais “do bem” escoltando ele, o próprio Dino não pretendia fazer nada pelo menos por enquanto, então o protagonista não tinha nenhuma boa razão para querer se arriscar como se arriscou para matá-lo que não a vingança pela morte do irmão (e do Skipper, e pelo resto de sua vida miserável, não necessariamente nessa ordem de importância).

Claro que isso não prova nada. Primeiro, eu posso ter interpretado errado, posso ter deixado algo escapar. Segundo, talvez a vingança de verdade só tenha começado agora. Enfim, por todos os meios, não estou pedindo para me dizerem que estou certo, não estou procurando reafirmação no grupo. Quero saber a opinião mais sincera de vocês sobre o assunto.

Teve mais coisas importantes nesse episódio e falaremos delas depois, prometo.

Gato de Ulthar:
Sem dúvidas Ash estava muito furioso com tudo que aconteceu nos últimos tempos. Se não fosse isso, qual o motivo de fugir da escolta para já em seguida se aliar temporariamente a um mafioso chinês e preparar um ataque ao Papa Dino no seu covil de sodomia para a elite pervertida? Talvez, depois que o ódio dele se acalmar, ele pense melhor antes de tentar se vingar desesperadamente do Papa Dino, mas por enquanto, Ash não possui outra solução em mente se não para o Papa Dino de uma vez por todas.
Vinícius Marino:
Se Banana Fish não é uma história de vingança, eu gostaria que você, leitor que pensa o contrário, me explicasse isso:

Sério, existe outro jeito de interpretar isso? A palavra “vingança” – que o próprio anime usa! – mudou de sentido enquanto eu não estava olhando? Ash estava de pé sobre um caminhão, atirando contra o Papa Dino, porque queria fazer alguma outra coisa? Pergunta sincera, eu realmente quero saber.

Fábio "Mexicano":
Eu queria ter talvez visto outra coisa nessa episódio, mas né 😂

Para ser justo, ele disse isso até o episódio anterior. Eu interpretei tudo como, primariamente (claro que o Ash tem outras preocupações também), vingança. Talvez estejamos em um “arco vingativo” dentro de uma história maior que não seja só sobre isso?

Vinícius Marino:
Pode ser, mas isso não é problema nosso. E aqui vou aproveitar a deixa para falar algo sobre nossa “missão” aqui no Café.

Esse quadro é uma discussão episódica sobre animes da temporada. Nós discutimos animes. Não mangás. Não games. Não universos expandidos. Nós falamos da perspectiva de quem não necessariamente conhece o material de origem e está conhecendo essas obras a partir das animações.

O que acontece ou deixa de acontecer no material original nos interessa apenas como curiosidade, ou (no máximo) para contextualizar nossas dúvidas.

E aqui ao acrescento um juízo meu, que pode não ser o do resto dos rapazes: eu acho que originais não importam. Eu acho que um anime (tal como um filme, ou um seriado, ou um livro) deve se sustentar nas próprias pernas. Se ele é fiel ou não ao material que o inspirou, se ele tomou liberdades ou omitiu arcos realmente não me interessa. O original é o original, e ele sempre estará lá. A adaptação é sua própria realidade. Se ela funciona, se ela é legal, se ela passa uma mensagem própria eu já me dou por satisfeito.

Mais: não dou a terceiros o direito de me proibir de gostar dele (ou de tecer minhas próprias interpretações) porque o “original é diferente”.

Fábio "Mexicano":
(Subscrevo esse juízo)
Vinícius Marino:
Aliás, se você acha que adaptação é simplesmente uma repetição de uma história existente, você tem uma visão lamentavelmente restrita do que significa “adaptar”. Ninguém “repete” uma obra. Toda adaptação é uma criação própria, e os grandes adaptadores são aqueles que não tem medo de limitar sua criatividade.
Fábio "Mexicano":
Banana Fish já começou adaptando para o presente, não é? Ainda que mantendo características da Nova Iorque dos anos 1980.
Vinícius Marino:
Exatamente. E falando em presentes, está vendo esse poster? É de uma adaptação de um livro de 1902. Sabe por que tem helicópteros no filme, muito embora eles não existissem na época do “original”? Porque o diretor decidir criar, e não só repetir. E o resultado foi uma das maiores obras-primas da história do cinema.
Gato de Ulthar:
Apocalipse Now está rendendo! Já virou referência em Hanebado! também. 😛 E concordo plenamente com o Vinicius. Quem resmunga pelos cantos e reclama de adaptações que não são fieis perde muito do entretenimento que um anime ou filme pode gerar. É tão mais interessante quando alguma adaptação inova em relação a fonte original, isto torna emocionante e imprevisível apreciar a obra em cada mídia diferente. Cito outro exemplo, Battle Royale, mesmo que o centro da história seja o mesmo em todas as mídias, o mangá é uma coisa, o livro é outra e o filme uma coisa totalmente distinta.
Fábio "Mexicano":
Hanebado! é outro anime que está adaptando com liberdade o material original, pelo que fiquei sabendo.
Gato de Ulthar:
Parece que sim, o anime de Hanebado! teria adotado um tom mais sério do que o mangá.

Vide Ghost in the Shell. O mangá e o filme (o clássico de animação), são coisas completamente distintas, tirando a temática e um ou outro elemento. A personalidade da protagonista é muito diferente, enquanto no mangá a Major é brincalhona e sedutora, no filme ele fica com cara de cu toda a película.

Fábio "Mexicano":
E isso contando, em linhas gerais, a mesmíssima história!
Gato de Ulthar:
A mesma história contada de um jeito diferente, e isso é prazeroso.
Diego:
“A mesmíssima história” naquelas, o filme pega um arco do mangá e adapta só ele, deixando de fora um calhamaço de coisa 😛

Mas bem, chegando um pouco atrasado para a conversa, eu vou ser o chato que vai dizer que não concorda totalmente com essa noção de que cada obra deve se sustentar em si mesma. Numa época de universos expandidos, franquias multimídia, spin offs relevantes e toda sorte de coisas semelhantes, algumas vezes surgem histórias nas quais diferentes histórias menores – livros, filmes, séries, etc – se complementam e convergem em direção a uma narrativa muito maior que seria impossível se cada entrada precisasse se sustentar plenamente em si mesma.

Agora, é meio óbvio que este não é o caso de Banana Fish, que se propõe a ser uma adaptação modernizada de uma história já fechada. E nisso ela obviamente se abre para toda sorte de mudanças. Mas eu vou dizer o seguinte: enquanto a partir daqui esta certamente se revela uma história de pura e simples vingança, eu não sei até que ponto tudo isso começou com o Ash querendo vingança, exatamente, ou talvez apenas poder – tirar o Dino da jogada muito mais porque assim não responderia a ninguém do que somente pelo rancor que ele claravemente guarda do velho.

Vinícius Marino:
Eu acho que isso vale mesmo para multiversos multimídia. Se você parar para pensar, as obras do tipo que sobrevivem são justamente aquelas que se sustentam nos próprios méritos. Beautiful Dreamer tecnicamente é um de tantos longas de Urusei Yatsura. Mas também é um filme autoral de Mamoru Oshii, muitas vezes discutido (e exibido) como uma obra auto-contida dentro de sua trajetória. Mas enfim, estamos discutindo Banana Fish. E aí preciso concordar: isso não se aplica a ele. Voltando ao ponto, eu não vejo uma contradição entre o exercício da vingança e a ascensão de poder do Ash no mundo do crime. Esta é, afinal, a estrutura que histórias de gangues geralmente tomam.

O mundo do crime é uma sociedade de honra. Os líderes de gangue tem uma espécie de capital simbólico que “ganham” ou “perdem” dependendo de suas ações. Um criminoso que não retalie após uma ofensa pessoal pode ser visto como fraco e deposto (ou morto) pelos subordinados. Não se trata de “justiça”. É outro tipo de vingança. O sintoma de um submundo que funciona no “cão come cão”. E que, de rixa em rixa, inspira o pior nos seres humanos.

Fábio "Mexicano":
E se o Ash queria se vingar mas ao mesmo tempo queria obedecer as regras do mundo que habitava, está justificado porque nunca antes tentou simplesmente matar o Papa Dino. Ele não tinha motivo nem poder para isso. Se tornaria imediatamente um pária, provavelmente perderia o poder da própria gangue, mesmo que não tivesse o Arthur o antagonizando. Na pior das hipóteses, a Máfia Golzine entraria em guerra retaliatória contra a gangue do Ash, e sacar seu líder seria a forma óbvia de conter os danos.

Mas bem, acho que já está bem de vingança, não é? Eu só queria saber mesmo se só eu estou vendo assim, mas parece que não. O Vinicius deu uma boa explicação de o que exatamente nós fazemos, então não vou repetir, mas é bem simples, de verdade: estamos falando do que estamos vendo. É adaptado? Ok, isso é uma curiosidade, vamos comentar quando for relevante para o que acabamos de ver, mas no fundo no fundo não importa. Estamos discutindo sobre os animes que estamos vendo e é isso. Podemos tecer comparações, se e quando for o caso, como fizemos em Banana Fish mesmo, a respeito da atualização cronológica que a história sofreu, mas é isso.

Passando para outro ponto: vocês entenderam qual é o negócio do Papa Dino? Ok, ele tem um prostíbulo de crianças sequestradas e as mantém lá drogadas. E elas morrem. Elas morrem por, digamos, “excesso de uso”, ou a máfia descarta elas? Eu acho que o anime não deu informação suficiente para entender, mas talvez eu é que não tenha entendido direito. Ou talvez nem seja algo que precise ser explicado em detalhes por ser algo que acontece de verdade (ou acontecia, na década de 1980), portando o autor (ou autora, não sei) está contando com o conhecimento do expectador para completar a informação. E parece que é aí que o banana fish vai entrar? Ele vai usar essa droga com as crianças? Mas ele vai mesmo? Ela é necessária? Me parece que ele já tem essa parte resolvida com sei lá quais drogas ele vem usando. Enfim, teçam suas opiniões, por favor ☺

Diego:
Sobre as crianças, eu entendi que elas morriam “de uso” mesmo – talvez pelo tanto de drogas que tomavam. Mas não descarto a possibilidade de algumas serem “postas de lado” depois de cumprirem seu papel. É, pena que o Ash errou o tiro…

Agora, sobre a droga Banana Fish, eu duvido muito que o Papa Dino a queira para o seu bordel ilegal. Com toda certeza esse clubinho não é o único dos negócios do Dino, e apostaria que a droga será usada para algo bem maior. Até porque, o Dino disse que a droga poderia mudar o mundo, não?

Vinícius Marino:
Se meu conhecimento de Law & Order SVU não falha, prostitutas (e prostitutos) vítimas de tráfico humano geralmente vivem pouco mesmo. Sobretudo para clubes como o do Papa Dino, que parecem feitos para atender a demandas explicitamente ilegais. Ou seja: não é como se ele pudesse disfarçar os garotos de “escortes” legais. Tudo lá é contra a lei, o que significa que a accountability é zero. Os clientes devem poder exercitar seus desejos mais depravados. Em suma: é um bordel para as personagens de Happy Sugar Life.

E não, não acho que o negócio dele seja só isso. No mínimo, precisa de alguns negócios mais ou menos legítimos para lavar dinheiro. E eu não excluiria agiotagem, proteção e tráfico de drogas, se nada mais para “controlar território” e roubar espaço de outras gangues.

Gato de Ulthar:
Crianças nestas condições raramente vivem muito, e isto se dá por uma série de motivos. Como os clientes são depravados, não raro são espancadas, também há o risco de doenças sexualmente transmissíveis. O vício em drogas é uma realidade, já que forçar o vício é um dos principais meios de dominação. Isso sem falar em sérios problemas psicológicos que podem levar ao suicídio. Assim, não é difícil descobrir que estas crianças estão fadadas a ter uma vida curta e ruim. O diferencial do Ash foi mesmo ele ter sido o escolhido do Papa Dino, tendo um cuidado mais elevado em comparação aos garotos do prostíbulo.
Fábio "Mexicano":
Certo, acho que faz sentido. Dadas as condições em que essas crianças são prostituídas, é apenas questão de tempo (pouco tempo) até que morram mesmo. Não descartemos que algumas sobrevivam e sejam utilizadas como mão de obra em serviços ainda mais perigosos. São pessoas que perderam completamente a agência sobre suas vidas afinal. O caso do Ash é, de fato, único: Papa Dino botou os olhos nele, mas não só isso: embora ele tenha sim sido sujeitado a humilhações e estupros, sua integridade física foi preservada. Não parece ser o caso dele ter “sobrevivido”, mas sim de ter sido permitido viver. Alguém arrisca um palpite sobre a razão de ter sido assim? Ou acha que estou errado em minha suposição?
Vinícius Marino:
Talvez ele tenha se mostrado útil para outras coisas? Ele é violento, sabe lutar, tem ambição. Dá um bom capanga, até mesmo um bom “capo”. E capos são mais difíceis de arranjar que prostitutos. Talvez, concomitantemente, o Papa Dino tenha gostado dele, num sentido amoroso mesmo. Ser o concubino favorito do chefão sem dúvida é um posto que traz privilégios. Uma gaiola dourada, sim, mas não sem suas benesses.
Diego:
A questão é: o Ash chegou a ser prostituído, ou ele ficou como exclusivo do Papa Dino? Sabemos que pelo visto aquele segurança do Dino chegou a abusar do Ash, mas o próprio Ash não parece ter sido entupido de drogas como ele menciona que as crianças do prostíbulo o são. Então acho bem possível que o Ash tenha ido direto das ruas para os braços do Dino – metafórica e literalmente (ai que horror…). E nisso pode muito bem ser como o Vinicius apontou, o Dino o pegou por sentir alguma afeição especial por ele: uma torpe e que nesse ponto parece já ter diminuído ao ponto do Ash ser plenamente descartável, mas que pode ainda ter existido.
Gato de Ulthar:
O Papa Dino deve ter gostado do Ash, até mesmo se apaixonado, o velho é um pervertido, então não duvido que tenha se apaixonado por um menino. E como o Ash foi criado no meio do crime, desde logo aprendeu a manipular armas, conviver com criminosos, conhecer todo tipo de mau elemento, etc.
Fábio "Mexicano":
Tudo o que podemos fazer é especular a essa altura, né? E não temos quase nenhuma informação a respeito do passado do Ash além de saber que ele foi raptado, foi explorado, e de alguma forma não teve o mesmo destino que as demais crianças que a Máfia Golzine sequestra, tendo se tornado um favorito pessoal do Papa Dino. Os detalhes (tanto os sórdidos quanto os não sórdidos) e as razões para tudo isso não temos a menor ideia.

E vamos terminar por aqui. Discutimos mais sobre a natureza do anime (se é ou não uma história de vingança) do que especificamente sobre esse episódio, mas bem, foi ação quase do começo ao fim, não é exatamente um daqueles episódios que dá muito o que refletir de todo modo. O que for importante irá permanecer nos próximos episódios e aí teremos uma nova chance de discutir sobre o que deixamos de lado hoje. Até lá ☺

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