Somali to Mori no Kamisama – ep 6 – E é por isso que eu não sou roteirista
Bom dia!
No artigo sobre o episódio anterior eu elaborei uma hipótese de resolução para a crise da tentativa de assassinato da Somali e para o que seria da história dali por diante.
Era verossímil, levava em conta o desenvolvimento dos personagens até então e dava um rumo para a história que a faria enfrentar seus maiores conflitos.
Era também uma grande colagem de clichês.
Ainda bem que não sou eu a escrever a história de Somali to Mori no Kamisama.
Para deixar bem claro: clichês não são ruins. Todas as histórias são construídas com uma série de clichês. A coisa sobre a minha fanfic improvisada é que ela era só clichê, e eu escolhi a dedo apenas aqueles dolorosamente mais óbvios que pude imaginar.
Uma história escrita naqueles termos ainda assim poderia ser boa, ainda mais uma que é sobre seus personagens, como Somali to Mori no Kamisama, e não sobre uma sequência de eventos. Mas justamente por ser uma história sobre seus personagens faltava algo crucial: espaço para eles.
Em particular, faltava espaço para os personagens secundários – no caso, Uzoi e Haitora. Eu não sabia nada sobre o passado deles e estava contente assim, bem como atribuía toda a agência na história aos protagonistas: Somali e o Golem.
De novo, ainda bem que não sou eu a escrever esse anime!
Apesar de toda a determinação que demonstrou no episódio anterior, na hora H a Uzoi não conseguiu matar Somali. Isso já havia sido indicado no episódio anterior, mas eu nem cogitei. Não percebi mesmo.
Quando Uzoi começa a contar para Somali que irá matá-la e porque irá matá-la, o que ela está fazendo é menos revelar para sua vítima seu destino infortunado e mais tentar justificar-se para si mesma. A determinação de Uzoi vacilava tanto naquele momento que sequer conseguiu segurar Somali com a força necessária, e a menina escapou.
Teve em seguida a chance de não precisar sujar as próprias mãos. Poderia ter deixado Somali morrer afogada sozinha, mas nem isso ela conseguiu. No fundo, Uzoi era mesmo uma boa pessoa.
Não vou afirmar que isso não seja também um clichê, mas é um mais adequado, não é? Transfere a agência para a Uzoi. Se Somali e o Golem irão viajar e conhecer diversas pessoas diferentes, tão melhor será a história quanto mais bem desenvolvidas e caracterizadas forem essas pessoas.
E ao mostrar Uzoi tendo que aceitar que Haitora, seu pai adotivo, está mesmo morrendo, ainda serve como um vislumbre para o futuro e o conflito que os protagonistas terão que enfrentar. Somali ainda não sabe, mas em pouco mais de um ano será ela no lugar de Uzoi, e o Golem no lugar de Haitora. Como ela irá reagir então?
O episódio teria sido excelente se tivesse acabado por aí, mas ainda teria mais: a história de como Haitora e Uzoi passaram a viver juntos. O crime de Haitora e o acerto de contas com Uzoi.
Foi, em si, outra excelente história, mas lado a lado acho que essa segunda prejudicou a primeira. Eu acho que o paralelo das histórias de Uzoi/Haitora e Somali/Golem é tão forte e tão importante que merecia mais atenção, e seu pináculo no episódio foi o final da primeira metade. Ajuntar a outra história logo em seguida, por melhor que ela tenha sido, ofuscou um pouco a conclusão desse paralelo.
Em todo caso, é uma boa história. Vamos a ela.
Haitora é um humano que vivia com sua família humana em uma pequena vila de humanos, até que um dia foram atacados pelo que eles chamam de “grotescos” e todos foram mortos ou escravizados, exceto Haitora e sua família, que se esconderam em uma caverna.
Quando saiu da caverna para explorar, Haitora encontrou uma harpia: a mãe de Uzoi. Por medo e ódio dos grotescos e porque sua família estava morrendo de fome decidiu matá-la e arrastou-a para dentro da caverna, onde comeram sua carne.
Essa é a origem da doença de Haitora. Sua esposa e sua filha pequena morreram imediatamente, conforme foram dolorosamente cobertas por penas. Haitora de alguma forma sobreviveu.
Seu pesar já era maior do que qualquer pessoa poderia sonhar em suportar quando a então pequena Uzoi entrou na caverna procurando por sua mãe.
É claro que ele nunca contou isso para a garota que quase se tornou uma assassina por ele. Sobrecarregado pela culpa, após o alívio pela salvação de Uzoi, que não se tornou uma assassina como ele, Haitora desabafa e conta tudo para o Golem. Ele achou que Uzoi estava dormindo.
No final, Haitora tenta se sacrificar para salvar Uzoi, achando que isso irá servir de penitência, mas Uzoi, apesar de magoada, já o ama e nada é capaz de mudar isso. Se arriscando, com a ajuda do Golem e de Somali, Uzoi salva Haitora e reclama do egoísmo de sua tentativa de sacrifício.
Sem mais culpas nem assassinatos, os dois estão finalmente em paz.
Eu gostaria de ter visto algum tipo de solução ou encaminhamento para a doença do Haitora, mas isso parece que já é pedir demais – e não é importante para a mensagem que os dois passaram, em todo caso.