Antes de mais nada, gostaria de deixar aqui anexado >>(link)<< o artigo feito pelo Fábio Mexicano sobre o filme de Ghost in the Shell, pois ele já cobriu o anime, e é costume no blog não se fazer dois artigos sobre o mesmo anime.

Entretanto, esse artigo de agora, feito por mim, não versa com a intenção de resenhar o anime de GITS, mas sim desenvolver um debate focado sobre um único aspecto. A existência do GITS 2.0. Uma resenha mais aprofundada e detalhada da obra, que pode oferecer conteúdo para um debate mais amplo, segue junto ao vídeo que deixo abaixo.

A primeira pergunta que me faço, e também espero que vocês façam a si mesmos é: porque sequer existe o GITS 2.0? Vamos conversar um pouco sobre e isso e analisar as diferenças entre as obras.

O primeiro anime, primorosamente idealizado e materializado, em todos os sentidos, foi lançado no ano de 1995, sendo um marco equivalente ao clássico Akira para os amantes da animação mundial. Sou tendencioso para falar de GITS, mas se aquilo não é uma incrível em todos os sentidos, seja na animação, na sonoplastia, na trilha sonora, ambientação e clima, ângulo e roteiro, complexidade ante a simplicidade de plot, não sei o que poderia ser a definição da palavra “incrível”. Acho que perceberam o quanto essa obra é importante para mim, foi ela, junto a outras, como Evangelion, que me lançaram em um caminho sem volta no mundo, e se sou o que sou hoje, em grande parte é devido a GITS.

O segundo GITS, 2.0, foi lançado em 2008, mais de 10 anos após o consolidado e inabalável sucesso de seu irmão gêmeo primogênito. Mas voltando a pergunta, porque?

 

 

Não sou hater, de modo algum, do 2.0, estou apenas me questionando. Innocence, o sucessor de GITS clássico no âmbito audiovisual, é de 2004, ou seja, não havia necessidade de reviver a franquia. Ou será que havia? Arise, o próximo GITS, que apresenta uma outra perspectiva do cenário, é de 2013, anos após o 2.0, que parece, segundo essa cronologia, um pouco deslocado em todos os sentidos.

Sobre o anime em questão, ele tem, salvo engano, apenas três cenas reanimadas realmente, sendo praticamente a mesma coisa que o seu irmão mais velho. As cenas são respectivamente a abertura, completamente transformada em CG, a cena do mergulho da Major e um pouco antes do final do anime, quando a Major e o Mestre dos Fantoches efetivam a sua transcendência.

 

 

No que tange a elementos específicos, como uma melhora nas cenas de apresentação de gráficos, estradas e demais cenas onde se reanima as maquetes simbólicas, pode-se questionar, será que havia necessidade de reviver o filme apenas para “arrumar” esses detalhes?

Quanto a qualidade comparativa de um para o outro, primeiro tenho que estabelecer que, quando temos uma obra, e ela é boa, se sustenta em si mesma, coesa e plena em sua mensagem e imagem, ela ganha um local significativo a partir de sua expressividade. Quando uma obra é copiada, ela é igual a anterior, sua fonte de origem, mas quando uma obra é readaptada, modificada, melhorada, ou de qualquer modo, alterada, a alteração se torna, por natureza, uma obra própria, diversa e apartada da original. O que quero dizer é, qualquer mudança que faça com que um anime base tenha sustentado uma versão 2, e no caso, literalmente uma versão 2.0, isso implica que a primeira e a segunda versão são diversas.

 

 

A pergunta que se faz no caso é, qual a melhor versão? E no caso de GITS, caso GITS clássico não existisse, o GITS 2.0 seria a melhor versão, mas só pela existência, e não apenas isso, pela necessidade de que exista o clássico para que a partir dele o gêmeo possa nascer, implica que o clássico é, em essência, mais necessário que o seu anime posterior. E o mais interessante aqui é, se ele é mais necessário, como não seria melhor do que o posterior?

Não estou falando de continuações, ou mesmo de readaptações que usam o mesmo material fonte, mas sim de uma cópia, que no fim deixa de ser uma cópia. Por exemplo, Hunter x Hunter, ou mesmo Fullmetal, são animes que tem variação e mais de uma versão adaptada, ou mesmo Fruits Baskets, se for para considerar cenários mais contemporâneos. Mas uma coisa é certa, se todas essas obras não tivessem um mangá por base, o qual adaptam, elas não seriam o que são. A questão aqui é, cada versão dessas adaptações é única, e são diversas em muitos sentidos, e qualitativamente podem ser analisadas in loco, ou seja, em si mesmas, para que uma possa ser melhor do que a outra. Se uma adaptação é melhor ou não que o seu material original, seja ele um mangá, ou o que for, é uma outra questão complexa.

 

 

Como uma coisa que é dependente de sua fonte pode ter mais qualidade do que ela? A resposta é simples, caso ela não seja mais dependente da fonte, e não esteja mais adaptando, mas sim criando em si algo novo, renascendo, assim ela pode ser comparada como uma filha, e não como uma transposição de mídia.

No caso de GITS, temos uma situação anômala, completamente diversa e em si mesma curiosa. GITS 2.0 é uma cópia que não é uma cópia. O anime 2.0, é praticamente o mesmo que o clássico, mesmo que tenha cenas reanimadas, todas as falas, e pelo menos 95% da animação, é idêntica. Algumas alterações são efetuadas nos filtros, na intensidade das cores, das sombras e luminosidade, deixando 2.0 mais opaco, a sonoplastia também é revista e algumas cenas perdem um pouco a intensidade caso comparadas com o seu original, e como cereja do bolo, escolhas deliberadas em mudar não apenas o estilo de animação para CGI, como modificar o conteúdo final do que foi apresentado, encaminham o anime para outra gama de interpretações. Tudo isso leva 2.0 a ser um anime completamente diferente do original, mesmo que seja o mesmo anime, e praticamente a mesma coisa.

 

 

Se um não existisse, consideraria o outro incrível, mas como ambos existem, e como 2.0 precisa intrinsecamente de seu antecessor, é impossível para ele ser melhor do que a sua fonte original. E sim, cada um tem, ao se comparar um com o outro nas cenas reanimadas, uma personalidade e estilo. Se me perguntarem se prefiro a animação do de 1995 ou do de 2008, diria que depende. As cenas de repaginação dos gráficos e tabelas, de tudo aquilo que se apresenta na parte subjacente a animação, ficou muito bonito, mas em paralelo, as cenas reanimadas da abertura do mergulho da Major, para mim ficaram descaracterizadas e completamente fora da realidade da consistência interna da obra, ou seja, para mim, o de 1995 é muito mais coeso e fluido em sua apresentação e identidade, mesmo que tenha cenas mais rudimentares. Se o que foi feito em CGI é melhor ou pior do que a animação clássica, só posso dar uma opinião pessoal, sim, é pior, comparado com o original, é quase uma blasfêmia, mas não é ruim, de modo algum, mesmo que fique descaracterizado dentre os demais momentos da animação.

Uma cena, entretanto, muda completamente o significado da mesma, a cena onde o anjo aparece para Major. No clássico a presença da divindade representando a transcendência, a morte e o renascimento, é nítido, claro, impactante, no 2.0, essa cena fica difusa, confusa, enigmática e desnecessariamente não explicita. Para mim, essa escolha enfraquece a simbologia, uma cena onde a mensagem da animação direciona a linguagem e a interpretação para um horizonte muito diverso e menos potente do que a do anime clássico.

 

 

Mas, novamente, não estou dizendo que isso implica em perda de qualidade, mas sim em uma escolha que obriga ainda mais o 2.0 a ser um anime paralelo, mesmo que ele nunca possa ser um anime paralelo ou que se sustente por si mesmo, uma vez que sua própria existência é um efeito colateral de seu predecessor, ou seja, é um anime contraditório que reergue a franquia, que não perde, em geral, a qualidade ou expressividade do original, mas que também nunca se equipara, nunca se liberta e nunca se livra de ser um apêndice descartável frente a dependência e repetição que efetiva. É ao mesmo tempo um outro filme e filme algum.

O porque GITS 2.0 nasceu, eu não sei, e não vem ao caso, mas já que ele está aqui, entre nós, que seja exemplo de como qualquer modificação que não seja uma cópia, faz com que uma obra seja completamente diferente e completamente igual àquela da qual ela se origina. Por fim e no fim, eu amo GITS, e não existe readaptação no mundo que possa mudar isso.

 

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