Os fogos de artifício foram usados para simbolizar a conexão dos Eighty-Six com os Albas que os massacram, e é ainda pior que isso tenha ocorrido em meio a um Festival da Revolução que em si não significa mais nada, afinal, se uma revolução aconteceu e a sociedade acabou desse jeito, quem pode dizer que ela realmente valeu a pena? Em um episódio de cortar o coração, vamos tentar entender as cabeças de nossos heróis.

Se até gente decente como a Lena apela para o suborno, quem somos nós para não dar nosso “jeitinho brasileiro” de vez em quando, né? Foi bem legal da parte da Lena mandar os fogos para o pessoal do esquadrão, mas um pouco triste se pensarmos que eles mantêm a tradição de uma nação que deu as costas para eles, e pior, trata mesmo mestiços como simples objetos a serem descartados por conveniência.

Mas não vou entrar no mérito da questão ainda, prefiro elogiar o belo trecho em que a Lena vai se apercebendo das diferenças discrepantes entre aqueles que comemoram o festival dentro das muralhas e aqueles que de fora dão as suas vidas para protegê-las. As mentiras que os Albas contam para inglês ver criaram um cenário de desigualdade tão cruel que envergonham mesmo quem discorda completamente dele.

Por isso a boa vontade da Lena em mandar os fogos acaba me cativando, pois apesar de ser um gesto singelo e pequeno, é o máximo que ela é capaz de fazer da posição em que se encontra. De outra forma, se a guerra não bater nos escudos de carne do outro lado, uma nação seria destruída, levando consigo as vozes daqueles que se opuseram e ainda devem se opor, mesmo que tenham se perdido em meio a multidão.

Aliás, essa talvez seja a minha única queixa com 86, pois mesmo que essa possa ser considerada uma questão de ponto de vista (acompanhamos o território dos Albas pelos olhos de uma militar que não liga para quase mais nada além do serviço), ainda assim sinto falta de vozes contrárias que não só a da Lena. Sei que passaram-se anos do início da guerra e da segregação dos 86, mas é difícil crer que ninguém se indigne mais.

Espero que isso seja explorado na sequência do anime. Para essa primeira o que temos é a mais triste e pura desgraça, apesar de ser fofo ver a proximidade que o Shin e a Lena estão tendo. O herói acaba sendo bem proativo em contatá-la após os dois se desencontrarem e isso rende uma das cenas mais belas e tristes do anime até então, apesar de eu ter achado que visualmente ela poderia ter sido até melhor.

Talvez isso se deva a light novel, que não é um primor de detalhamento nas descrições e entrega apenas uma bela, mas simples, ilustração desse momento. Voltando a cena, a conversa dos dois é muito bacana porque não fica nas amenidades, pelo contrário, toca em tópicos sensíveis, os quais a Lena trata com sinceridade, ainda que a gente saiba do vazio de suas promessas, pelo menos quanto aquilo além do seu alcance.

Ela não pode garantir que ninguém mais morrerá, não poderia mesmo que as promessas de seu “tio” fossem verdade. Mas ela com certeza não fala por mal, é o desejo de seu coração. No máximo, ela pode cumprir o que só compete a ela, que é nunca se esquecer dos rostos, das vozes, dos nomes, das histórias daqueles com os quais lutou junto, ainda que não lado a lado. E só poder fazer isso é o mais triste de tudo.

Mas isso para a Lena, comparando com a Anju e a Kurena vemos que há dores ainda mais profundas que uma moça pode sentir nessa época, afinal, enquanto as duas tomam banho e trocam confidências sobre seus amores, vemos o quanto são azaradas já que a Anju não tem mais a pessoa que gostava ao seu lado, enquanto a Kurena se preocupa com o Shin (até sinto um ciuminho nela), mas não pode fazer muito por ele.

Naquele que perdeu a Anju encontrava apoio e se saber da morte certa de todos eles vá curando as feridas de antemão, chorar enquanto soltava fogos foi o sinal de que ela era capaz de seguir em frente. A Kurena se preocupa com quem vai estender a mão aquele que estende a mão a todos sabendo que é bem provável que ela não consiga fazê-lo, que ela deve se tornar uma das pessoas as quais o Shin trará redenção.

Suas histórias são tristes, seus amores impossíveis, suas dores suportáveis apenas pelo vislumbre de um fim que pode vir a qualquer momento. A Lena não, ela pode ficar despedaçada após perdê-los, mas não perderá a vida e, de toda forma, nunca passou pelos sofrimentos deles em primeira mão. Não que perder o pai no campo de batalha não tenha sido doloroso, mas a gente sabe que não há margem de comparação.

Apesar dos trechos de tons bem agridoces, nada como subir o tom e o que vemos no ataque feroz que a Legion imprime contra o Spearhead é justamente isso, um choque de realidade ainda mais potente, capaz de não só fazer o esquadrão bater em retirada, como tornar praticamente impossível não revelar a verdade por trás da conversa fiada dos Albas, uma bola que já estava quicando na área, implorando para ser chutada.

Como os Albas não sabem que a guerra não vai acabar em dois anos, tudo que os Eighty-Six contam a Lena faz ainda mais sentido se você pensar em como retomar relações com quem você segregou deve ser difícil. Aliás, não só isso, tratar as vidas perdidas como nulas dá o tom do interesse dos Albas em repatriar esses Eighty-Six. O alistamento compulsório de 5 anos deve ser só uma fachada perante órgãos internacionais.

No fim, a guerra ter data para acabar permite que os Albas manejem esse contingente de minorias étnicas e mestiços para fazer sua eugenia como bem entendem, fazendo cair por terra qualquer esperança infantil que a Lena tinha de que um dia poderia encontrá-los do seu lado. Ela já sabia que a guerra não acabaria tão cedo, mas não que seus comandados estavam em um beco sem saída com um prazo de validade tênue.

Isso torna a trama toda ainda mais pesada do que já era e se episódio passado pensávamos em como a Lena e o Shin poderiam formar um belo par, nesse meu estômago revira só de imaginar mais deles morrendo e aceitando esse destino satisfeitos. O pior é que não consigo ver furos em seus argumentos, já que se tentassem se rebelar contra os Albas estariam envolvendo pessoas boas ou crianças pequenas demais para entender.

Sei que a questão é bem mais complexa, mas vendo os relatos de vários deles e a solidez moral que ainda conseguem manter mesmo depois de tudo que passaram, não consigo achar inocente ou estúpida a ideia de seguir nessa batalha fadada ao fim. É o último ato de dignidade dos que vieram e dos que virão, e deles é claro, que ainda terão que enfrentar o “Rei” (imagino que aquele drone seja ele) antes de alcançar a liberdade.

Até a próxima!

P.S.: Não dá para dizer que os Eighty-Six têm um pouquinho de síndrome de Estocolmo por seus algozes, os Albas? Eu acho que sim, então essa música do Muse encaixa perfeitamente como título deste artigo. Eu queria poder…

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