Fena: Pirate Princess (Kaizoku Oujo) é um anime original da Crunchyroll em parceria com o bloco de animes Adut Swin, e como ocorre trocentas vezes com animes originais, a coisa começou bem (com boa animação e direção), teve um momento em que pareceu que poderia engrenar, mas a verdade é que só foi ladeira abaixo, terminando com uma viagem que até séria legal não fosse sua insignificância na trama.

Mas não se assuste com o que eu escrevi, Fena ainda consegue ser um anime divertido na maior parte do tempo, tem uma ótima produção e um casal de protagonistas fofinho, do tipo que teria agradado mais não fosse o final que prejudicou até o romance. É, Fena só não me traumatizou mais por eu sempre ter um pé atrás com animes originais, ainda mais com propostas “diferentes” que, pensando bem, nem são tão diferentes.

Sim, a Fena é realmente uma princesa, isso é revelado mais a frente no anime, mas não, ela não é uma pirata, no máximo pega emprestado o vestuário, mas não é bem pirataria o que ela e seus companheiros de aventura praticam. Fena é uma guia de viagem, da própria viagem, a qual ela vai descobrindo o caminho viajando, sendo protegida por mercenários que estão mais para ninjas que piratas, convenhamos.

E em meio a esse passado misterioso dela tem o Yukimaru, o amigo de infância e interesse amoroso que cresce na conta do público de acordo com como a trama vai se desenvolvendo e a conexão entre os dois vai sendo retomada. Ele é o tipo de mocinho que tem um jeito mais fechado, é calado, introspectivo; o tipo de perfil que encaixa com uma heroína expressiva, mas tímida; encaixa para cozinhar o romance em banho maria.

Não, Fena não é um anime sobre o romance, romance esse que em nenhum momento foi além de palavras que davam a entender o óbvio. Aliás, a reta final também se encarrega de melar com isso, afinal, o beijo foi escondido, a declaração não foi olho no olho e em nenhum momento a tensão romântica ganhou uma forma. Sei que não era o objetivo, mas conter esse fanservice serve a que? É para desagradar de propósito?

Pelo menos o grupo de mulheres piratas não foi sacado da trama para ser usado em momento conveniente, mas ao mesmo tempo a forma como as personagens saem de cena não fez sentido algum. Diria que isso foi pior porque elas até reaparecem (algumas delas) no fim, mas sem ter utilidade prática alguma. Além disso, e o vilão, hein? Abel não foi morto pelo Cain, e sim pelo Yukimaru, mas não deveria nem ter nascido.

O vilão comete várias atrocidades para no final a justificativa recair em um coração partido que em nenhum momento ele tentou consertar, ou melhor, que ele não fez nada para isso, mesmo que fosse óbvio a impossibilidade de concretizar a relação. Ter se mantido em um pragmatismo odioso tornou o personagem impossível de engolir para mim de tão ridículo que é o amor obsessivo que ele nutre pela mãe da heroína.

Mas sim, nem tudo é uma desgraça em Fena, diria até que é justamente ao contrário, pois até mais ou menos a metade a trama corria bem, sem maiores percalços, ela começou a decair justamente quando o vilão foi ganhando mais espaço, descobrimos seu passado e ficou cada vez mais claro que o mistério ao redor da Fena não era apenas conveniência e firula do roteiro, mas misticismo puro, brutal e sem graça.

É como comento no artigo derradeiro do anime, Fena pecou demais ao não construir seu próprio “mito”, ao não dar suporte a quintessência que tenta emplacar nos dois últimos episódios ao revelar não só uma terra cheia dos tesouros da humanidade, como também um tesouro maior, ligado a própria existência da raça humana no planeta. Os dez primeiros episódios dissonam dos dois últimos de maneia quase gritante.

Episódios esses que só não são mais estranhos pelo misticismo que parecia cercar a protagonista e sua jornada desde o começo. Aliás, que menina simpática é a Fena, né? É uma pena que ela só seja jogada de lado a lado, não faça nada além de guiar o caminho até o Éden e no final ainda tenha jogado na sua cara que tudo que ela fez foi por um desejo superior. Isso faz até a personagem perder força narrativamente falando.

Por quê? Porque tudo no anime parece um experimento minuciosamente controlado e isso me fez deixar de ver graça na trama, ainda mais após algumas saídas estúpidas e a passada de pano danada que fazem para o vilão. E ainda inventam da garota perder as memórias, mas na boa, ela perder as memórias de uma jornada controlada é realmente tão dramático assim, ainda mais após o que ela deixa escapar no finalzinho?

A frase da Fena após a declaração do Yukimaru fica ambígua (vai que ela se apaixonou por ele em alguns dias e por isso esperava a declaração do rapaz, né?), dando margem a interpretação de que no fim ela recupera sim as memórias e que, sendo assim, a gravidade do que aconteceu com ela foi nenhuma. Nem que precisasse, afinal, ela perdeu o loiro dos cabelos, o sinal de que tinha sangue azul e era uma sacerdotisa, né.

Toda a história dessa ordem mística que decide os rumos da vida inteligente na terra não é explicada de forma convincente, interessante, realmente parece um plot jogado meio que do nada, acessado para pegar carona em sinais que estavam distribuídos por todo o anime, mas em nenhum momento dão a entender tanto. Além disso, e até pior, não há arcos de personagens elaborados para os coadjuvantes.

Na verdade, mesmo o Yukimaru não é tão aprofundado quanto poderia, tendo no máximo flashbacks (alguns de outras pessoas nele) e um ou outro momento em que dá para sacar o personagem, mas não e como se ele mesmo externasse suas particularidades. Me consola que a relação dele com a Fena é relativamente boa, bem trabalhada, ao menos até o momento em que foi possível, até a reta final degradante.

Por fim, Fena não é um anime de ação pungente ou frenética, a aventura debocha de si mesma e o romance então, esse se sabota em um eterno chove não molha que frustra ainda mais a quem acompanha até o final, o qual, aliás, tenta se embalar em um plástico de profundidade que é tão artificial quanto quanto é raso o anime. Uma produção promissora e equilibrada que perde o brilho do meio para o final e termina esquecível.

Ainda assim, indico Fena: Pirate Princess? Depende, você tem tempo livre de sobra? Não se importa com animes que enrolam demais para terminar na mesmice? Não tem problema com um grande arco narrativo que se concentra mais na heroína, mas deixa o resto um tanto para escanteio? Não passa raiva com romance que não entrega o mínimo? Não liga para passada de pano para vilão mequetrefe? É, o barco afundou.

Até a próxima!

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