Didn’t I Say to Make My Abilities Average in the Next Life?! — Watashi, Nouryoku wa Heikinchi de tte Itta yo ne! —, que traduzindo fica algo como “Eu Não Disse Para Tornar Minhas Habilidades Medianas na Próxima Vida!”; é uma light novel escrita por FUNA e ilustrada por Itsuki Akata.

A obra tem anime marcado para a temporada de outono de 2019 e eu não poderia deixar de escrever minhas primeiras impressões sobre o original, né? Sem mais delongas, vamos falar de uma loli medianamente apelona?!

Nouryoku, vou usar essa abreviação para me referir a obra, é um isekai de reencarnação, um tensei, e conta a história de Adele, uma garota que vive em um mundo meio genérico de fantasia e aos 10 anos recobra as memórias de sua vida passada no mundo em que vivemos. E, claro, ela era japonesa.

Misato morreu aos 18 anos ao salvar a vida de alguém que seria crucial para a sobrevivência da espécie. Sendo assim, a entidade que podemos chamar de Deus a deu uma oportunidade de reencarnar em um mundo no qual existe magia, esta que é na verdade nanotecnologia muito avançada, e realizar um desejo dela: torná-la uma garota comum na próxima vida.

Para quem desde o berço foi considerada um prodígio e sofreu com a solidão por isso, Misato desejava apenas uma vida normal em que pudesse ser mediana.

Contudo, é um isekai contemporâneo, é claro que a protagonista seria apelona e é justamente isso que dá o contraste da obra.

Adele só quer viver uma vida comum, mediana em quase todo aspecto, e não pode justamente porque recobrou as memórias de sua vida passada, o que potencializa o poder da sua imaginação e a confere conhecimento sobre a estrutura desse mundo, que magia = nanotecnologia; dois fatores que dão um baita upgrade em suas capacidades.

Aliás, ela também recobra a inteligência que a isolou na vida passada e é por isso que tenta esconder que é um gênio a todo custo. Você deve ter tido contato com histórias o suficiente para saber que não vai dar certo, né?

Essa é a piada de Nouryoku e é uma piada boa? Eu acho que sim, pelo menos da forma que é executada tem problemas, mas também confere momentos divertidos e que fazem sentido.

Ela falha em desviar os olhares para si em quase todas as oportunidades, mas, pense comigo, uma garota com contato social quase nulo reencarna em um mundo no qual suas circunstâncias familiares, ela se torna indesejada pelo próprio pai, também a isolam, qual seria o resultado disso? Obviamente, a inaptidão para julgar as situações pelas quais passa da melhor forma a cumprir seu objetivo.

Além disso, Adele é uma boa pessoa que morreu justamente por ter se mexido para salvar uma garota de um atropelamento; e era um caminhão, que clássico; então muitos dos riscos de se expor que ela corre são propiciados pelos laços de amizade que ela faz ao sair de casa e experimentar o mundo. Não é o caso dela querer uma coisa e agir totalmente na contramão, mas não ser egoísta para pensar só em si.

Esses traços de personalidade da Adele me fizeram gostar dela de verdade, pois ela tentar manter essa máscara boba de normal, mas falha e, ainda assim, na oportunidade seguinte não se fecha, não troca os laços que fez por uma vida tranquila que não necessariamente seria assim mesmo.

Acho até que em algum ponto da obra ela ser mediana ou não vai ficar de lado justamente porque ela não vai poder mais “fingir”. Adele é alguém que quer ser feliz e acha que ser “normal” é o único caminho para isso, porque não conseguiu ser feliz como queria em sua outra vida por ser diferente.

Contudo, é justamente por ser overpower que ela consegue ajudar os amigos e conquistar outras coisas boas na vida. Darei minha cara a tapa se no final da obra ela não for feliz como deseja mesmo sem ser uma garota mediana.

Mas claro, nem tudo são flores em Nouryoku e se por um lado eu gosto da personalidade da protagonista, por outro não posso escrever o mesmo sobre a escrita de FUNA. Ao menos não em boa parte do tempo.

Não acho que o problema da obra seja a descrição das cenas, apesar de que principalmente nas cenas de ação a falta de uma escrita mais encorpada faz falta, mas a carga enorme de narração em terceira pessoa. Existem poucos diálogos, a maior parte do livro é uma exposição de informações que em certos momentos mina o potencial que a obra tem para aprofundar personagens e desenvolver situações interessantes.

FUNA não precisa pegar o leitor pela mão para ele compreender o mundo em seus mínimos detalhes quando o que mais importa são os personagens que nele habitam.

Já percebi esse mesmo problema em outras light novels; principalmente isekais, como em Arifureta e um pouco em Kenja no Mago, e não gosto nenhum pouco dele, porque passa a impressão de que falta aos autores a capacidade de desenvolver personagens mais objetivamente.

Cai muito no “dizer” e não “mostrar”, e isso é uma pena. Não é um problema que atinge tanto a protagonista, porque a escrita nos faz entrar na mente dela e saber como ela pensa, o que sente e o que a leva a agir de certas formas, mas, infelizmente, não posso afirmar o mesmo para os outros personagens.

E nem me atrevo a dizer que eles são ruins, mas sabe a sensação de que poderia ser bem melhor com mais diálogo e mais situações em que eles fossem explorados? Há até time skip que só ajuda a deixar a obra mais “pobre”.

Aliás, preciso comentar também que não gostei da Adele ter saído como saiu da primeira escola que frequentou, mas não achei a situação mal construída, fez sentido, tudo encaixou, é só que cortou qualquer possibilidade de desenvolver personagens secundários, de desenvolver a relação dela com as amigas que ela fez.

Para piorar houve justamente o time skip. Sem esse artificio poderiam ter mostrado alguns flashes da convivência dela com as amigas e aí eu já me daria por satisfeito. Mesmo que a intenção fosse não gastar muito tempo ali exatamente por causa da separação acho que precisava de mais, afinal, esse é o grande objetivo da heroína da obra, fazer amizades e assim ser feliz.

Entretanto, nem tudo está perdido e a segunda metade do livro, quando ela vira uma aventureira, que na história é chamada de caçadora, acerta mais nisso já que ela passa menos tempo com o novo trio de amigas que faz, mas constrói laços mais fortes que dão a entender ao público de que as personagens secundárias terão mais tempo para se tornarem “personagens”.

Isso, felizmente, é bem justificado, afinal, estudar o básico para viver bem não é como treinar para se aventurar no mundo em que elas vivem. Aliás, um ponto positivo da obra é sua construção de mundo, apesar de às vezes ser exagerada.

Não achei interessante saber tantos detalhes das circunstâncias de casamento da nobreza e não foi algo que me pareceu útil para o curso da história, mas era até meio que necessário para mostrar porque certos personagens agiam de uma forma ou outra, o que certos personagens ganhariam com uma ação ou outra, como é a sociedade em que a obra se passa.

Claro, há mais do que apenas o mundinho dos nobres e apesar de não ter sido mostrado um vislumbre mais amplo disso, a amizade de Mile, o nome que Adele adota ao se tornar caçadora, com Veil, um garoto órfão que quer se tornar um caçador para ajudar órfãos como ele, é um acontecimento bacana, pois mostra ao leitor que há muito mais que apenas os dramas da nobreza nesse mundo.

Há fome, há sede, há falta de várias outras coisas e há pessoas que tentam enfrentar essas desigualdades. Não é um mundo perfeito, mas, claro, só lendo outros volumes para saber se a Mile vai se aproximar do povo, do cidadão médio que ela tanto queria se tornar, apesar dela ser tudo menos alguém comum, ou se não, se é apenas um vislumbre de uma exploração de mundo mais complexa e completa.

Não acho que FUNA tenha toda essa capacidade para desenvolver essa história em outros “níveis” além de colocar a protagonista para chafurdar na própria piada, mas me dou o direito da dúvida e espero que a sua escrita consiga ir além.

Há potencial para tanto, e o que me faz enxergar isso, mesmo que não tenha nada a ver com esse desenvolvimento de mundo, é o clímax desse primeiro livro.

É divertido pelo que acontece, que pode até ser clichê, mas não é incomodamente previsível, e mostra que FUNA consegue tornar seus personagens mais “personagens”, mais vivos, quando assim deseja. Falta uma escrita descritiva mais empolgante nas lutas? Falta, falta e muito, mas há desenvoltura para dar a uma equipe de anime com o que trabalhar.

Enfim, Nouryoku é uma light novel divertida. Não à acho exatamente mal escrita, mas fica aquém do que poderia por ter pouco diálogo e muita narração.

A piada é muito usada na primeira parte, um pouco esquecida na segunda, mas isso faz sentido já que a Mile se restringe menos nela. Eu acho que funciona justamente porque é um isekai com protagonistas overpower e uma piada bem definida.

Não é lá muito original se analisarmos que obras assim têm sido lançadas aos montes e têm ganhado animes com cada vez mais frequência também, mas isekais com protagonistas mulheres não são tão comuns, né? Além disso, a Adele/Mile tem uma personalidade bem definida e interessante.

FUNA não erra no mais básico, criar e desenvolver bem, na medida do possível, sua personagem principal, o que nem sempre ocorre em um isekai. Acho que o futuro da obra é mais promissor que seu primeiro volume, então indico que você, caro(a) leitor(a), dê uma chance a light novel ou assista ao anime.

Claro, se não tiver problema em acompanhar a história de uma loli overpower reencarnada que quer fingir ser mediana, mas falha miseravelmente porque é boa demais em praticamente tudo.

Como último adendo só gostaria de comentar que teve algo que não gostei, mas gostei. Não gostei do personagem Kelvin ter sido pouco aproveitado. Me pareceu claro que a princípio ele sentia raiva da Adele e com o tempo isso deu lugar a inveja para então se tornar em respeito e admiração após o sermão que ela passa nele. Um momento bem escrito (mas que eu acho que poderia ter sido melhor).

Tenho quase certeza de que esse personagem deve voltar a série alguma hora e que vai ser um interesse romântico para a Adele/Mile, mas isso acaba indo de frente com outra impressão que tive, a de que uma de suas amigas caçadoras, Reina, tem um interesse romântico na protagonista. Na verdade, não é que vai de encontro, mas de quantas light novels isekai com uma protagonista feminina lésbica você já ouviu falar?

Será que FUNA terá coragem de dar vasão a essa possibilidade? Talvez, se eu não estiver vendo lírios brancos onde não tem. Se for assim, isso é para testar a reação do público a possibilidade e tomar o caminho mais popular no fim, mesmo que não seja o da heroína ficando com a amiga?

O pior é que a Adele acaba o primeiro livro com apenas 12 anos, normalmente eu nem teceria comentários sobre possíveis romances, mas que culpa tenho eu se as crianças se tornam adultas cedo nesse mundo? Vou fingir que não sei que é assim para tornar a Adele uma genuína loli, mente de maior de idade com corpinho infantil, e assim atiçar o fetiche de boa parte do público japonês.

Até a próxima!

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