Arifureta é uma light novel escrita por Ryo Shirakome e ilustrada por Takayaki. A obra tem adaptação em mangá e seu anime estreia na temporada de verão de 2019. É mais um isekai com protagonista overpower, e quem sabe um harém? Deve ser mais ou menos por aí, mas isso não é necessariamente ruim. Enfim, vamos a mais uma resenha de volume de light novel isekai no Anime21!

O primeiro “diferencial” de Arifureta é que ao invés do protagonista ir parar em outro mundo sozinho, ele é invocado com todos da classe na qual estuda, incluindo a professora. Uma classe que em sua maioria o despreza porque ele é um otaku que parece levar a vida na brincadeira e tem a atenção da garota mais popular da sala.

Dá para ser mais clichê que isso? Eu sinceramente espero que não, mas um pouco diferente do que tem sido a tônica do isekai contemporâneo, o protagonista Hajime não começa overpower como todo o resto de seus colegas, pelo contrário, ele começa de baixo, é o mais fraco dos mais fracos, e tem uma profissão não combatente.

Só isso já seria o suficiente para desanimar qualquer um, mas Hajime persevera e se esforça para compensar sua falta de poder de batalha e potencial limitado com conhecimento teórico. Uma boa forma de encarar a situação, eu diria, e bem mais realista que tentar desafiar as limitações de seu próprio ser naquele momento.

Contudo, não é como se Arifureta fosse muito realista, ao menos não no primeiro capítulo em que apresenta os personagens. O protagonista Hajime. A garota que deve ser uma das heroínas da história, Kaori. O herói clichê e perfeito demais para ser verdade, Kouki, etc. Um grupo pouco ou nada interessante e que reage a invocação para outro mundo da forma mais unidimensional possível.

Okay, não é como se eu devesse esperar uma caracterização realista de um isekai contemporâneo nesse quesito, mas partir para o clichê do cara que é obtuso demais para ao menos se questionar profundamente sobre a sua situação e em um rompante influencia todo um grupo a segui-lo é demais até para mim. Custava refletir um pouco que fosse?

Enfim, esse é só um dos motivos que torna a interação do grupo de estudantes uma das coisas mais chatas que li nos últimos tempos. Há muito diálogo expositivo e personagens estereotipados, é algo tão medíocre que uma criança de 5 anos anteciparia que há pelo menos duas ou três máscaras a serem derrubadas ali. Com todo o respeito às crianças de 5 anos.

Felizmente, o autor acerta ao lançar o protagonista nas profundezas da masmorra que a classe estava explorando e daí em diante começar a desenvolvê-lo de verdade, o tornando um protagonista “dark” sim, mas não exatamente um amontoado de ódio obcecado por vingança, apesar disso, obviamente, integrar a pauta da obra.

Porque é claro que o fato dele sofrer bullying acabaria em algo pior. Não é mais ou menos assim que todo protagonista “dark” é criado? O que nem acho que seja exatamente um problema. Não quando esses personagens já são tão reféns de um molde, quando eles parecem mais ferramentas de roteiro que humanos palpáveis. Menos mal que isso muda ao menos para o protagonista.

Do segundo capítulo em diante a narrativa continua se valendo exaustivamente de texto expositivo; parece que o autor tem dificuldade em criar diálogos e bons diálogos, diga-se de passagem; mas o ponto de virada da história torna Hajime um personagem bem mais palpável.

Bem mais interessante que antes de seguir o clichê do mais fraco que tenta dar uma de herói porque não é tão obtuso para não avaliar o que está a sua volta e acaba se ferrando no processo. É, isso é clichê, mas ao menos é o protagonista tentando fazer algo de relevante dentro da trama, né.

Confesso que não gosto muito da caracterização de sua personalidade gentil de antes de cair da ponte na masmorra, mas sei que o autor optou por seguir esse caminho para contrastar o Hajime de antes e o Hajime de depois. Antes um cara na dele, mas não indiferente, depois um sobrevivente que passa a priorizar a si mesmo, ou a quem alça a um status de prioridade em sua vida.

É aí que entra Yue, uma vampira overpower com uma regeneração que a torna praticamente imortal, quando vampiros não o são nesse mundo. Ela se torna amiga, companheira e até mesmo a mulher de Hajime. Um encontro de duas pessoas que compartilham a mesma experiência amarga de terem sido traídas por quem deveriam poder confiar.

Aliás, antes de encontrá-la, Hajime segue por um caminho tortuoso e é seu sofrimento que constrói um personagem melhor e bem mais interessante que qualquer um de seus colegas. Ele perde um braço, encara a morte várias vezes e só é salvo devido ao resíduo de uma pedra mágica praticamente divina.

Eu sei, é uma daquelas conveniências típicas de protagonista, mas o trabalho de personagem feito em cima da condição deplorável de Hajime e a forma criativa com a qual o autor tornou a habilidade inútil dele em batalha um aparato riquíssimo em prol dela, são pontos a serem destacados. Nessa parte a escrita não foge de momentos angustiantes e apresenta um ritmo cadenciado muito adequado.

Pode ser interpretado como conveniência ou sorte, mas o fato é que o protagonista se torna um sobrevivente e ao mesmo tempo uma esponja que absorve tudo o que consegue superar, usando de pouco em pouco aquilo que o taxava como fraco para se tornar forte. Desafiando a limitação que lhe fora imposta, o que é bem bacana, ainda que só seja possível porque ele supera o humano.

Mas isso sem perder a humanidade, sem se tornar um monstro de fato, mesmo comendo monstros e absorvendo seus poderes. Tudo graças a Yue, que cai como uma luva nessa dinâmica, a qual não se demora além da conta no clichê do protagonista denso que não dá vasão ao sentimento romântico que aflora entre ele e a heroína.

O fato dela ser uma “loli” é uma besteira, afinal, Hajime sequer é maior de idade e ela é muito mais velha que ele, só mais um detalhe de forma feito para agradar um público acostumado a estruturas específicas, e quase sempre medíocres.

A narrativa ainda se volta em relances aos colegas de Hajime; até mesmo expondo que há um vilão “escondido” ali, cuja identidade não é difícil supor; mas desse núcleo só tiro de proveitoso o que esperar do reencontro dele e de Kaori, ainda mais agora que ele mudou tanto e está com Yue em todos os sentidos possíveis da palavra.

Mesmo com diálogo expositivo em excesso, Arifureta se salva pelo desenvolvimento do protagonista e seu relacionamento com a heroína. Para o resto eu não poderia ligar menos, mas quero ver como esse mundo tão clichê de fantasia vai “recebê-lo” em sua volta dos mortos.

E também se esse isekai vai se tornar mesmo um harém e se Hajime conseguirá retornar ao Japão, mas, principalmente, o que vai ser desse personagem não tão clichê ainda em construção. Ele se manterá fiel ao desejo de priorizar apenas a si mesmo e Yue ou buscará vingança?

Dê uma chance a Arifureta. Entre os isekais disponíveis no mercado ele não é o pior e nem o melhor, apenas uma bela amostra de como os autores japoneses podem ir da água para o vinho mais rápido que as balas que o protagonista dispara de sua Donner.

Até um próximo artigo!

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