Esse episódio teve duas partes completamente distintas entre si, sendo uma delas interlúdio da outra e uma forma muito boa de resolver o último conflito da Mary sem desperdiçar um inimigo muito poderoso e formidável para o grupo inteiro. Embora tenham sido partes distintas elas são tão bem relacionadas e bem desenvolvidas que não achei isso prejudicial ao enredo como um todo. Funcionou.

E aproveito para comentar o quão burro eu sou. Só nesse episódio eu entendi porque eles descem para níveis maiores: é uma mina, afinal de contas, é subterrânea pois, os níveis crescem de cima para baixo. Mas mantenho o que disse no artigo anterior: esse mundo tem uma mecânica quebrada. Como assim em uma mina com mais de dez níveis o chefe aparece logo no quarto? Se Grimgar for um jogo, é um jogo muito ruim. Contra todas as evidências, sou forçado a acreditar que Grimgar não é um jogo. Ou é um jogo em modo nightmare.

Esse episódio começa onde o anterior acabou: tá todo mundo ferrado porque enquanto estavam só de turismo nas fazendas do quarto nível se viram cercados e sem muito lugar para se esconder, e então o Ranta acidentalmente soou um sistema de alarme dos kobolds que entram em alerta e em pouco tempo o chefão deles já está ali. Ferrou. Ferrou tudo, ferrou geral. Mas a Mary tem um plano: primeiro, congelar de pânico causado pelo seu Transtorno de Estresse Pós-Traumático; desmaiar em seguida, pelo mesmo motivo; e finalmente, descer para o quinto nível e de lá voltar a subir tudo de novo. E até a parte de descer ao quinto nível tudo deu bem certo.

Eles param para descansar em um antigo templo da divindade que Mary segue, e aí começa sua própria redenção. Foram para lá porque os kobolds não cultuam aquela divindade então quase nunca vão lá, e, informação importante, ela própria costumava usar aquele local como descanso com seu grupo. Como fomos informados após a morte do Manato, nesse mundo se corpos não são cremados eles se tornam mortos-vivos em poucos dias. É impossível que Mary não soubesse que esse era o destino de seus companheiros mortos nas minas. A não ser que ela contasse que os kobolds fizessem essa bondade por ela, ou, algo mais factível, que eles os comessem. Ainda, ela podia supôr que mesmo que tivessem virado mortos-vivos, teriam perambulado por aí e sido derrotados pelos próprios kobolds eventualmente.

Velhos amigos

Velhos amigos

De todo modo, havia a chance de que eles estivessem ainda por lá, e é impossível que a Mary não soubesse disso. Não acredito que ela tenha escolhido ir para aquele templo consciente de que encontraria seus ex-companheiros lá, porque a situação era atroz demais e a Mary não seria irresponsável a esse ponto. Mas talvez inconscientemente ela estivesse torcendo sim para encontrá-los. Para finalmente se despedir deles, para dar descanso às suas almas. E acabou sendo como eu disse, embora um pouco diferente: seu novo grupo a ajudou a fazer às pazes com seu passado. Não derrotaram o grande vilão, até porque ficou demonstrado que ele é muito mais forte do que eles poderiam enfrentar. Pelo menos muito mais forte do que faria sentido narrativo eles derrotarem em um arco lateral, de um único personagem. Não duvido que, apesar do monstro ser obviamente muito forte (há muitos aventureiros muito mais fortes do que eles, e no entanto o Chefão Kobold permanece vivo), eles ainda o derrotem. Basta usarem força de vontade, o poder da amizade e protagonismo. Sim, clichês por toda parte.

Pelo menos que não se acuse o Chefão Kobold de ser indelicado: ele aguardou que a Mary resolvesse seus assuntos pendentes com seus companheiros mortos para só então reaparecer querendo matar seus companheiros vivos e ela. Mas ele não é adepto de jogo justo: mesmo já sendo sozinho muito mais forte do que o grupo do Haruhiro inteiro ele chama por reforços – e isso tornou a fuga muito mais difícil.

Olha só quem voltou!

Olha só quem voltou!

Se a Mary não conhecesse o local todos teriam morrido, perdidos nos labirintos, enfrentando kobolds até a exaustão. Como ela conhecia, eles tiveram uma chance de fugir – e mesmo para isso precisaram dar tudo de si. Na luta contra os mortos-vivos havia ficado claro o quanto o Haruhiro confia pouco em si mesmo e nos demais (principalmente no Ranta). Essa desconfiança é disfarçada de medo que alguém morra. É compreensível, mas cria dificuldades desnecessárias e diminui sua própria habilidade como líder. Como eu já disse noutro artigo, todos estão ali juntos desde o começo, eles se conhecem. Da mesma forma que Haruhiro está sempre observando a todos, os demais também observam o Haruhiro e se observam entre si. No episódio anterior o Haruhiro achou que o Ranta foi imprudente demais e poderia tê-lo matado quando atravessou um inimigo com o Haruhiro do outro lado. Provavelmente não houve risco nenhum porque o Ranta já conhece o Haruhiro bem o bastante para saber onde ele estaria e sua capacidade de esquivar do golpe, se necessário.

É depois da luta contra os mortos-vivos que Mary se despede finalmente de seu antigo grupo, podendo abraçar totalmente seu novo grupo, e que Haruhiro percebe seu erro como um líder excessivamente preocupado. Nesse instante eles se tornaram um grupo de verdade, o melhor grupo que eles são capazes de ser. E começaram a fugir feito loucos dos kobolds que os perseguiam. O Ranta acabou ficando para trás e quando o grupo se reúne e descobre o Haruhiro não hesita mais: eles vão resgatar o Ranta sim, mas vão fazer isso com um plano, por improvisado que seja. Com cada um oferecendo o seu melhor ao invés dele tentar decidir tudo sozinho. A verdadeira força está em confiar em si mesmo e em seus companheiros. O Ranta sempre foi forte.

Ranta versus o mundo

Ranta versus o mundo

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