Bom dia!

Sabe que estou gostando dos animes que escolhi? Claro, porque são bons também, mas não só isso. Eles me dão o que pensar.

Quando falamos em certo e errado, o bem e o mal, ou seja, quando falamos de moral, estamos falando de algo que se aplica exclusivamente ao ser humano. Os animais, mesmo os mais inteligentes, seguem seus instintos. Outras formas de vida sequer são capazes de tomar decisões complexas. E os objetos não vivos, os muito grandes e os muito pequenos, apenas obedecem as leis fundamentais do universo.

Seres humanos são animais morais. Transumanos, que nada mais são do que humanos evoluídos à força, com o concurso da tecnologia e da ciência, continuam sendo humanos e portanto morais.

Em No Guns Life, o transumanismo existe através de incríveis membros e outras extensões corporais robóticas com toda sorte de funções, controlados por circuitos autônomos chamados de sub-cérebros, conectados ao sistema nervoso central do humano ampliado.

Segundo o dito popular, errar é humano. Isso é verdade se estivermos falando de erros de natureza moral – um animal é plenamente capaz de cometer erros de julgamento, e quem tem animais de estimação sabe o que eu quero dizer e sabe que isso pode ter resultados hilários.

Assim, se o transumano é um humano, se é um animal moral, ele também é capaz de cometer erros e de ser mau.

 

Julgar as ações de Ende é muito difícil. Não é possível saber quão consciente ela está quando assume sua forma de batalha

 

Prometo que essa peroração já está chegando ao fim.

O último ponto relevante é que o certo e o errado, e por conseguinte o bem e o mal, não estão equilibrados. Há infinitas formas de errar e poucas formas de fazer o que é certo. Não raro apenas uma. Somos capazes de sistematicamente acertar muito mais do que errar porque o que nos torna morais é a razão, que também nos permite resistir ao mal de todas as formas em que ele se manifesta.

Em No Guns Life, há pouca dúvida de que a Berühren seja uma organização maligna para a sociedade. Aquele capanga com o rosto extremamente socável que retornou nesse episódio e é quem está conduzindo a caçada contra Tetsurou e a retribuição contra o Juuzou é uma pessoa particularmente má.

 

Eu não decorei o nome dele e nem quero, só quero que alguém dê um soco nele

 

Mas mesmo a Berühren possui um rudimento de ética que justifica tudo aquilo o que faz: é aquela tal história das engrenagens. É tudo por um bem maior, todos dentro da organização têm um papel a cumprir. Para si próprios, pois, eles não são maus.

Não obstante, o que eles fazem é maligno. Esse tipo de ética perversa pode atrair pessoas malignas apenas para que elas se auto-justifiquem, e nesse caso fica difícil diferenciar alguém de intenções puras que é levado a cometer o mal por acreditar naquilo que segue de alguém que enxerga de longe a oportunidade de fazer o mal que sempre quis sob tutela de um grupo maior.

E é uma diferença inútil, em todo caso. Mas com isso tudo eu só quis apontar o seguinte: é perfeitamente possível alguém cometer atrocidades horríveis ao mesmo tempo em que acredita do fundo de seu coração que está fazendo o bem.

A história da humanidade com efeito está cheia de gente assim. E isso é algo importante que é apontado nesse episódio, mas segura essa ideia por enquanto.

Há também aqueles que sabem que o que estão fazendo é errado, mas sentem que não têm outra escolha. É o caso de Anne e Ende. Principalmente de Anne.

 

Antes de morrer, Anne libertou Ende de toda a culpa, dizendo que foi ela quem sempre escolheu obedecer a Berühren

 

Anne sabia muito bem que o que as duas estavam fazendo era maligno, mas estava convencida de que isso era tudo o que podiam fazer. Ela fica furiosa quando Tetsurou a urge a escolher não fazer o mal, porque ela acredita que nunca teve escolha.

A condição em que foram criadas e usadas certamente deve induzir essa forma de pensamento desesperado em muitos. Em todo caso, é possível que Anne apenas rejeitasse o livre-arbítrio como forma de se livrar de seu próprio sentimento de culpa. Se ela não podia escolher, então a culpa não podia realmente ser dela, certo? Estava apenas cumprindo ordens.

No final, porém, ela assumiu toda a culpa sozinha para poder salvar Ende. Não salvar sua vida, porque isso já estava além de seu poder, mas, figurativamente, salvar sua alma, coloquemos dessa forma.

Anne sempre soube que o que faziam era errado e apenas buscava subterfúgios mentais para se sentir melhor consigo mesma. Mas e aqueles que, como eu aludi antes, acreditam de verdade que estão fazendo o que é certo?

 

Tetsurou achou que porque sua causa era justa tudo o que fizesse em nome dela seria justo

 

Por exemplo, o Tetsurou. Juuzou deu uma enorme bronca nele no final do episódio por causa disso, e acho que ele entendeu o busílis da questão. Ele usou Juuzou, afinal. Tetsurou manipulou Juuzou literalmente, contra sua vontade expressa, tão logo ele se recusou a fazer o que o garoto queria.

E porque o que Tetsurou queria era, a seu juízo, algo bom (e era mesmo, o próprio Juuzou reconhecera isso), ele se sentiu justificado em manipular o Resolver.

Não foi só um erro de cálculo que poderia ter acabado com todos eles mortos. Foi moralmente errado. Como disse Juuzou, não foi diferente do que a própria Berühren faz.

Mas não é só porque o Juuzou foi capaz de olhar para esse mal e identificá-lo pelo que ele realmente é que ele será sempre infalível, um santo guerreiro do bem.

Até agora, ele tem jogado no seguro. Evita se envolver o tanto quanto possível. Em situação de conflito, evita ao máximo a violência. Tirando algumas ocasiões em que ele escolheu agir (e agiu bem), isso tem funcionado. Não quer dizer que tenham sido as escolhas mais certas possíveis, mas erradas não foram. Pelo menos até agora.

E nada garante, nesse mundo com tantos dispostos a fazer o mal, que isso continuará funcionando.

 

Juuzou não pode continuar dando as costas para tudo para sempre

 

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