Realidade aumentada é um tema bem interessante de explorar, ainda mais em Sword Art Online, série multimídia que começou nos livros e ganhou o mundo com a realidade virtual “extrema” do jogo de imersão completa que dá título a franquia.

Se dá dinheiro é quase certa a produção de material original, sendo assim, Ordinal Scale (primeiro filme de fato da série) faz a ponte entre o arco Mother’s Rosario e Alicization. Vamos ver o que achei do filme?

A película de 2017 conta a história de Kirito e Asuna se adaptando a um jogo de realidade aumentada chamado Ordinal Scale que usa um dispositivo chamado Augma. Diferente do NeverGear, o Augma não oferece a imersão completa, mas é portável e pode desempenhar diversas funções além de jogar usando a realidade aumentada.

O dispositivo é doado aos alunos da escola especial criada para sobreviventes do SAO e daí se inicia a ligação entre os dois jogos. Inclusive, ao mesmo tempo em que essa obsessão pelo Sword Art Online é uma qualidade, também é um defeito do filme, visto que Ordinal Scale é só mais uma consequência de SAO, e uma que poderia ter sido melhor explorada.

Ao longo do texto distribuirei minhas críticas (e, claro, elogios quando achar cabível), mas a primeira nada tem a ver com os jogos e sim com a estrutura da série. Prometo não problematizar demais o harém do Kirito, mas você não acha idiota a Silica soltar umas frases dizendo que quer andar na garupa dele?

Ao menos a Lisbeth parece apoiar o casal nesse filme, porque a Sinon também tenta tirar sua casquinha e assim seria com a Suguha, não fosse ela enxertada da narrativa já no início, sendo sacada para a fanservice party que é o final.

Sei que não é relevante, mas não irrita ao menos um pouco a manutenção dessa ideia do harém, ainda mais em um filme em que a relação do Kirito e da Asuna entra em foco?

Enfim, continuando a falar da Asuna, o bônus de fanservice dela no banho com certeza não desagradou o público-alvo, muito pelo contrário, eu mesmo não me desagradei, mas espero que tenha sido censurado nos cinemas, afinal, é um filme que tirando isso abarca públicos de todas as idades.

A Asuna tem um corpo escultural, é fofa, tem uma voz doce e uma personalidade que beira a perfeição, então sim, apesar de não ter cabelos negros é a personificação da Yamato Nadeshiko (o ideal de mulher japonesa, o que seria a morena para o brasileiro).

E isso é um problema? Não, ao menos não se ela “existe” enquanto personagem sem o Kirito, como ocorreu em praticamente todo o arco Mother’s Rosario. Ela sair para uma raid sozinha, ter seus momentos de fragilidade e não se deixar ser a donzela em perigo o tempo todo, se juntando a luta no final, conferem brilho a personagem.

De tal forma, aqui deixo meu elogio, fizeram o mínimo para que ela não dependesse do namorado, sendo sim apoiada por ele, mas agindo bastante também por conta própria. Só é uma pena que não possa escrever o mesmo sobre o aproveitamento de outros personagens…

Você gosta do Klein? Eu não gosto do Klein, mas todo mundo já sacou que ele é apenas uma espécie de bobo da corte em SAO e nunca serve exatamente para nada. Talvez ele exista para lembrar ao público que todo cara bonzão feito o Kirito tem aquele amigo perdedor? Não sei se é isso, mas se for o filme acerta em cheio, pois ele e seu grupo levam uma coça daquelas.

Como o pré-requisito para assistir esse filme é ter assistido as duas temporadas do anime imagino que não se surpreenda e nem se incomode com isso, mas eu me incomodo sim, pois foi outra oportunidade desperdiçada para aproveitar melhor não só ele, como também outros personagens (apesar de toda heroína cativa ter tido ao menos um momentinho, até mesmo a Yuuki).

Pelo menos as pistas para o problema que o filme aborda vão sendo bem espalhadas ao longo da trama, mas como não é nada muito criativo (e nem é problema não ser) até mais ou menos metade do filme se torna fácil sacar tudo, sendo a perda de memória da Asuna a chave para o envolvimento do Kirito.

E quando o Kirito se envolve não tem jeito, qualquer plano de um antagonista vai dar errado, por mais perfeito que este possa parecer (não que fosse o caso nesse filme).

Antes de entrar no tópico das memórias perdidas preciso pontuar outra característica do filme que muito me desagrada, ainda que a princípio não tenha me parecido ruim. Por que Ordinal Scale me passa tanto a ideia de que o Sword Art Online, o jogo de cem andares sediado em Aincrad, ainda não acabou? Porque não acabou de fato!

Tudo que se sucedeu ao primeiro arco tem a ver com ele (Alicization já se distancia mais, mas esse já é posterior ao filme), tem influência direta dele, mas no caso desse filme a importância dada ao jogo SAO é absurda, tanto que o longa só existe por causa do primeiro jogo, perdendo uma bela oportunidade de explorar mais a fundo os pontos de vista de outros personagens.

Não que haja negligência em apresentar a Yuuna e o Eiji, os amigos não combatentes presos em Aincrad, mas ao final do filme o que o telespectador sabe dos dois além de que a garota queria ser uma cantora e o garoto tinha medo de lutar, mudou, mas seguiu a vida complexado?

Eu terminei o filme tendo a sensação de que não os conhecia e nem me interessava conhecê-los melhor, porque apenas expor o drama desses personagens, apenas nos contar que eles existem, não os torna mais palpáveis ou interessantes para o público.

Custava ter reservado algum tempo para as interações dos dois em Aincrad? Eu sequer sei qual é a profundidade do laço deles (no máximo dá para deduzir que ele gostava dela pelo que faz), se eram grandes amigos ou ela era apenas a paixão da infância, e pior, a ideia de que ela interferia positivamente na vida dos jogadores foi apenas jogada no final.

Não era algo que poderia ter sido mais bem trabalhado? Será que o filme não seria melhor com personagens menos rasos? Gastam muito tempo com saudosismo ao jogo primordial e cenas bobas de interação entre personagens que o público já conhece e negligenciam o aprofundamento dos novos personagens anexados a franquia.

Tudo bem, sei que eles são personagens originais, que não existem na light novel, mas nem por isso não mereciam mais. A Yuuna tem momentos realmente bonitinhos, principalmente ao aparecer para o Kirito, e o Eiji agrega as belas e performáticas cenas de ação, além de ter um pano de fundo que se melhor trabalhado proporia mais reflexões.

Não que a intenção do filme seja levar alguém a refletir. No máximo há uma crítica embutida aos perigos da realidade aumentada e se reforça a ideia de que todo cientista que mexe com essa área é dotado de genialidade proporcional a sua loucura. Não deve ser assim na vida real, mas vai saber, né?

Se tem um ponto em que ainda acho SAO relevante é nisso, explorar as benesses e os perigos da realidade virtual, e também da realidade aumentada. Mas tudo isso só até a página 2, no máximo no que tece a estrutura da trama corrente, já que a execução dá a entender que se pode enganar o game over em um jogo mortal com o poder do protagonismo.

Aliás, tem duas cenas, uma na luta do Kirito com o Eiji (ótima sequência de ação, roteiro bem mais ou menos) e outro do Kayaba conversando com o pai/cientista louco, que exemplificam bem isso, até se complementam.

O Kirito não só não pode perder para alguém que nega seu passado, como não vai perder nunca. Por quê? Porque ele tem o poder do protagonismo ao seu lado, o poder “misterioso” que o Kayaba cita.

Não é exagero pensar dessa forma e nem reclamar disso, ainda mais quando o final é derrotar um boss e sair aniquilando o resto como um deus ex machina. Okay, posso estar exagerando, mas admita, em nenhum momento você achou que o Kirito perderia. Achou?

Nem teria como, estava na cara que os outros sobreviventes do SAO apareceriam, não à toa eram peça fundamental do plano do velho. Sendo assim, com um pouco de ajuda, até protagonismo tem limite, tudo deu certo no final, mas isso é algo para tratar melhor no finalzinho da resenha.

Para não dizer que não falei de flores, ha um trecho que genuinamente aprecio nesse filme, apesar de também não achá-lo tudo isso, que é a ida do Kirito a casa da Asuna. Um molecote qualquer talvez pensasse em sexo, mas obviamente o Kirito sabia da gravidade da situação que os envolvia e buscou passar segurança a namorada.

Ela retribuiu com carinho e o beijo foi uma bela forma de selar a confiança fortalecida entre os dois. Não acho mesmo Kirito e Asuna um casal apaixonante, mas também não acho a relação deles ruim, até porque antes de virarem namorados eram companheiros de batalha, então não é só melação o que há entre eles.

Aliás, há até pouca melação, mas quando houve, especificamente nesse caso, foi algo importante para levar a Asuna a se erguer e lutar no final. Não que esperasse menos dela, minha opinião sobre a Asuna melhorou após o arco Mother’s Rosario. Na verdade, acho o arco da Konno Yuuki o melhor de SAO e duvido muito que seja batido algum dia.

Se há um momento em que o drama de Ordinal Scale brilha, ainda que nem tanto assim, é nessa cena do casal no quarto da heroína. Infelizmente, não posso dizer o mesmo da Yuuna, pois seus melhores momentos são apenas imagens estáticas, o que acaba não sendo bom porcaria nenhuma.

Enfim, para mim pior que o fanservice vazando pelos ladrilhos foi a aparição do Kayaba Akihiko. Não tenho o intuito de demonizar o personagem nem nada, mas qual é a necessidade de mais uma vez romantizar seus feitos? Já não basta um pai desesperado para “ressuscitar” sua filha?

Inclusive, o plano do velho, por mais que também lidasse com grandes riscos a vidas humanas, é tão egoísta quanto o do Kayaba (ambos só existem para satisfazer desejos próprios), mas não acho tão cruel. Ainda seria questionável se só fritasse memórias, mas me parece menos vazio de propósito que foi o prender milhares em um jogo mortal.

Ele queria reaver a filha que perdeu de uma maneira até injusta, né. E não me entenda mal, sei que são farinha do mesmo caso, mas ao menos o pai tinha uma motivação palpável.

O mais “legal” é que ele conversa com o Kayaba, que naquela cena imagino que se tratasse apenas de coisa da cabeça dele ou do Augma, e não parece culpá-lo quando foi ele quem criou o cenário para a morte da filha, quem de fato a condenou. Não é meio absurdo, e até mesmo idiota, isso sequer ser lembrado? E o velho até que é bem emotivo, se não fosse não teria feito o que fez.

Subindo de nível, você percebeu algum furo de roteiro na produção? Notei ao menos dois, o Kirito abrindo uma porta que deveria estar trancada também pelo lado de fora e ele pulando vários metros sem quebrar nada.

Ou o Augma também aumentava as propriedades físicas do usuário? Porque ele quebrou o cheat que o Eiji usava, então não deveria ter acesso a nada que o fizesse se movimentar de forma sobre-humana.

Deve ter mais coisa zoada e eu não percebi. Não vou incluir em minha reclamação os desdobramentos do clímax propriamente dito, pois nem parei para pensar se tinha algum furo de roteiro ali, apesar de ter achado a ideia da necessidade de finalizar o boss final de SAO toda meio tosca.

Desse trecho pré-clímax, até o Kirito entrar na arena do show, elogio duas coisas. A animação excelente (foi assim sempre que preciso, não há o que reclamar) e o Eiji ter ficado com cara de tacho ao saber que foi usado. Ele é o tipo de personagem irritante o suficiente para me agradar ver se ferrando.

Como já comentei que achei a história da Yuuna um ponto fraco da trama, apesar da ideia ter sido boa, não posso me esquecer de questionar também toda a interação da versão “original” da garota. Parecia um fantasma mesmo, o que é uma licença poética das boas, nada menos que uma forçada de barra corriqueira em SAO.

A Yuna, a idol de realidade aumentada que nem se compara a Hatsune Miko, já nem considero um problema, afinal, se trata da versão comercial criada com um propósito definido. A Yuuna semelhante a original que interferiu demais no desenrolar da trama, tanto que mais para frente não duvido ver IA morta voltando a vida em SAO…

Enfim, improvisar o fim do jogo Sword Art Online para resolver a trama de Ordinal Scale foi o cúmulo do fanservice, o que nem foi tão ruim, pois rendeu uma bela cena de ação final e saciou o desejo dos jogadores de finalizar o boss final, mas em compensação escancarou o ponto da minha reclamação, não há praticamente nada em Ordinal Scale que não derive de Sword Art Online.

Todos os monstros que renderam uma luta eram os de SAO, no máximo o monstro da propaganda do OS era original do jogo. Sendo assim, como não reclamar dessa dependência exagerada? Usar a realidade aumentada para MMORPG não é má ideia, mas fazer isso sugando tudo de um jogo de realidade virtual me parece subaproveitar a ideia.

Acaba tudo no campo da consequência, e uma exagerada em comparação ao ALO (ALfheim Online) e ao GGO (Gun Gale Online), jogos que claramente bebem na fonte do pioneiro SAO, mas são interessantes por si só. O Ordinal Scale sequer dá para ser reconhecido como jogo, o máximo que fica é o Augma, isso se o dispositivo e a realidade aumentada não forem esquecidos.

Quanto ao clímax, não há muito o que acrescentar, talvez só que não achei desnecessária a “aparição espiritual” da Yuuki com a Asuna, afinal, quem ensinou aquele combo a heroína foi a amiga, né. Se ela não podia estar presente, que ao menos fosse representada nesse simbolismo. Esse é dos fanservices que vem para o bem, e não digo isso só porque adoro a Yuuki não.

A aglomeração de sobreviventes não foi ruim também, mas encurtou uma luta que poderia ter sido bem melhor com mais dificuldades e menos lutadores. Aliás, esse é outro problema do clímax do filme, ele não dura muito e, apesar de ter boas cenas de ação, não empolga. O trecho em que finalizam o boss é ótimo, mas e depois, qual foi a graça do Kirito usar aquela espadona?

Não tem graça alguma e depois da breve, mas ótima, sequência de ação o filme demora a acabar o suficiente para que a emoção do telespectador já tenha se esvaído. Se for fã de carteirinha talvez você curta adoidado, mas se assistir o filme com algum olhar crítico acho difícil não compartilhar dessa e de muitas outras das minhas opiniões.

Isso se deve ao quanto o filme é fraco. Não que filme original de anime mereça grande expectativa, mas havia como ser melhor ainda que com a exploração do jogo que inaugurou a franquia, bastava que aprofundassem personagens e dessem uma cara de história realmente original, que não existe única e exclusivamente por causa de outro jogo.

Sei que a premissa meio que inviabiliza o que desejo, mas, por exemplo, se o tema da realidade aumentada fosse mais e melhor explorado essa sensação de “novidade” já pareceria mais verdadeira. O pai da Yuuna sequer foi preso, o caso foi abafado e a Yuna seguiu sua carreira, no máximo os sobreviventes do SAO deram um tempo no Augma por motivos óbvios.

Não houveram consequências porque elas não importavam. Só o que importava era mexer com os sobreviventes, com isso feito a fim de romantizar as lembranças do SAO (compreensível no caso específico do casal protagonista) e mostrar a importância dos não combatentes (esse já um motivo secundário), quem liga para consequências reais, não é mesmo?

O fim do filme é até bonitinho, me refiro ao casalzinho, mas passa longe de salvar o clímax meio bagunçado e pouco ou nada interessante, ainda mais quando zoam com o beijo. Qual o motivo para isso? Torturar ainda mais os fãs? SAO é clichê ao extremo, então que ao menos entreguem os clichês que a maioria quer ver. O clichê broxante do beijo interrompido é um porre.

Como o Kikuoka nem gente é (tem cara de mocinho, mas é um cretino) a ponte feita com Alicization diz respeito a qualquer ajuda que o velho maluco deve ter dado para aperfeiçoar a Alice, heroína do arco Alicization.

Na época foi uma boa artimanha para gerar hype para a terceira temporada, a qual nem vou me dar o trabalho de indicar em 2020, tanto porque você já deve estar vendo, quanto porque eu acho uma droga.

Esse filme é bom, apesar de todos os problemas que minaram seu potencial e irritam a qualquer um que não tenha um pôster do Kirito colado na parede do quarto. Digo, em comparação a Alicization ele chega a ser ótimo, a série de TV nem tanto, diria que há arcos melhores e piores que o longa.

Tenho asco do Kirito, mas ele nem foi tão problemático nesse filme, a Asuna já posso dizer que foi realmente bem, mas, infelizmente, não posso afirmar o mesmo sobre os novos personagens.

Ao menos a mensagem dos jogadores não combatentes serem importantes (a ideia de que a Yuuna não viveu sua vida em vão) foi passada e o casal top das paradas superou mais um problema. Não dá para pedir muito mais de SAO mesmo…

Vale a pena assistir Ordinal Scale? Se você é fã de SAO sim e se já viu duas temporadas deve ser fã ou masoquista. Não que ache toda a série ruim de doer, mas com certeza não é uma das melhores coisas que já vi na vida, e eu já vi muita coisa. Dessa conta só tiro o arco Mother’s Rosario, ponto fora da curva dessa franquia de popularidade tão grande e qualidade tão questionável.

Até a próxima!

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