Por trás da fachada pirracenta, existe sim uma criança que tenta ser forte ao seu modo, encarando o difícil dia a dia de uma garota nobre, fadada ao esquecimento familiar. Compartilhando de algumas particularidades com a Arte, a Katarina finalmente expõe os sentimentos e ideias que guarda a sete chaves dentro de si e não consegue gerenciar sozinha.

Sendo sincero eu esperava que as motivações da menina fossem um pouco mais “rasas”, no sentido de que cozinhar figurasse apenas como um objetivo pessoal e sem um propósito muito específico de vida. Nisso fiquei surpreso e até satisfeito em ver que a culinária não era o “final”, mas um dos meios da sua história.

Curiosamente o caso da personagem não é exatamente um previlégio ou algo exclusivo a ela, porém o caso dela apenas reafirma a problemática dos herdeiros na era medieval e como alguns reagiam de forma diferente a essa realidade – afinal ser tratado como uma mera ferramenta descartável e invisível não soa saudável, muito menos feliz.

Além de carregar isso nas costas, a Katarina ainda precisava lidar com o “desamor” de seus pais, um homem estupidamente grosseiro e uma mulher omissa. Ainda consigo entender a questão da Sofia, muito por conta do papel que sobrava a outras como ela naquele período, porém ainda assim a culpo por outras coisas que concernem a sua natureza despreocupada.

Como a Arte bem nota, existe um abismo imenso entre pais como os seus e outros como os seus patrões. Apesar de todas as divergências, a mãe da Arte se importava com a existência da filha lutava pelo que acreditava ser o bem estar dela, ao passo que a Sofia apenas abaixa a cabeça e segue para o dia seguinte. Como mãe, sua filha deveria estar em primeiro lugar, mas ela apenas se cala, consente com os maus tratos e ignora o sofrimento que a menina passa, de certo modo errando mais que o marido.

O problema nem é o fato de não se opor, afinal sabemos que as circunstâncias ali eram outras, porém a ela faltou a consciência de notar ao menos o apoio e o conforto materno que precisava prover a filha, frente ao peso obrigatório que estava carregando  – itens esses encontrados na ama de leite, Buona.

Diferente dos pais desinteressados, a empregada e seu filho Gimo, proveram mais do que deveriam, sendo uma verdadeira família. Infelizmente as questões de distinção social e a sua posterior morte a afastaram da Katarina, porém não sem deixar fortes marcas nela.

Graças a situação que viveu, a loira cresceu acreditando na importância da igualdade entre nobres e plebeus, afinal, independente das suas finanças, qualquer um é capaz de dar amor. Em retaliação a discriminação que a separou de sua outra família, ela simplesmente optou por descartar os valores aos quais seu pai dava tanta importância e se opondo a ele com sua suposta falta de cultura.

Acho que levando em conta toda essa bagunça na estrutura familiar dos Falier, o Yuri exerce um papel importante, já que – tirando a cozinha – ele é a única ponte entre a menina e seu equilíbrio interno. O amor genuíno que expressa por ela, é o que a mantém feliz e com vontade de encarar sua triste realidade – tanto é verdade que ele acaba como um confidente e ajudante dela.

Por um instante me preocupei com o psicológico da Katarina por conta do Gimo e sua recusa em vê-la, mas o garoto também tem a sua cota de salvador da pátria, por sua maturidade ao ensinar a irmã como superar seu próprio destino, ainda deixando de brinde a relação perdida dos dois, em aberto para um futuro próximo.

Gostei bastante da forma como a Arte se revolta com a situação da menina e responde devidamente ao Malta, porque muito embora ele precisasse de alguém desaforado para jogar umas verdades nele, as palavras dela não tinham intenção direta de atingí-lo – já que as chances de ele absorver algo eram mínimas -, mas elas tinnham o objetivo de despertar a Sofia de sua inércia, o que funcionou no final.

Percebendo o que sua filha queria dela, a mulher enfim reage e decide se erguer pela mesma, levantando a sua voz. A cena expressa um realismo interessante ao lidar com os sentimentos confusos da mãe, pois aquela ação não só era nova, como a assustava, porque ela estava saindo de sua zona de conforto de mãe ausente e esposa obrigatoriamente submissa.

Agora ela estava indicando que pretendia assumir as necessidades da Katarina, encarando de frente o seu título de mãe – mesmo que não estivesse muito preparada para tal – e como resposta, a menina demonstra que está amadurecendo e pretende seguir em frente com sua vida junto a ela. Felizmente para nós, a Arte não foi demitida e as mulheres da casa Falier tem uma chance de recomeçarem suas vidas como uma família de verdade.

Me pergunto como a maior independência das duas se construirá partindo desse ponto, principalmente porque elas ocupam posições diferentes, mas saio contente com o desenvolvimento atual de ambas as personagens nesse arco. Com toda a revolução que causou na vida da dupla, a protagonista ganha a simpatia e ocupa seu espaço como amiga, fico ansioso para ver a sequência desses acontecimentos no episódio seguinte, onde a Arte provavelmente deve finalizar sua passagem por Veneza.

Agradeço a quem leu até o final e nos vemos no próximo artigo!

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