Girls’ Last Tour – ep 8 – Passado, presente e futuro
Bom dia!
Dizer que o episódio de Girls’ Last Tour foi excelente já é chover no molhado. Com esse, já são seis episódios seguidos que eu dou cinco estrelas, empatando com o recorde antes estabelecido pela segunda temporada de Shouwa Genroku Rakugo Shinjuu. Rakugo Shinjuu, aliás, irá me ajudar nesse artigo.
A primeira esquete do episódio retratou uma visita acidental das garotas a um cemitério. Elas não sabiam que era um cemitério. Você sabia? A primeira coisa que me chamou atenção no local foram as ranhuras no chão, alinhadas às inúmeras fileiras de gaveteiros – certamente trilhos para algum veículo que no passado realizava o acesso às instalações. Vista de cima, a coisa toda ficava com uma aparência que lembra vagamente circuitos eletrônicos, muito particularmente bancos de memórias, com seus vários chips de armazenamento idênticos alinhados. E não era para menos, não é?
Fileiras de gaveteiros escuros com apenas uma etiqueta os identificando individualmente, uma vasta solidão visitada pelas garotas e pelo som dos elementos – o vento. Eu logo cogitei: será um cemitério? Quando Chito e Yuuri encontraram a estátua sagrada eu tive certeza de que havia percebido corretamente. Tantas pessoas viveram naquele mundo, naquela cidade, e agora estão reduzidas a vestígios. Fragmentos de memórias daqueles que um dia caminharam, cresceram, sorriram e choraram. E morreram. E foram esquecidos.
Um destino inevitável ao qual todas as pessoas um dia sucumbirão. Ao qual a própria civilização sucumbirá, e o próprio mundo também. É nos vestígios de uma humanidade que não mais existe que duas garotas vivem a sua própria jornada. Esse é o mundo delas – enquanto elas estiverem vivas. A melancolia do anime e da minha escolha de palavras não é acidental: é o mono no aware, termo japonês que descreve a sensação de consciência da impermanência de todas as coisas. É um lamento respeitoso, triste, mas não trágico ou desesperado, pelo que já se foi. Uma alegria contida por aquilo ter sido em primeiro lugar. E uma esperança realista pelo que está para ser.
Eu achei por bem mencionar Shouwa Genroku Rakugo Shinjuu porque é uma história sobre pessoas com dificuldade para superar o passado, sacudidas por um estranho que aparece para mudar a vida de todo mundo porque ele quer mudar a história da própria vida. O anime acompanha as vidas de gerações inteiras. Isso é mono no aware. E eu também sinto mono no aware ao me lembrar nostalgicamente de bons animes, como Rakugo Shinjuu – e fico pasmo ao me lembrar que sua segunda temporada foi ainda nesse ano de 2017! Parece ter sido há tanto tempo.
Chito e Yuuri obviamente são novas demais ainda para compreender completamente esse conceito. Ou melhor, seriam, se vivessem em nosso mundo, em nosso tempo. A vida delas é uma eterna impermanência, não podem sequer ficar por muito tempo em um só lugar, estão sempre em movimento e sempre indo para lugares novos e desconhecidos. Assim, não é de se espantar que a Yuuri já esteja começando a se esquecer de quem ela conheceu há poucos meses, ainda que encontrar outras pessoas seja um fenômeno tão raro na vida delas que seria de se esperar que imprimisse memórias mais duradouras. Chito, a literada, logo trata de fazer Yuuri se lembrar de Kanazawa e ensina a ela a importância da memória. Inclusive a importância de memórias que nem são delas – o cemitério. Mono no aware.
E logo elas próprias precisam partir de novo. Para outro lugar que não conhecem, que nunca viram. O caminho difícil, entediante, perigoso, deixa Chito inquieta. Mas elas não têm opção senão continuar. Quero dizer, poderiam voltar para baixo, mas… poderiam mesmo? Desde que elas começaram a subir, essa é a motivação primordial delas. Sem um motivo realmente muito bom para desistir de subir, o que elas ganhariam recuando dessa vez? Se realmente não houvesse caminho ok, não tem jeito, becos sem saída também fazem parte da vida, mas não foi o caso. E daí foi a vez da Yuuri ensinar algo para a Chito:
Como você pode viver se estiver com medo de morrer? Ishii com certeza não estava com medo de morrer quando construiu seu avião e decolou com ele pelos ares. Kanazawa não tinha medo da morte, o que ele tinha medo era de viver sem um senso de propósito – e foi a Yuuri quem o ajudou a recuperá-lo! O kettenkrad se move com a Chito olhando para frente e a Yuuri para trás, mas no modo de pensar é a Yuuri quem sempre está olhando para frente e a Chito para trás. E não há nada de errado nisso, já que ambos são necessários, são partes do ciclo da vida. A passagem das estações, a repetição dos dias das garotas, as voltas do caminho dentro da coluna, são todos eventos cíclicos que ao voltar ao mesmo lugar, estão um pouco acima. Um pouco diferentes. Mono no aware.
E é com a coragem de buscar o futuro e com a reverência ao passado que o melhor presente possível é construído. O passado e o futuro são importantes, mas ainda é no presente que vivemos, nunca é demais lembrar disso. No caso de Yuuri e Chito, o presente delas, pelo menos nessa noite de lua cheia, foi literalmente um presente. Dançaram embriagadas, abençoadas pela luz da Lua, celebrando o momento mais importante da vida delas: o agora. E com a pessoa mais importante de todas: uma a outra.
James Mays
Foi um excelente capitulo a serie lembra um pouco aquele filme “Inferno no Pacifico”…