Game of Laplace – ep 3 – O homem do saco
[sc:review nota=4]
Com todo mundo na Anime Friends, na Fest Comix (São Paulo) ou na SANA (Fortaleza), prevejo que ninguém irá ler esse artigo hoje. Aliás, nem preciso fingir ter capacidades dedutórias como o Kobayashi para isso: ontem (sexta-feira) esses eventos todos já estavam acontecendo e embora sexta-feira seja dia de evento mais fraco, mesmo assim o anime21 sofreu (e isso mesmo com não apenas um, mas dois artigos novos publicados).
Mas não é por algo tão pequeno quanto “ninguém vai ler mesmo e já são 4 da manhã e eu próprio pretendo ir à Fest Comix quando acordar” que eu vou me abalar e deixar de escrever sobre um dos melhores animes da temporada! O episódio dessa semana foi um pouco menos convencional do que o esperado mas foi um soco no estômago, não foi?
Sequestros de menininhas. Quem é que não fica revoltado quando as vítimas são crianças? É simplesmente instinto humano querer proteger crianças. Não só humano: instinto animal mesmo. A sensação de raiva que se segue quando descobrimos alguém que teve a audácia de ferir crianças é consequência também instintiva: se o homem primitivo permitisse em seu meio assassinos de crianças, seus descendentes não teriam sobrevivido e eu não estaria assistindo Game of Laplace hoje. Quem não queria ter visto aquele gordo apanhar mais? Muito mais?
A raiva tira o melhor de nós nessas horas, e por isso temos instituições impessoais, incapazes de ter sentimentos ou instintos. Acredito que o Homem Sombra teria matado o vilão do episódio se pudesse, mas o gordo era quase o Blob dos X-Men e parecia impossível feri-lo com golpes. Akechi chegou em seguida e provou que ele era só um gordo, não um gordo mutante, e que era possível sim sangrá-lo e derrubá-lo. Mas ele não estava ali para matar, só para ajudar a polícia, uma dessas instituições impessoais, a cumprir seu dever. Até aí tudo normal.
“É melhor correr o risco de salvar um homem culpado do que condenar um inocente”. Esse é um conceito de justiça e uma frase, parece, de Voltaire, que aprendi hoje em um contexto totalmente diverso da minha prática querida de assistir animes mas que acabou vindo à calhar para escrever esse artigo. Também é algo com o que não posso senão concordar – de fato, já concordava antes mesmo de saber que havia sido dito por pensador tão importante e é usada frequentemente em julgamentos reais em toda parte do mundo civilizado. O problema é que, por impessoal, é muito mais difícil provar a culpa (ou dolo, ou provar qualquer coisa na verdade) diante de um tribunal. As leis para definir o que é “prova” são bastante rígidas justamente para proteger inocentes (e não imputáveis, como crianças e outros indivíduos sem plena consciência e controle de seus atos, embora os detalhes dessas leis variem de país para país). Isso fatalmente ocasiona indignações diversas no mundo real bem como é um elemento dileto da ficção que lida com crimes. De detetives do século 19 aos super-heróis americanos do século 21, é um tema frequente a frustração de não conseguir manter um criminoso preso porque as leis, na incerteza, o protegem, bem como o desespero de ver tal criminoso voltar a delinquir depois de solto.
Esse episódio reuniu todo isso: um criminoso cruel, desumano, que embora já houvesse delinquido e sido preso acabou solto porque considerado inimputável voltou a delinquir. E o alvo de sua maldade são meninas. Como o Homem Sombra, assistimos impotentes à parede onde jazem os restos mortais de crianças que tinham um futuro inteiro pela frente mas deram o azar de cruzar o caminho desse monstro escorregadio que já havia escapado uma vez das mãos da Justiça. O que podemos fazer além de chorar e torcer para que dessa vez ele continue preso?
Mudando de assunto, o tema do episódio foi forte mas acho que já esgotei o que havia para falar dele por enquanto. Então agora vou tratar de sua estrutura. O caso foi resolvido em apenas um episódio, e basicamente se resolveu sozinho: o Homem Sombra já sabia como atrair o criminoso, só precisava de uma isca. E nosso detetive Kobayashi nesse episódio foi só isso: uma isca. Além da história terrível que foi revelada sobre o sequestrador e seus crimes, houve o drama pessoal do Homem Sombra. E se o episódio destacou parte de seu tempo para contar tudo isso me parece certo que essa não foi a última vez que o veremos. Que papel ele desempenhará? Pode se tornar um auxiliar eventual do Kobayashi, um suspeito ou mesmo um criminoso. Talvez um pouco de tudo. A função desse episódio foi apresentar o Homem Sombra. Além de partir nossos corações com a história da Sachiko.