Death Note: Another Note – O Caso dos Assassinatos em Los Angeles é um spin-off, que pode ser tido como um prólogo para o mangá e anime, da aclamada obra Death Note, de autoria da dupla Tsugumi Oba, história; e Takeshi Obata, ilustrações.

A light novel tem a escrita do também aclamado Nisio Isin – autor de obras como a série Monogatari e Medaka Box – e foi lançada pela editora JBC por aqui. Só é indicável a leitura para quem conhece Death Note? De modo algum. Another Note é uma excelente trama de mistério que acertou em um dos pontos no qual o original mais errou. É a vez de L e Naomi!

Death Note é uma franquia mundialmente famosa que dispensa apresentações, mas caso você não a conheça em nenhum nível, não é problema, pois o livro envolve uma personagem secundária da obra original em uma investigação a mando de L – um dos protagonistas da série –, e contextualiza os fatos ocorridos anos depois, mas não se estende neles.

A história é narrada do ponto de vista de M – Melo –, um personagem relacionado a L, e relata a resolução de um caso de assassinatos em série em que L coopera com Naomi Misora, agente do FBI que tem uma breve participação no original.

L é o maior investigador do mundo e em Death Note ele se encarrega de investigar e prender Kira, assassino que mata as pessoas usando um “caderno da morte”. Mas essa não é a história do Kira e sim a história do L, e não só dele, pois pela primeira vez na franquia uma mulher dividiu o protagonismo. Diria até que o tomou para si e fez um uso muito bom, afinal, é Naomi Misora que torna a trama interessante.

Não que qualquer coisa que um personagem icônico como o L faça não seja interessante, mas há um certo distanciamento dele e do caso dos assassinatos, mesmo este sendo um desafio a ele; o que não tira o brilho do personagem em momentos pontuais, mas não o explora tanto.

A narrativa realmente vale a pena é pela Naomi e por outro personagem que atua ao seu lado, só que, antes de comentar a história, preciso deixar claro que ao longo dos capítulos alguns spoilers são dados – como o desfecho de alguns personagens, entre outras ocorrências – e escrever sobre essa light novel sem dar spoilers cruciais dela é praticamente impossível, então indico que leia o livro antes de ler o artigo ou que faça isso só depois apenas se não se importar com spoilers – os quais podem prejudicar seu divertimento.

Naomi Misora é uma investigadora do FBI cujo erro em uma missão a levou a um afastamento e uma reflexão sobre a sua profissão – se realmente era adequada para o trabalho. Esse começo fez parecer que a trama seria centrada em uma mulher frágil e amargurada, mas é esse o primeiro acerto de Isin, pois a personagem tem personalidade e é humanizada, tendo força para enfrentar os problemas que aparecem em seu caminho; como o pedido de ajuda do maior detetive do século para investigar uma série de assassinatos na cidade em que a agente reside, Los Angeles.

É anormal que L se envolva sem um bom motivo e desde o começo fica claro que o assassino é alguém ligado ao seu passado. Beyond Birthday – ou B.B. – é uma das crianças prodígio que foram lapidadas na Wammy’s House, mesmo lar que formou L para ser o monstro que ele é. Melo e Near – M e N – também vêm desse lugar e, sendo assim, o desafio estabelecido é a resolução do caso e a captura de B.B. Para tanto, Naomi é essencial, afinal, ela é os olhos e ouvidos de L. Mas claro, precisa mostrar suas habilidades para resolver o caso.

L aparece apenas por meio de ligações, mas não trata Naomi apenas como um avatar seu e sim como alguém que tem toda liberdade para questionar e propor coisas baseadas em suas próprias deduções e instintos. É como se o L fosse aquele que fornece os recursos, mas o resultado depende do trabalho dela – e ele é excelente mesmo com a ajudinha de Luee Ryuzaki para o sucesso da linha de raciocínio.

Confesso que da primeira vez em que li, pensava que o Ryuzaki era o L interagindo com a Naomi a fim de testar as capacidades dela. Demorou até que me desse conta que ele só poderia ser o assassino, e só não lamento minha tolice porque isso fez com que eu não esperasse por aquele final mesmo com tudo apontando para ele o tempo inteiro.

Reli o livro para escrever o artigo e me espantou como não prestei atenção nos detalhes que denunciavam a cara de pau do Beyond, e o jogo de indução que ele armou para fazer a agente ir destrinchando os enigmas que ele deixou para trás. Porém, ser capaz de raciocinar como ela raciocinou também foi sim mérito dela, o melhor possível para alguém que não é cotada como um talento nato. Questiono ela ter deixado de lado as suspeitas dele tão rápido. O que, dada a figura estranha dele e seu envolvimento misterioso com a investigação, não fez tanto sentido.

Apesar dele ter cometido apenas um erro no final, houveram outras oportunidades nas quais Beyond poderia ter sido, senão descoberto, ao menos incomodado. Não acho que isso diminua as conquistas da Naomi enquanto detetive de improviso, mas teria sido mais sensato ver maiores dúvidas da parte dela.

Aliás, há algo interessante a observar sobre o “vilão”, sua condição de visão sobrenatural e sua total consciência dos casos não desqualificam todo o seu potencial para a investigação criminal, mas não é como se ele fosse mesmo capaz de vencer o L justamente porque toda a situação estava sob o seu controle.

Em nenhum momento Ryuzaki se sente desafiado – ele vislumbrou tanto a tortura que desejava impor ao L que se esqueceu das capacidades da agente próxima a ele. Subestimar os outros é um erro que gênios comumente cometem, e não foi diferente dessa vez. Só que mesmo assim seria leviano da minha parte afirmar que ele perdeu para si próprio, e também que ele perdeu só para o L.

Naomi Misora é como muitas pessoas com as quais você já deve ter topado na vida – se duvidar você e eu somos bem parecidos com ela –, alguém que faz parte de algo grande, mas não luta exatamente por um ideal, alguém que não tem um senso de dever e um objetivo definido pelo qual vale dar tudo de si.

Além disso, ela se questiona sobre a natureza dos seus atos ao lidar com as mortes e as vítimas, ela é capaz de se imaginar no lugar de outro alguém, e questiona a justiça que está sendo promovida. Esses aspectos de sua personalidade somados às suas atitudes são imprescindíveis para caracterizar a personagem, para humanizá-la, fazendo com que se torne muito mais fácil ver ali um ser humano.

Não é porque ela é policial em uma história voltada para o público infanto-juvenil que ela precisa ser uma super-heroína, mas isso também não quer dizer que ela não pode ser forte apesar de frágil, que uma coisa anula a outra. É perfeitamente normal e coerente que ela tenha suas inseguranças, a dose de insensatez inerente a todo ser humano, e mesmo assim consiga brilhar nas horas mais relevantes.

E não, Another Note não é uma obra feminista, longe disso. Mas, de certa forma, ela faz “justiça” em uma franquia na qual todas as mulheres que deram as caras antes foram subutilizadas – como se não pudessem haver mulheres inteligentes, somente homens. Ela mesma, na série original, morre de uma maneira tão boba que parece incompatível com a personagem desse livro.

Há uma diferença no jeito como os autores do mangá e dessa light novel aproveitam a figura da mulher no meio investigativo e isso é algo que não poderia deixar de destacar aqui. Naomi Misora é inteligente, tem um bom caráter e é corajosa; é uma mulher forte que não apenas dançou na mão de alguém, mas foi capaz de ter um resultado positivo, uma vitória por si mesma.

É verdade que o B.B. cometeu um erro ao ter revelado que sabia que ela praticava capoeira, mas a reflexão dela sobre seu ideal de justiça, assim como a sua percepção de outros detalhes imprescindíveis para resolver o mistério que cercava o caso, foram sim méritos dela enquanto personagem. Uma excelente, diga-se de passagem. É, mulher em Death Note pode ser capaz de grandes feitos sem depender de um homem e nem fazer isso por ele.

Misora lutou pela justiça, mas não a justiça das teorias e das falácias, mas sim a justiça do instinto, da bondade, do amor. A mesma justiça que o L deixou claro que buscava proteger em todos os seus atos. É belo falar em justiça sem se envolver diretamente e arriscar a própria pele, claro, mas não é como se o famoso detetive ficasse apenas nisso.

Tanto no anime quanto na outra light novel (L Change the WorLd), nós podemos ver L investigando com toda sua audácia e genialidade, arriscando-se de corpo e alma para defender a justiça em que acredita. Se você ainda não leu o mangá ou assistiu o anime da franquia é mais que indicado que faça isso não só pelo conflito moral pertinente que é abordado, mas também pelo carisma e grandeza de um personagem como o L.

O outro livro – também lançado aqui no Brasil pela editora JBC – só reforça minha admiração pelo personagem e, eventualmente, devo comentá-lo por aqui. Despeço-me ciente de que pouco elogiei a formidável escrita de Isin, mas com a certeza de que comentei os pontos mais importantes desse livro e não poderia indicar menos que você o lesse!

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