Que frase de efeito bonita a do título desse artigo, não é? Bastou fazer uma série de conexões livres a partir desse episódio para chegar nisso. Faz sentido? Faz sim. Será que tem a ver com o que Joker Game quer dizer? Bom, a mensagem está lá, disso não tenho dúvida, e tenho quase certeza que é proposital. Se é a principal mensagem do anime eu não sei. Seria bom se fosse porque aumentaria a chance de Joker Game emplacar uma história menos episódica e que eu conseguisse acompanhar melhor, e que tornasse seus personagens mais fáceis de se apegar.

Talvez seja esperar demais só por ter aparecido uma metáfora mais bonitinha. O que Joker Game disse literalmente foi que, uma vez começada a guerra, os serviços de inteligência do governo (espionagem) se tornam inúteis pois são sumariamente ignorados quando descobrem coisas inconvenientes para a máquina de guerra, que só quer saber de se auto-justificar mais e mais.

E nem foi a história do episódio que chegou a isso dessa vez, como no exemplo do belíssimo primeiro arco, ou mesmo a história dos episódios 3 e 4. Foi apenas um comentário solto no final do episódio, após cumprida a missão. Um desabafo. Se me permite um desabafo, acho Joker Game fascinante, mas não é o tipo de anime que me deixa ansioso pelo próximo episódio. Eu não sei o que está acontecendo, eu não sei o que vai acontecer, eu não sei o que esperar, eu sequer conheço os personagens. Mas cada episódio sozinho é fechado e em si muito interessante tanto no jogo de espionagem que ele propõe quanto no retrato (e na crítica) da época que ele faz.

Esse episódio se passa em um trem na Manchúria, região da China que foi invadida pelo Japão e não sei agora se na época exata do episódio constituía um governo à parte (o Japão chegou a instalar um estado-marionete na Manchúria durante a guerra) ou se já havia sido reunido ao resto da China. Bom, esse detalhe é completamente irrelevante porque a história envolve japoneses e soviéticos, nenhum chinês. Quero dizer, os garotos talvez fossem chineses? Mas para os propósitos do episódio eles faziam parte do cenário. Foram usados pelo espião japonês como armas contra o assassino soviético sim, mas são armas no mesmo sentido que pegar uma cadeira na sala e arremessar contra o inimigo também é uma arma. Foi um improviso. Foram eles porque eles é que estavam ali. Eles em si não importam – tanto não importam que, se for pensar direito, o espião colocou-os em situação de grave risco mas nem por um segundo se importou.

Eu estava esperando que os kabanes atacassem...

Eu estava esperando que os kabanes atacassem…

Um diplomata soviético estava tendo um caso com uma dançarina igualmente soviética e os japoneses descobriram e acobertaram isso. Porque exatamente ele não poderia ter esse caso eu não sei, mas foi a chantagem feita. O episódio pede que apenas aceitemos que a União Soviética era tão má que sequer permitiria que um seu diplomata estabelecesse relação romântica com uma artista também soviética. Bom, o país era bizarro em diversos aspectos, prefiro não duvidar, mas que é uma história complicada de simplesmente engolir, isso é.

O espião terceirizado encontra o assassino

O espião terceirizado encontra o assassino

Em dado momento a dançarina engravidou (foi o que deduzi) e o diplomata pediu ajuda aos japoneses para fugir. Fugir da Manchúria seria tão difícil? Nem na própria Rússia ele estava! Bem, talvez não fosse nem por isso, mas pelo dinheiro mesmo: ele precisava se sustentar e à sua nova família afinal, além de pagar eventuais custos de viagem. Tudo combinado, ele entregaria informações vitais para um agente japonês em um trem em troca de um montão de dinheiro, que ele usaria para fugir para os EUA, passando primeiro pelo Japão, junto com sua amada dançarina.

O problema é que ela não quis acompanhá-lo nessa dança. Suponho que tenha tido sua família ameaçada pelos soviéticos? Ou talvez fosse muito defensora dos valores comunistas mesmo, vai saber. O fato é que por causa disso ela traiu o diplomata, o entregou e tentou acobertar seu assassinato no trem. O espião conseguiu desvendar tudo, o que não é da conta dele que só queria as informações, mas ele aproveitou a boa oportunidade para chantagear a dançarina a se tornar uma agente dupla para o Japão. Viva, todos felizes!

A dançarina arrependida (??)

A dançarina arrependida (??)

As informações recebidas pareceram indicar como era péssima a ideia de guerrear contra a União Soviética, mas a essa altura os militares não queriam mais saber: primeiro a Sakalina, depois o mundo! Bom, historicamente eles pararam na Sakalina mesmo. Chegou a ser cogitada uma invasão por terra contra a União Soviética, sabia? Mas não apenas faltava capital humano para o Japão executar essa empreitada como a ideia era mesmo estúpida. Não havia muito a ganhar invadindo os ermos orientais da Rússia, mesmo se fossem bem sucedidos. A Agência D com certeza sabia de tudo isso. E avisou o Exército Imperial. O mesmo ocorreu no caso da aliança com a Alemanha, citada no episódio 3: a Agência D recomendou contra.

Agora o Exército Imperial está cansado da Agência D dizendo que tudo o que eles querem fazer é burrice e que se o país continuar acabarão com todos seus grandes centros urbanos arrasados, milhares de mortos, duas bombas atômicas, décadas de ocupação e animes moe. Decidiram criar sua própria Inteligência. Uma Inteligência que nunca diga que estão errados. Uma Inteligência que correrá o mundo para descobrir que o Japão está no caminho certo. Uma Inteligência que é tudo, menos inteligente.

Se não podem vencer o jogo, os militares decidem mudar as regras. Só esqueceram de combinar com os russos

Se não podem vencer o jogo, os militares decidem mudar as regras. Só esqueceram de combinar com os russos

  1. Algo interessante nessa questão da “falsa inteligência” é o papel então aferido à divindade do imperador. O fato de sua palavra ser tida como mais do que a de um mero mortal fazia com que várias informações sancionadas de propaganda não pudessem ser desmentidas. O que era um verdadeiro pesadelo para a logística e o esforço de guerra.

    A despeito disso, é interessante notar que Joker Game parece estar desviando dessa justificativa, implicando que o próprio complexo militar, corrupto, manipulava essa prerrogativa a seu bel-prazer. Vai ser legal ver como as coisas serão abordadas daqui para a frente, em especial se eles abandonarem a verve episódica.

    Confesso que a decepção do Tenente Coronel Yuuki também me lembrou a de outro contemporâneo: Alexandr Solzhenitsyn. No romance “No Primeiro Círculo” (ambientado em 1949), ele mostra o drama dos cientistas soviéticos – envolvidos em pesquisa de ponta para fazer frente aos EUA – diante da “ciência oficial” do stalinismo, completamente fantasiosa, que eram obrigados a defender publicamente sob pena de encarceramento no gulag.

    De fato, poucas coisas são mais dolorosas do que ter os olhos abertos em tempos de guerra (seja a Mundial, seja a Fria).

    • Fábio "Mexicano" Godoy

      A origem divina do poder do imperador foi instrumentalizada pelos militares, sem dúvida. E não estou querendo eximir o imperador de qualquer culpa, afinal haviam príncipes da família imperial no exército, um deles tendo inclusive sido um dos responsáveis pelo Estupro de Nanquim, enfim. Mas o Japão tem desde tempos imemoriais uma posição muito curiosa sobre o imperador, que só encontra eco em outros impérios igualmente duradouros durante a história, como egípcios e chineses (durante parte de suas histórias, não toda ela). Enquanto na Europa o comum era o rei guerreiro, mesmo quando o cristianismo cimentou a noção de origem divina do poder, no Japão a guerra era considerada um assunto “sujo” demais para o monarca. Isso foi uma característica que permitiu por exemplo os xogunatos, onde um general detinha o poder de fato sem que a casa imperial fosse tocada.

  2. Eu adorei esse trem, quase não prestei atenção a história!
    Em 1939, existir uma locomotiva a vapor tão aerodinâmica e fora do padrão maria-fumaça me surpreendeu!
    Fui procurar saber mais pelo Google e acabei descobrindo umas coisas:
    – após a guerra ela continuou funcionando até os anos 1980!
    – ainda existe uma num museu ferroviário!
    – praticamente foi um embrião dos trens-bala japoneses!
    É de admirar que o “homem Mao” não mandou destruir esses trens japoneses!
    Encontrei informações na Wikipedia: https://en.wikipedia.org/wiki/Asia_Express
    Mas gostei mais deste blog: http://www.dieselpunks.org/profiles/blogs/sunday-streamline-24

      • Bem no início, mostram o abastecimento com carvão e a fornalha acesa!
        Mas como japoneses adoram trens!
        Além dos animes, minha distração é assistir aos vídeos que eles postam no YouTube, eles até filmam horas só com trens passando em cruzamentos com ruas. É impressionante a variedade, deve haver mais modelos de trens que de carros lá!
        Obrigado pela dica, já conhecia, de vez em quando, dou uma olhada.

      • Fábio "Mexicano" Godoy

        Sim, os japoneses são fascinados por trens. Não me animo tanto ficar assistindo vídeos, mas gosto de me informar sobre infraestrutura ferroviária para passageiros (e alguns assuntos relacionados), por isso já fui usuário desse fórum. Hoje apenas o leio (diariamente).

  3. Não tenho muito acrescentar depois de ler os comentários e o review =P Apenas uma bobagem,acho que só posso dizer que os personagens tem traços muito semelhantes e as vezes não consigo diferenciar um do outro. Exemplo,sabe aquele episodio que tinha os garotos travestis,na cena que o oficial flagra o cara lá , eu achava que o garoto travestido super parecido com um dos espiões. Isso é uma das coisas que me incomodam.

    • Fábio "Mexicano" Godoy

      Eu também achei isso, e daí nada na história fazia sentido e eu simplesmente apaguei essa informação ao longo do episódio. Depois eu ainda demorei para entender que tinha sido o lady boy que havia assassinado o policial militar e por isso ele havia sido morto.

  4. Parece que sou o único aqui que gosta de animes e trens…
    :/
    Então, agora, vou comentar o episódio.
    Mexicano, você entendeu errado uma coisa, os meninos são japoneses, justamente a mãe deles se destaca no cenário por estar vestida com roupas tradicionais! E o filho mais velho ainda comenta com o espião que o pai deles trabalha na companhia ferroviária e por isso sabe muito sobre o trem. Aliás, mais uma curiosidade, a companhia e os trens eram japoneses e suponho que, pelo contexto da época, chineses não trabalhavam nela, ainda mais sendo um trem de luxo de longa distância.
    Esse espião foi como aquele do episódio 3 na França, não hesitou em usar alguém para atingir seu propósito, ainda bem que deu tudo certo, mas fiquei preocupado quando o japinha amarelou e correu quase deixando o irmão para trás.

    A russa me deixou confuso, ela era dançarina numa boate em Harbin, então ela tinha fugido do seu país ou era uma espiã com a missão de seduzir seu compatriota e vigiá-lo sem que ele soubesse. Mas se era uma espiã, para que precisava de um colega em vez de matar o traidor sozinha quando estivessem a sós?
    Claro, estou ignorando o que os roteiristas preferiram, mas eles poderiam ter sido mais claros sobre as motivações da russa.

    • Fábio "Mexicano" Godoy

      Ah, eu não “entendi” que eles eram chineses, eu só não me importei nem um pouco mesmo. No lugar onde corria o trem, eles poderiam ser chineses, foi o que eu quis dizer.

      Sobre a dançarina, o rosto de pesar nela quando descoberta me faz pensar que, mesmo se espiã de verdade, ela tenha em algum momento gostado do diplomata e foi de fato forçada a matá-lo.

      Mas no geral, sim, em vários episódios Joker Game tem sido muito lacônico sobre a caracterização dos personagens.

      Obrigado pela visita e pelo comentário =)

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