Violet Evergarden – ep 4 – Garota do interior
Bom dia!
Nessa semana, em Violet Evergarden, a Iris finalmente recebeu seu primeiro pedido de trabalho nominal! Ou será que não? Bom, de todo modo ainda não foi a vez da Violet, depois de se formar. Ou não deveria ter sido pelo menos.
Um cenário familiar, uma história comum, e algo que liga a Iris e a Violet e que a ajudou a ficar mais perto de descobrir o significado de “Eu te amo!”.
A Iris veio do interior para a cidade grande. Eu já nasci na cidade grande então não posso dizer que entendo como ela se sente, mas já vi muita gente que fez essa mudança, o suficiente para ter uma boa ideia de como e porque acontece e dos conflitos que pode causar. O cenário de Violet Evergarden é vitoriano, e seu país fictício é estilo europeu (muito provavelmente inspirado no Reino Unido – tem até uma Câmara dos Lordes e uma Câmara dos Comuns -, embora não pareça ser insular). E lá pessoas como a Iris vão do interior para a cidade grande. No Japão isso também acontece – sem apelar para estatísticas demográficas oficiais, apenas note que temas como “mudar-se para Tóquio” ou o “esvaziamento do campo” são comuns em animes. Aqui no Brasil isso também é comum, talvez você mesmo ou a sua família estejam nessa situação, ou talvez conheça alguém que esteja.
Quando eu estudei na USP era notável a quantidade de pessoas, garotos e garotas, gente nova como a Iris, que se mudavam sozinhos do interior para estudar e, muito provavelmente, a maioria planejava estabelecer-se aqui na “cidade grande”. Outras tantas pessoas mudam-se para cá por outros motivos, em outras circunstâncias, sozinhos ou com a família. E certamente essa não é uma exclusividade de São Paulo. Quero dizer: esse é um cenário tão, tão comum, que o anime nem precisa se preocupar em explicar nada. A Iris saiu do interior e foi seguir carreira como Doll na cidade grande. Isso é tudo o que precisamos para entender ela.
Como é comum a pessoas nessa situação, a distância que se formou entre a migrante e sua família criou ou exacerbou problemas de comunicação – e comunicação é um dos temas do anime! De cara é possível perceber o quanto a Iris é insegura (ainda mais do que aparentava no trabalho até então), as mentiras que conta para sua família, as expectativas que ela tem para seu futuro, as expectativas de seus pais, enfim. Com muito pouco esforço, graças à escolha cuidadosa do cenário e do contexto, o episódio escancarou uma série de conflitos existentes ou potenciais.
Como dizem por aí, a fruta não cai longe da árvore. A Iris não diz o que pensa e sente de verdade nem conta seus reais motivos, e ficou claro que ela puxou isso (bem como o pavio-curto) de sua mãe. Faça o seguinte exercício mental: tivesse Iris contado para sua mãe anos atrás o motivo pelo qual partiu de sua cidade natal (o coração partido), e se fosse essa a única coisa que aconteceu de diferente em toda sua história pessoal, esse episódio sequer existiria. Sua mãe entenderia a sua circunstância, e mesmo que ainda se preocupasse com ela a ponto de mentir para dar-lhe uma festa de aniversário com a intenção pouco velada de tentar arranjar-lhe um marido, pelo menos não teria convidado certo rapaz. A festa aconteceria normalmente, a Iris estaria mais ou menos desconfortável mas não explodiria. Fim. E essa é só a primeira pequena coisa que, tivesse acontecido diferente, todo o drama desse episódio teria sido evitado.
Depois da partida da Iris para a cidade grande para se dedicar a seu novo sonho, seu novo projeto de vida, não faltaram oportunidades para ela esclarecer as coisas com sua família. Um dia ela simplesmente resolveu ir embora, como seus pais deveriam entender aquilo? A eles certamente pareceu puro capricho de sua filha única. Da mesma forma que ela foi fácil, ela poderia voltar fácil, pois. Mas basta observar só um pouco a mãe da garota que passa a parecer razoável supor que a vida toda ela própria escondeu seus próprios sentimentos e pensamentos embaixo de mentiras inofensivas, e a Iris aprendeu esse comportamento com ela. Ora, ela não queria preocupar seus pais! Ela estava bem! Quando não estava, queria conseguir ficar bem de volta sozinha! E se contasse, o que eles pensariam? Como reagiriam? Será que iriam ajudar ou atrapalhar? Melhor não preocupar os pais para não precisar se preocupar.
É nesse contexto de mentiras e meias verdades que deterioraram uma relação a um ponto crítico que entra a sinceridade bruta da protagonista. Até certo ponto do episódio, a Violet só fez piorar a situação, como quem joga gasolina na fogueira (e ela, sendo a Violet, nem estava tentando apagar o fogo). Mas o que explodiu agora em parte por causa da Violet teria, cedo ou tarde, explodido sozinho. Simplesmente era assim que funcionava a dinâmica do relacionamento entre mãe e filha. No final do episódio a Violet aprendeu um pouco sobre a Iris, e aprendendo sobre a Iris, aprendeu mais um pouco sobre sentimentos – muito especialmente, sobre a coragem necessária para se dizer “Eu te amo!” sem saber o que o outro sente.
Mas antes de chegar nesse ponto, foi interessante notar como a Violet mais de uma vez mostrou, de forma sutil, frustração por ser incapaz de entender sentimentos – e consequentemente causar mal-entendidos com suas cartas. Ela realmente achou que já conseguisse entender melhor, mas tudo o que aprendeu na escola de dolls foi como escutar as outras pessoas. Ela sabe, ainda não muito bem mas muito melhor do que no começo do anime, entender sentimentos transmitidos através de palavras diretas, objetivas. Mas qualquer tentativa de falar de forma indireta com ela vai causar desastre. Linguagem não verbal então é absolutamente alienígena para a protagonista.
Quando não restou mais nada para a Iris que não ser honesta e direta sobre seus sentimentos, a Violet conseguiu entendê-la e fazer o seu trabalho. Claro que ainda haverá quem possa dizer que as cartas que a Violet escreve continuam sendo basicamente ditadas, por causa dessa necessidade de ser objetivo ao falar com ela, mas não se deve ignorar que, nesse episódio mais do que no anterior, ela deixou claro que ela está começando a entender os sentimentos das pessoas. Quando elas são diretas, claro, mas ela verdadeiramente entende, não está apenas escrevendo mecanicamente aquilo que lhe dizem. Violet está aprendendo e crescendo.