Jashin-chan Dropkick – ep 4 – Lolis sádicas, lolis masoquistas
Para o bem ou para o mal, os melhores momentos de Jashin-chan Dropkick estão na constante sequência trollagem/exploração – rompimento – reconciliação – cenas de amor e amizade que envolve Jashin-chan e Medusa. O positivo nesta repetição é que características e sentimentos se reforçam e possibilitam entender melhor as personagens. Porém, o que há de negativo nesta repetição é justamente a repetição, que, em decorrência da relação entre elas não ser o plot da série, pode-se tornar uma muleta involuntária ou provocar fastio. O episódio 4 de Jashin-chan Dropkick, no geral, chega a apresentar alguma graça, mas a falta de um prólogo começa a pesar.
Outro problema é Yurine, que tem pouco destaque e força como protagonista. Muito disso se deve precisamente à ausência do prólogo. A invocação de Jashin-chan é fundamental para o desenvolvimento de Yurine, que é extremamente cruel com a loira-serpente, mas demonstra simpatia pelas outras personagens. Excetuando o fato de ser uma loli gothic e uma psicopata de primeira com Jashin, pouco foi apresentado sobre ela.
Ainda em relação à supressão do prólogo, a existência de demônios entre os humanos não provocar choque ou temor resulta estranho. E como não há menção alguma do motivo de algo extraordinário ser tratado com naturalidade, torna-se admissível colocar em dúvida os poderes dos seres sobrenaturais e de Yurine como invocadora. Se não há conflito entre mundos distintos ou vantagem em ter domínio sobre um demônio, por quais razões Yurine traz do submundo as criaturas?
O episódio começa com Jashin-chan passeando por Akihabara. Ela quer completar sua coleção de bonecos de plástico obtidos nas máquinas de Gachopon. Faltando um para reunir todos da série, a demônio teme os castigos de Yurine caso gaste dinheiro em ninharias. Para obter o boneco, ela apela: engana um menino que consegue superar a máquina e coloca o boneco dentro da boca, deixando-o todo salivado. O resultado de sua manobra é a conquista do brinquedo e um soco que ela recebe na ponta do queixo.
Em seguida, o anime apresenta uma nova personagem, a policial Mei Tachibana (mesmo nome da protagonista de Sukitte Ii na yo. [2012]), que prende Jashin pelo simples motivo de ter se encantado por ela e querê-la para si. A princípio, Yurine concorda, mas, ao perceber que não terá ninguém para bancar a empregada, ela não permite que Mei fique com a demônio. Então, descobrimos que a policial é uma yandere, já que a recusa de loli a faz tentar matar Jashin-chan no melhor estilo “Se ela não será minha, não será de mais ninguém”. Se a frieza de Yurine, é brutal, o amor de Mei não ficará para trás. Um yuri yandere para infligir mais sofrimento ao corpo de Jashin-chan.
A agressão do menino, a aparição de Mei, com sua paixão doentia, e os bárbaros castigos de Yurine passam a impressão de uma fetichização da violência (o anime é isso, comédia e perversidade), imposto a um corpo que sofre, é reduzido a uma massa de carne e poça de sangue, mas é imortal, por isso mesmo passível de toda e qualquer selvageria. Jashin é a única vítima de violência física (e Pekora por parte da Jashin), e como ela é intragável (e engraçada), exploradora e trapaceira, os sucessivos assassinatos, atentados e surras que contra ela são realizados estão autorizados. Jashin-chan é o saco de pancada oficial. E nada é tão despropositado e terrível na série quanto o soco que Jashin leva do garoto em Akihabara, que, além de tudo, está fora da dinâmica “Jashin tenta matar Yurine, que retalha”.
Na segunda parte do episódio, temos Jashin-chan fantasiando com formas de eliminar Yurine, logo após a loli se recusar a atender um pedido seu: o de cometer suicídio. A sequência é engraçada, com a imaginação da loira-serpente sendo levada para as montanhas. Jashin-chan, apesar de sua presunção, de ser uma aproveitadora e, às vezes, maldosa, com Yurine, ela é ingênua e parece sempre indefesa. Seu plano naufraga quando a sua “mestra” se recusa a viajar para as montanhas. Como a adaptação dispensou os primeiros capítulos do mangá, novamente a pergunta que não quer calar, já que não temos o supracitado prólogo: por que Yurine invocou Jashin-chan? Quais os poderes da loira-serpente? Trata-se de um engano clamoroso da jovem bruxa?
No terceiro segmento, Jashin-chan prega uma peça cruel em Medusa. Uma brincadeira que realmente passa dos limites. A sequência resume a relação entre elas, que vai de um ato atroz ao infalível perdão, com Jashin encenando sua morte, aproveitando a sua troca de pele que ocorre de cem em cem anos e Medusa ativando o seu modo passiva-agressiva (outro evento secular), com a tristeza e a revolta que sente com a brincadeira. Sentindo que o rompimento da amizade realmente pode se efetivar, Jashin é sincera em seu choro e pedido de desculpas. E Medusa já havia absolvido e sido clemente antes da loira-serpente manifestar seu arrependimento. A dinâmica entre elas funciona nesse esquema montado para essa estranha de exploração e apego afetivo, manipulação e dependência emocional. Mil anos de conhecimento.
No vínculo com Medusa que Jashin encontra amor. De algum modo, é um alívio concedido à personagem pelas torturas ao longo do episódio. Medusa é como um suporte emocional, que sabe que a arrogância de Jashin tenta disfarçar suas fragilidades.
Algo interessante no episódio é a metalinguagem presente no mini esquete com Jashin e Minos, na conversa sobre o apartamento de Yurine ser o centro dos encontros e que uma mudança de cenário seria ótima, e então elas são transportadas para outros ambientes. A série havia deixado de lado a “quebra da quarta parede” e mesmo a metalinguagem. Essa retomada mostra que pode oferecer mais ritmo à série, que muitas vezes carece de timing, aproximando-se da faixa do aborrecimento. E sobre Minos, que acompanha o “cachorro” de Yurine, Beth (que é a Besta de Gévaudan, um animal que aterrorizou a antiga província de Gévaudan, em meados do século XVIII. Mais uma fera invocada por Yurine. Como? Quando? Por quê?) em um belo uivo, permanece subaproveitada.
O quarto episódio de Jashin-chan Dropkick denuncia a necessidade de alguma inserção sobre a vida pregressa das personagens para que haja um envolvimento maior com elas, para que não sejam reduzidas a uma característica específica, já que a tipificação é um risco quando se deseja que ocorra o mínimo de identificação com os protagonistas (e mesmo os secundários em cena). Além disso, um humor mais vibrante em que a violência não seja um tipo de punição exercida a uma personagem (e se torne aceitável ou desejável pela forma como o espectador(a) venha a julgá-la).