Bakumatsu – Primeiras impressões
O período Bakumatsu refere-se à última década e meia do shogunato Tokugawa (uma ditadura feudal, que durou de 1603 a 1868, também conhecida como Era Edo, por ser a cidade-sede do governo), sendo os episódios inaugural e de desfecho, a visita do Comodoro Perry em 1853 ao Japão e a Restauração Meiji de 1868, respectivamente.
Há um longa-metragem de 1970 que cobre esse momento da história japonesa: Bakumatsu acompanha Ryoma Sakamoto, líder do movimento que levou a queda o shogunato Tokugawa. O filme é dirigido por Daisuke Itô e estrelado por três dos mais consagradores atores do Japão: Kinnosuke Nakamura, Toshirô Mifune e Tatsuya Nakadai.
Obviamente, Bakumatsu, o anime que chega nesta temporada de outono, não é baseado no filme, mas uma adaptação do otome game Renai Bakumatsu Kareshi, lançado em 2017. A série é do estúdio Deen (Shouwa Genroku Rakugo Shinjuu [2016]) e dirigida por Masaki Watanabe (Seikaisuru Kado [2017]), com roteiro de Masahiro Yokotani (Re:Zero [2016]).
O preâmbulo nos conduz a uma amarga constatação: Bakumatsu é uma mistura de gêneros, com um primeiro episódio confuso e repleto de personagens, que não desperta interesse pelo seu contexto e que decepciona ao considerarmos os nomes dos envolvidos no projeto.
No final do período Edo, os clãs lutam para encontrar uma relíquia, um relógio de bolso que tem o poder de manipular o tempo. Shinsaku Takasugi e Kogorou Katsura, samurais leais ao clã Choshu, estão atrás do artefato e conseguem roubá-lo de um navio (que gera pouco entusiasmo em relação à ação do anime). Porém, durante a perseguição dos seus inimigos, uma ninja obtém sucesso em sua investida surpresa e passa a ter posse do relógio.
Acreditando que a ordem tenha sido dada pelo Castelo de Nijo, sede do governo, em Kyoto, os amigos invadem o local, mas não encontram a relíquia. Contudo se deparam com um misterioso homem em um quarto, que tem os quatro membros e o pescoço presos a uma cama (o desconhecido emite um brilho ofuscante, uma estranheza que não desperta a devida atenção dos samurais – apesar de que há uma sucessão de coisas incomuns acontecendo).
Ao deixarem o castelo, Shinsaku e Kogorou são transportados para uma história alternativa do Japão – três anos à frente –, em que a população é explorada e tem medo de seu soberano. Há um castelo de arquitetura excêntrica e com canhões apontados para a cidade. Indignado, Shinsaku decidi ir até um castelo suspeito e duela com Toshizou Hijikata, sendo posteriormente convidado a entrar na residência fortificada.
Esta primeira amostra de Bakumatsu aponta uma diferença importante para o game: a ausência do enredo otome. A única personagem feminina – que deve ter certa relevância na trama – é a ninja que se apropria do estranho relógio de bolso. Talvez haja romance e um harém reverso, porém com os acontecimentos do episódio a aventura, com lutas de espadas, e o mistério, com os motivos políticos para o uso da relíquia e o próprio poder do artefato, devem tomar o primeiro plano.
Um anime “histórico” com viagens no tempo, lutas de espadas com uma coreografia pouco empolgante e uma coleção de personagens, que leva a desconfiança de que desenvolvimento de características não o forte do anime, essa é a impressão causada por Bakumatsu.
E considerando as personagens, elas são apresentadas de maneira abrupta e ligeira, é difícil guardar rostos e nomes. Os samurais que movimentam o episódio são uma dupla clichê, com Shinsaku sendo o habilidoso impetuoso e Kogorou o mais centrado, que, no entanto, está sempre apoiando à impulsividade do amigo. Quanto à ninja, que já deve estar usando o poder do relógio – ou o líder do clã para o qual ela trabalha –, provavelmente ela levará algum tempo para ser descoberta.
E sobre as viagens realizadas com o relógio de bolso, fica a expectativa de que não sejam tantas as linhas de tempo (ou com mudanças constantes), para que não haja reformulações que coloquem um enredo já frágil a perder-se em lacunas e labirintos devido aos seus excessos – somando-se aí a galeria de personagens.
O contexto histórico é confuso e sua premissa – com os inescapáveis saltos temporais – não colabora muito na equação, a animação é inconsistente e a trilha sonora não se destaca, mas o design de som e o trabalho dos dubladores merecem louvor – ainda que não sejam excepcionais.
Resta esperar o desenrolar do imbróglio, pois ainda tem a aparição de Ryoma Sakamoto, e que chegue minimamente a algum lugar – com coerência e sentido. A estreia de Bakumatsu não ajuda nessa expectativa, com um ritmo pouco envolvente, ação desinteressante e (para enfatizar) excesso de personagens.