Quando não há cenas de ação, ou não há muitas, a qualidade geral do anime de Tokyo Ghoul:re melhora. O maior dano é se a trama em si tem seus problemas – bem o caso desse episódio. Não bastasse uma kagune gigante ter arrasado Tokyo, agora humanos também estão virando ghouls, provando daquilo que era necessário para se colocarem no lugar do outro. Mas isso era mesmo necessário? Fica o questionamento, e é hora de refletir mais sobre ele aqui comigo no Anime21!

A conversa com a Rize é o que inicia o episódio. Um dos muitos momentos da obra nos quais nosso herói, Kaneki Ken, entra em um conflito psicológico cuja resolução definirá seus passos adiante.

No anime, contudo, esses trechos têm sido pouco ou mal aproveitados, mas não foi tanto o caso dessa vez, já que o personagem foi capaz de se confrontar sobre o que realmente importava: se assumiria as coisas que fez ou desistiria de vez – só que para isso, acordar para algumas coisas era necessário.

Só eu vi um simbolismo com o feto no útero? O Kaneki “renasceu” depois disso, né…

A verdade é que o que aflige o Kaneki é bastante comum a maioria das pessoas. Ele sempre quis não se sentir sozinho, sempre quis se sentir útil para alguém. Viver de verdade para ele sempre significou ter um propósito – propósito esse conferido por quem estava ao seu redor.

E o que somos nós senão monstros ávidos por razão, por justificativas? Essa é um modo de aplacar a solidão? De se convencer que há um modo de ser feliz, ainda que sobre vários percalços?

No final das contas, o Kaneki sempre quis ser feliz, e a felicidade dele dizia respeito diretamente a felicidade daqueles a sua volta. Se isso é egoísmo, acredito ser de um tipo muito aceitável.

Mas há um certo probleminha nisso tudo. Como o ideal dele se choca com o real e no que isso infringe o bem-estar de sua felicidade. Além disso, ele é um ser fundamentalmente hipócrita. Mas quando não se é? Como viver sem lidar com contradições?

Mesmo com o downgrade da série, a Rize é uma personagem que sempre dá aquele up!

Ele não queria matar humanos, era algo que ele temia. Mas ele já havia matado ghouls e não é como se o Rei de toda essa raça achasse que o valor da vida de um humano fosse maior que o valor da vida de um ghoul, não é? Ou ele não deveria pensar assim, e nem acho que ele pense.

E é até por isso que ele decide voltar para o mundo real, emergir a superfície para encarar a burrada que fez. Como o que ele é, como um adulto. Como alguém que temia matar do outro lado por isso invalidar o seu discurso de união, mas que deve assumir a responsabilidade por ter feito isso e, ainda assim, buscar promover o discurso que ele mesmo deixou de seguir à risca em um momento de cólera.

Ele falhou sim, falhou feio, mas fugir agora não resolveria nada, só jogaria fora a felicidade que ele cultivou e não percebeu que tinha. E, por isso, ele acorda de seu sonho com sua algoz e companheira para encarar a vida real.

Entre a quase ex e a esposa, o Kaneki ainda podia ter alguma dúvida?

Já passou da hora do protagonista desse conto épico, outrora tragédia, se esconder nas sombras dos seus erros, se blindar por trás de seus fracassos. É por isso que ele acorda, mais uma vez “diferente”, e quer ver como está o mundo lá fora para entender o que ele pode fazer e o que precisa ser feito.

É essa a melhor forma de lidar com todo esse problemão, para fazer jus a confiança depositada nele e pavimentar o caminho para a sua própria felicidade – para que ele seja capaz de usufrui-la.

Contudo, não é como se a criação forçada de um dragão não criasse consequências, não é? Se os humanos são criaturas egoístas por natureza, não é incomum que só entendam a dor do outro ao serem colocados no lugar dele.

É bom se colocar no lugar do outro, não ser jogado nele a força…

O problema é isso acontecer logo após uma aliança um tanto quanto forçada entre os lados e não pararem para dar explicações que façam o mínimo de lógica. Se o número das células RC pode ser aumentado de modo viral(?), então o que os ghouls realmente são? Seriam eles mutações dos seres humanos?

Como a biologia pode “explicar” melhor isso tudo? Há tempo para explicar e se há, há uma boa explicação? Da forma como foi feito me pareceu conveniente demais. Okay que esse era o plano magistral do irreverente e sem noção Furuta, mas será que não havia uma forma de fazer isso que soasse menos artificial?

Como dar um espacinho para esses casos – ou casos que viriam a se tornar o de humanos que viraram ghouls – ao longo da trama e só agora fazer com que acontecesse, ou ir desenvolvendo melhor a possibilidade disso acontecer. Não é como se a declaração do Arima já fosse foreshadowing suficiente para o que seria um bom plot twist na trama, mas foi jogado em tela.

O pecado foi esse. Novamente, o que ocorreu foi bastante interessante, mas a forma de dar base aos acontecimentos foi incompatível com o produto final. Eu acho isso uma pena, mas é dessa adaptação mesmo.

No mangá acho que isso é melhor feito, mas ainda sofre do mesmo problema de parecer um pouco forçado demais. E agora só restam dois episódios até o final, então não duvido ignorarem toda a “explicação científica” para focar nas lutinhas mal animadas que diminuem a “qualidade” do anime.

Além disso, o Kaneki agora virou um anjo – será que o mestre dele se chama Kurosaki Ichigo? – e vai, com toda a certeza, usar essas asas para finalmente alçar voo até sua liberdade. Sendo exatamente o que vai acontecer ou não, é certo que é mais um simbolismo do autor da obra.

Mas não seria melhor focar em resolver os problemas de uma forma mais “realista”? Só que esse realismo combina com o conto épico que é Tokyo Ghoul:re? Não sei, mas sei que até posso dar um descontão a mais uma das transformações de protagonista de battle shounen do Kaneki, só não posso deixar de lado o péssimo trecho em que ele vê o Hide e os dois conversam – okay, péssimo enquanto adaptação, ruim isolado.

O roteiro em si não é ruim, mas a situação é toda desenvolvida de maneira pobre. Não tentam apelar para o lado emocional do telespectador. E o pior é que isso até é “coerente” visto a forma seca com a qual reintroduziram o personagem do amigo investigador na trama.

Se você viu só o anime não deve saber que o Kaneki, após empatar com o Amon e antes de ser “morto” pelo Arima, se encontra com o Hide no subterrâneo e lá acaba se alimentando de parte do rosto dele para sobreviver.

Daí o amigo desaparece e há toda uma questão de ele estar vivo ou não. São dadas pistas de que ele está morto e são dadas pistas de que ele está vivo, construindo um jogo psicológico no mangá que foi ignorado no anime.

Mas até aí “tudo bem”, minha reclamação nem é essa. É só que faltou trabalharem a situação deles dois para que agora ela tivesse peso dramático. Não teve, foi apenas um reencontro sem graça.

Quando você não é entrevistado em rede nacional por ter se acabado por conta do cigarro amigo.

Sem graça, sem carisma, como o anime é na maior parte do tempo. Esse episódio foi mais ou menos, a conversa com a Rize – que, na realidade, é mais o subconsciente do Kaneki do que os resquícios da personalidade dela que vieram de brinde com a kagune transplantada – foi um momento muito bom, depois ele caiu de qualidade.

E eu não sei bem o que pensar do Furuta, mas quero ver como o anime o retratará “sério para valer” pela primeira vez, e se seguirá “fielmente” o mangá nesse desfecho. De toda forma, há pouco tempo para fazer algo que preste com essa adaptação monstruosa – bem mais monstruosa que a natureza dos humanos que estão se transformando em seus próprios “monstros”.

Quando você é entrevistado em rede nacional e é garoto propaganda da colgate.

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