“Poxa, como esse filme é bom”, é esse tipo de frase que vem a sua mente quando você assiste a uma adaptação para live action como foi essa de Bleach. A película é uma produção original da Netflix, e é ótima, pois diverte e é muito bem produzida em praticamente todos os aspectos. O filme é dinâmico, seu roteiro é enxuto, mas coeso. A história de Kurosaki Ichigo ganha os televisores com atores reais e um dos shinigamis mais famosos do Japão está pronto para encantar o público outra vez.

Bleach foi, ao lado de One Piece e Naruto, um dos três dos maiores battle shounens do século XXI, no entanto, a obra perdeu muita popularidade em sua reta final e o mangá acabou em baixa. Não houve adaptação em anime que contemplasse todo o material original, e o desgaste da própria fanbase era visível até para um observador neutro como eu.

Minha experiência com Bleach é meio torta, li quatro volumes do mangá há uns 10 anos e vi vários episódios dublados do anime na saudosa Play Tv, mas é com grande carinho que me recordo de algumas de suas aberturas e encerramentos – as músicas são maravilhosas, né. Aliás, difícil citar um anime do estúdio Pierrot com trilha sonora ruim. Desconheço!

Enfim, o filme mal começa e em 15 minutos o plot base já está montado. Rukia é uma shinigami, uma ceifadora que tem a missão de exorcizar hollows, espíritos vingativos, e acaba passando seus poderes para Ichigo, um garoto que, é claro, tem uma predisposição para enxergar e lidar com o sobrenatural. Sim, você já deve ter visto ao menos um par de histórias com essa premissa. Chega um forasteiro que vira o mundo do protagonista de cabeça para baixo e a partir daí ele precisa dar conta de um bocado de problemas.

Bleach não foge a isso, mas a forma dinâmica que apresenta os personagens para logo os colocar em meio a ação torna mais fácil digerir um modo tão clichê – simplório – de desenvolver o enredo. Tirando a velocidade com a qual a Rukia dá algumas explicações, a apresentação de cada um dos personagens diz de forma sucinta como cada um é, qual é a relação que tem com o protagonista.

Tudo ocorre rapidamente, mas o filme não pula etapas, só as resume, e a quebra do cotidiano é bem explorada já que o Ichigo vai constantemente se envolvendo em algo que tem que fazer com a Rukia, mas do qual seus amigos não podem saber. Confesso que esperava um pouco mais dos coadjuvantes amigos do Ichigo, ao menos alguma cena mais longa com eles para reforçar como a vida dele mudou, mas, por outro lado, é na interação dele com a Rukia que o longa brilha.

As irmãs dele são umas fofuras! ❤

O que a levou a tornar Ichigo um shinigami vai ficando cada vez mais claro sem que isso precise ser dito em tela. Ela queria salvá-lo do hollow que o perseguia, mas também queria experimentar da vida humana, da liberdade, daquilo que jamais poderia ter como uma entidade sobrenatural. Acho isso melhor que apenas o “altruísmo” puro e simples.

Aliás, o próprio Ichigo também demonstra personalidade nesse sentido, pois ajuda os espíritos e as pessoas que encontra por aí, mas não é um herói da justiça por natureza, só um garoto que tem um bom caráter. Essas coisas quebram um pouco o clichezão do plot, aguçam o interesse do telespectador por como será o final do filme, ainda mais após a inserção dos antagonistas e o arco de treinamento agitado que movimentou a película e justificou o desenvolvimento dele como guerreiro.

Tem como não adorar a super talentosa Hana Sugisaki? Se tem eu que não quero saber.

Byakuya e Renji representam a Soul Society – a Sociedade das Almas – e é inegável a predileção deles pela Rukia, pois dão a ela muitas chances de se redimir ao longo do filme – ameaçando sua vida só de boca. Não tenho muito o que elogiar da atuação dos atores ou da participação dos seus personagens na trama, mas gostei do Reiji – até onde lembro no anime ele é louquinho pela Rukia – ter sido hostil e do Byakuya não ter sido caracterizado como vilão.

O “potencial” de comédia romântica do filme foi completamente deixado de lado, mesmo com a paixonite indecisa da Orihime, e os shinigamis foram devidamente humanizados. Aliás, achei uma pena os hollows não serem personagens de fato, agindo como ferramentas de roteiro, um meio em prol de um fim. Mas curti a inserção de outros shinigamis, porque abriu o caminho para uma continuação sem prejudicar o fechamento que precisava ser dado.

Aliás, o ator que faz o Byakuya é o MIYAVI, proeminente músico e ator japonês que se lançou para o mundo da arte em uma banda de visual kei que eu adoro, chamada Dué le Quartz, e desde então só é cada vez mais bem-sucedido, tendo atuado em filmes hollywoodianos como Unbroken e o último do King Kong. Enfim, esse é o MIYAVI, um dos japoneses mais influentes e bem-sucedidos da atualidade.

Os fãs do MIYAVI só pensam na bankai dele. Veja por si mesmo!

Voltando ao que mais importa, o laço criado entre o Ichigo e a Rukia é legal, porque só se estabelece na base das adversidades, e só após ele ver o que ela estava tentando fazer por ele. Seria até leviano virar as costas para ela na situação em que estava e isso tocou no drama pessoal dele: sua culpa pela morte da mãe.

É claro que a culpa não foi dele, mas ao remoer isso desde a infância e se ver em uma situação parecida o normal era que seu trauma o assombrasse e ele buscasse “corrigir” seu erro. Não acho que uma atitude diferente combinaria com a personalidade dele. Ichigo não é de “fugir da raia”.

Quando o arco de treinamento é bem-feito o protagonismo surte efeito.

Não ficou claro se havia algum motivo por trás das ações do hollow, porque ele não se comunicou de maneira mais objetiva, mas tudo que o Grand Fisher fez movimentou a trama, até aproximou o Uryu do Ichigo e inseriu uma subtrama envolvendo os shinigamis e os quincy. O extermínio do passado vai escancarar outros problemas da sociedade dos shinigamis, evidenciando sua “podridão”? Ou será só uma desculpa para o aparecimento do arqueiro?

Só saberemos em uma possível continuação. O bom foi que o Uryu não apareceu apenas para encher linguiça, mas ajudou o Ichigo na batalha final. O que gostei muito, porque apesar do Ichigo ter dado o golpe final não ganhou sozinho, tendo dificuldades para atacar o hollow. E nem foi só isso, o desfecho da situação em si foi mais uma derrota que vitória.

Quero ver mais dessa dupla no arco da Soul Society, hein!

Ichigo derrota o hollow, mas é escorraçado pelo Byakuya, mais uma vez fugindo um pouco do clichê, ainda que a luta dele com o Renji tenha sido tudo isso e mais um pouco. Sua vontade de se reerguer para proteger a Rukia foi bonita e fez todo sentido de acordo com o desenvolvimento da relação dos dois, além de ter sido seu último movimento para se libertar da culpa.

Não ter conseguido fazer isso dá a ele a chance de se curar de seu trauma de outra forma ou se tornar mais forte para só assim ser capaz de proteger as pessoas importantes para ele. Creio que será o segundo caso e acho uma pena, porque o primeiro seria mais interessante. Isso se tiver continuação, mas foi sucesso, então deve ter.

As qualidades morais do Ichigo estavam no lugar desde o princípio, ele só precisava ser posto contra a parede para isso ficar ainda mais claro. O treinamento foi importante para ele não apanhar feio no final, ou não mais que aquilo, e a partida da Rukia não jogou fora tudo o que eles viveram, afinal, foi por um detalhe que ele foi capaz de lembrar. Ficou na cara que ele lembrou e só não teve cliffhanger mais contundente para fechar, porque vai que o filme seria um fracasso, né?

Curto o trabalho do Sota Fukushi desde que vi os filmes de Strobe Edge e Sukitte Ii na yo.

Em todo caso, Bleach é um ótimo exemplo de filme divertido, simples e que entende bem a sua proposta e a executa com o esmero esperado para uma produção da Netflix. Roteiro, direção, trilha sonora, fotografia, atuação, efeitos especiais, cenas de ação, etc; tudo é ao menos bom o tempo todo e Bleach transita entre os clichês e a dose de conteúdo distinto que qualquer pessoa pode esperar de um sucesso massificado.

Que outras aventuras envolvendo hollows e shinigamis Rukia e Ichigo reservam para nós? Eu não sei. Na verdade, tenho um palpite, pois vi tanto o arco seguinte da obra na Play Tv, como citei antes, que até sinto certo hype pelo que podem adaptar. Se ainda não viu Bleach, veja, não deve se arrepender!

Nunca é um adeus. Não para uma franquia de sucesso…

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