A Pequena Sereia é um clássico conto de fada, conhecida, principalmente, por sua versão da Disney. Esse anime é uma versão japonesa produzido pela Toei em 1975, 14 anos antes do Mickey fazer o mesmo. E ela expressa muito bem a diferença cultural existente entre Japão e Ocidente com relação aos conteúdos infantis.

 

 

De cara, o que chama atenção é o fato das sereias serem representadas em sua forma mais “original”, ou seja, sem o top, deixando seus seios à mostra. Importante ressaltar que em nenhum momento isso é utilizado com conotação sexual, pelo contrário, é algo completamente natural, uma nudez. É algo que está orgânico na obra, não é utilizado nenhum ângulo incisivo para focar nisso. Os seios só aparecem quando ocorrem movimentos naturais.

Narrativamente, isso funciona como mais uma demonstração de diferença entre o povo do mar e o povo da terra. Enquanto um utiliza muitas roupas para cobrir seus corpos, o outro tem uma relação liberal, não sendo estranho andar sem roupas.

Culturalmente essa questão diz bastante. É inconcebível pensar que um desenho ocidental com classificação livre iria mostrar nudez, mesmo que sem nenhuma conotação sexual. Em relação a isso, o Ocidente tem muito pudor, principalmente quando se trata de um produto infantil. Já no Japão, a relação é muito mais natural, ao ponto de Ningyohime mostrar às sereias em seu modelo mais “original”.

 

 

O animê é extremamente divertido. Eu sou suspeito para falar porque sou apaixonado pelos animês da década de 70. Pelo fato da mídia não estar estabelecida e ainda buscar uma forma final, existia muita experimentação e um foco grande em divertir, mesmo que isso trouxesse problemas de enredo. E Ningyohime segue essa regra. O ritmo é muito bom, sempre jogando a história para frente, com acontecimentos importantes, dando uma dinâmica excelente.

Já que entrei na questão técnica, a trilha sonora é algo que merece destaque: é excelente, tanto as músicas de fundo, como as principais, que são entoadas pela Marina, a protagonista. É preservado um quê de mar, tanto na calmaria, como na tempestade, com muito uso de harpa e piano. As músicas com voz tem uma levada muito boa, são agradáveis de ouvir.

 

 

Outra questão que evidencia a diferença entre Japão e Ocidente é a presença clara de sangue e dos golpes nas lutas. As duas sequências de ação são bem bacanas, em especial a do fundo do mar, e não há nenhum recato em mostrar o golpe sendo desferido e o sangue que resulta. Novamente, algo inconcebível em uma obra ocidental para crianças. Mas que, no Japão, é algo aceitável.

Essa diferença é resultado da forma que os povos tratam as crianças. No Ocidente existe um cuidado muito grande com o que pode e não pode ser exibido para uma criança, porque existe a visão de que ela é muito vulnerável e pode acabar sendo afetada negativamente por aquilo. Daí temos como resultado a Lei que, na prática, proibiu a publicidade infantil, o que varreu os desenhos da TV aberta. No Japão, as crianças são tratadas como pessoas que não precisam desse cuidado todo. E é sempre bom lembrar que os pais existem para cuidar dos filhos. Ninguém é obrigado a assistir determinado desenho. Se o pai considera que aquilo não é bom para seu filho, basta não deixar que ele assista. E essa visão de mais liberdade que acaba possibilitando a existência de obras como Ningyohime.

 

 

Voltando ao enredo, como dito anteriormente, existe um problema: o gato. O gato é peça fundamental no desenvolvimento da história e o principal responsável pela tragédia final. Mas fica a pergunta sem resposta: por que o gato odeia e quer matar a Marina? A minha interpretação é a rivalidade natural: o gato é predador do peixe, afinal, a Marina é uma espécie de peixe. É um argumento bem frágil, mas, por ser um conto de fada para crianças, eu aceito tranquilamente desde que a história me proporcione diversão. E adorei a experiência de assisti-la.

 

 

Ningyohime tem o grande mérito de seguir a história original e terminar como uma tragédia. Coisa que a Disney não teve coragem de fazer, afinal, é muito mais fácil fazer um happy ending. E, novamente, vem a questão cultural. O Ocidente nunca iria entregar um final triste que pudesse traumatizar o seu frágil público.

 

 

E a mensagem do movie é bem interessante: cuidado com o amor (principalmente as paixões à primeira vista) porque ele pode trazer graves problemas. Se entregar é bom, mas é preciso cautela. E, no fim, não vale tudo por um amor, porque você pode acabar morta. É o famoso: se ame primeiro antes de amar o outro.

Sayonara. Bye, bye o/

 

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