Bem vindos a mais um anime de pouca abrangência, não por ser ruim, mas apenas por ser um daqueles que ninguém viu, e se viu, não se lembra ou se já se dissolveu entre tantos outros que se acumulam nessa jornada sem fim de consumo do tempo e da vida rumo ao nada.

 

 

Amanatsu é um OVA, assim como tantos outros que aqui já resenhei, e como sempre, os convido a assistir esse singelo e pacato anime de pouco mais de 14 minutos. Tá, na verdade ele não é pacato, é trágico, triste e melancólico. Vamos à obra.

Amanatsu é um anime lento e narrativo, ele tem por objetivo mostrar o recorte de uma situação desoladora em relação a protagonista, que no caso, chamasse Amane Makimura. E sim, é apenas isso, é um segmento que descreve resumidamente quem é essa garota.

Amane é uma estudante adolescente, não sabemos a sua idade precisa, mas podemos deduzir que está entre os 14 a 17 anos, e sem qualquer novidade, descobrimos que é uma jovem inferiorizada e diminuída, ou mesmo violentamente agredida, pelo seu ambiente de entorno.

 

 

Ela sofre bullying devido a um evento que não está sob seu controle, mas que diz respeito em absoluto em relação a sua vida. Seu pai, a única outra pessoa que parece estar presente e ao seu lado, tomou uma decisão controversa, e isso implodiu a estabilidade de sua jovem filha.

A única outra pessoa que a acompanha, é o seu fiel e solícito robô, que não apenas representa o único laço de amizade em todo o desdobrar dessa situação, como já vem zelando por Amane desde o começo de sua infância.

Sim, o robô de Amane, o qual considero uma pessoa em essência, apesar de ser uma máquina, representa a paternidade e a humanidade frente a uma solitária e completamente impotente jovem refém de um mundo impiedoso.

 

 

Amane está diante de uma cidade, de uma realidade teatral. A cidade na qual reside aparenta ser o ápice da tecnologia e da prosperidade, no entanto, pelas bordas descobrimos que os entornos desse domo artificial são preenchidos pelos escombros e pelos pecados.

O oásis da falsidade luminosa que ordena a estéril e desumana república onde nenhum outro humano mostra a face. Ou melhor, apenas o seu pai, Souichi, abandona a máscara da hipocrisia e trai o país do qual é cidadão.

Sua traição consiste no vazamento de informações militares e segredos de estado para os inimigos, ou oponentes externos não especificados, que estão, por bem ou por mal, em conflito direto com esse país artificial da modernidade.

 

 

Toda a dimensão do progresso sustentado pela decadência do entorno, é bem representada no estado de espírito da arquitetura do local, ou mesmo no semblante puramente cético de Amane, uma garota que perdeu a capacidade de ser feliz.

A atmosfera e a luminosidade sombria, ou mesmo a secura das ruas e dos prédios massivos, tudo indica um completo vazio de aparências, uma cidade morta. Mas Amane, uma adolescente, e nada mais do que isso, contempla esse deserto com uma atitude clara em mente.

Fugir pode parecer tolo e fútil, mas cruzar a fronteira da realidade que a circunda é a única coisa que pode fazer frente a essa situação. Não tem ninguém, para além de seu protetor gentil e robótico, que possa lhe guiar.

 

 

No decorrer dessa jornada de fuga, descobrimos a dor e a amargura de Amane, que nada pode fazer em relação a sua situação, e a qual até mesmo acaba por desabafar com violência para com o robô que a acompanha.

Por outro lado, enquanto vaga, Amane não tem ideia de que até mesmo o seu robô, que por extensão dos atos de seu pai, e como propriedade deste, é alvo de investigação. Ele a acompanha e a protege, mas quando acuado pelos agentes militares, nada pode fazer.

Amane é abordada, e o seu robô, amigo e única família que ainda possui, que estava acessível, é levado, confiscado, a deixando absolutamente só. Ela não tem qualquer valor para os agentes que a deixam por conta própria sem nem olhar para trás.

 

 

O maior trunfo do OVA, seu clímax e o seu valor, se apresentam exatamente nesse instante. A beira de uma ação fútil da qual nem mesmo tem vontade de cometer, e desiste imediatamente, Amane é agraciada com a mesma ação, mas por parte de seu cuidador, o robô.

A bela cena onde a máquina se arremessa pelos céus em direção a morte, apenas para consolar, oferecer alento e esperanças a sua não apenas dona, mas centro de sua existência, é incrivelmente bela. Em imagens holográficas, apreciamos a vida do robô, de Amanatsu, se assim quisermos o chamar, e a sua vida, é a vida de Amane, é o registro de seus sentimentos, de suas memórias e lembranças, de tudo o que ela é.

Ele era tudo o que ela era, e isso motiva a pobre garota a seguir em frente, mesmo que sozinha, a viver, mesmo que ainda imersa em desespero.
Por fim, não sabemos se essa cúpula maquiada de sociedade sobreviveu, ou se foi obliterada da existência, ou se Amane, sobreviveu, ou se foi vítima da retaliação da guerra, mas sabemos que ela viveu, e sabemos que ela foi amada.

 

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