Jashin-chan Dropkick mantém-se firme em sua crítica social, examinado o lado B (bem evidente) da sociedade japonesa.  Desta vez, sem índices para sustentar as sequências de dramédia, mas com o trabalho em foco e alguns elementos que o acompanham, e, de quebra, expondo certos comportamentos nocivos, como os de golpistas e de fãs obsessivos. Se o episódio anterior contrapôs a experiência de Minos e Pekora com a labuta diária, o décimo episódio mostra a anjo perdendo dinheiro e reconquistando sua fé em seus valores angelicais, com o trabalho como intermediário dos sentimentos que vivencia. Ainda tem um esquete com Medusa declarando novamente seu amor por Jashin-chan. O episódio é divertido (garantindo boas risadas e um pouco de reflexão), funcionando em suas pretensões, com um bom desenvolvimento de algumas das personagens, principalmente de Pekora e Poporon.

No episódio, tem-se a volta da metalinguagem, um pouco esquecida nos últimos capítulos, com Jashin-chan tentando mudar o conceito da série e encontrando sempre uma resposta negativa. Desse modo, há referência a alguns animes populares, de sucesso recente, como Shokugeki no Souma e Shingeki no Kyojin. São inserções interessantes, que seguem a qualidade das citações anteriores e da quebra da quarta parede, vista principalmente nos episódios inaugurais.

Jashin-chan se divertindo com os animes de sucesso.

O primeiro esquete traz a assalariada Pekora feliz com a oportunidade de adquirir algum conforto material e alimentação decente. O problema é que o entusiasmo da anjo a faz tropeçar e o dinheiro entra direto na caixa de duas jovens que pedem doações para uma instituição que cuida de crianças abandonadas. Em desespero, ela ensaia recuperar o seu salário, mas não tem coragem de desfazer o equívoco diante do bem que acredita estar realizando e do sorriso das garotas, que a chamam de anjo.

Pekora perde seu rico dinheirinho para a sua distração e para duas trambiqueiras.

Depois de um momento de condenação e autopiedade, Pekora decidi ir a um restaurante, no qual encontra Jashin-chan. Lá, ela descobre que caiu em um golpe, que as jovens se fingiam de voluntárias para aplicar a sua ação ardilosa. Um duro revés para a faminta e trabalhadora anjo. A sequência aborda uma questão séria, a de como pessoas bem-intencionadas acabam sendo enganadas por fraudadores e pilantras, mas o riso que provoca envolve o termo “rir para não chorar”. Até Jashin entra na roda, ao pensar que com uma cédula perdida por Pekora em mãos, pagaria o seu jantar, contudo a quantia é insuficiente para cobrir o que consumiu.

O segmento seguinte envolve a produção de sorvete de Yusa e da pequena Kouji. Ao visitar Yurine, Yusa pede que a loli gótica experimente o novo sabor que pretende vender para os humanos, mas a descoberta aterradora que se trata de veneno de basilisco (um monstro mitológico que, ao longo dos séculos, é descrito das mais variadas formas e características, mas cujo veneno é considerado fatal) faz Jashin-chan duvidar do empreendimento, que pode colocar em risco à vida dos humanos. O grande problema, além do próprio produto, e a noção estapafúrdia que Yusa tem sobre o valor econômico de uma mercadoria, quando pensa na quantidade de trabalho necessária para produzi-la. Yusa é uma “cabeça de vento”, bastante distraída e imprudente nos negócios. Outro aspecto de sua personalidade, que suas aparições anteriores não permitem depreender. Essa é a piada do esquete, que, apesar de não ser original, tem sua graça.

A bela Yusa e a sua falta de tino para os negócios.

O melhor segmento envolve Pekora e Poporon, como segurança e idol, respectivamente. Encontrando trabalho para proteger uma cantora, Pekora se surpreende ao se deparar com Poporon, que usa o nome artístico Noelle Amatsuka..

O reencontro delas é marcado pelo autossacrifício de Pekora, ao defender Poporon da agressão de um fã magoado que se considera ignorado pela sua idol (a felicidade projetada no ídolo, e quando não há a esperada reciprocidade, a frágil autoestima responde de modo violento ao que entende como indiferença, não reconhecimento). Aqui mais uma vez o trabalho está como pano de fundo, com Pekora, enfim, feliz, por ter recuperado a sua crença nos valores angelicais. E Poporon se sensibiliza com a determinação de sua senpai, ajudando-a com a conta do hospital. As ações das anjos contribuem para dar novas nuances a personalidade de ambas.

Um reencontro inesperado: a idol Poporon será salva pela esforçada trabalhadora Pekora.

Ainda assim, Pekora permanece como a trabalhadora que não tem uma profissão específica e nem conhecimento técnico ou teórico para conseguir um emprego de excelente remuneração. Porém, vira-se como pode, buscando “bicos” e economizando ao máximo. Apesar disso, Pekora é consciente a respeito da desigualdade e da exploração existente em um sistema que prioriza o lucro e não os trabalhadores. Já Minos (que só aparece no final do episódio) se sente realizada com o trabalho em si e não com os bens e conforto que ele pode proporcionar. São duas visões (e sentimentos) antagônicas sobre o mundo do trabalho, que a série explora ao brincar com os prós e contras do cotidiano do trabalhador.

O último esquete traz Jashin e Medusa envolvidas com amor, ciúmes e chocolate. Com o dia dos namorados se aproximando, Medusa quer que a loira-serpente a ensine a fazer chocolate caseiro, para que ela possa presentear alguém especial. Jashin-chan fica enciumada, mas aceita orientar Medusa, já que a amiga promete revelar o nome do afortunado assim que o chocolate estiver pronto. O final é previsível, com Jashin surpreendida (ou fingindo surpresa) com o gesto de Medusa. Mais um capítulo na relação delas de abuso e reconciliação, além de uma considerável tensão yuri.

Jashin-chan e Medusa em um momento de amizade e romantismo.

O episódio 10 confirma a melhora da série no que concerne ao modo como articula as conexões entres seus personagens e o texto, e evidencia que a mistura pastelão-gore não é tudo que Jashin-chan Dropkick tem a oferecer. Contudo, os rumos do anime contraria expectativas, o que fatalmente gera frustração. Com o placar entre Yurine e Jashin – a respeito das tentativas da demônio em assassinar sua mestra – estável, a falta de sangue pode ser considerado o ponto fraco do programa, a ausência mais gritante. Os últimos episódios são a chance de redenção e são também as derradeiras oportunidades para conferir a simpatia e perversidade dessas personagens angelicais e/ou demoníacas.

Comentários