Happy Sugar Life – ep 11- Amores distorcidos em conflito
Em Asahi, o sofrimento psíquico e o ódio estão em uma conexão íntima e perigosa, dominando o seu espírito, tornando-o uma “bomba-relógio”. O confronto com Satou está próximo, e o seu estado emocional é um fator decisivo, já que a recepção ao seu esforço e do despertar da consciência de Shio dependem da maneira que a criança o enxergará: salvador ou vilão. Agora, Satou é o amor da vida de Shio, a sua protetora e a quem a menina quer proteger. E como as lembranças de Shio não a atormentam nesse décimo primeiro capítulo, ela custará a lembrar de Asahi. Então, como será o ato final de Happy Sugar Life? A tia de Satou ganha uma tremenda relevância na reta final. O diálogo entre a tia e a sobrinha permite sondar melhor a mente delas. Passado, presente e futuro chocando-se violentamente.
E temos o beijo de Satou e Shio para selar o casamento entre elas. E não à toa, ele vem na sequência do (provável!?) abuso cometido pela tia de Satou contra Mitsuboshi. São duas visões sobre o amor: o exclusivo e incondicional versus o genérico, sem barreiras. Sendo que a primeira nasce e procura sobrepor a segunda. Contudo, são duas visões danosas sobre o amor. E elas se amalgamam no corpo do outro, na ilusão do outro. Mitsuboshi revive seu trauma. E Shio inocentemente acredita ter encontrado definitivamente abrigo e devoção (a marca profunda de Shio é o abandono da mãe). Essas composições só podem caminhar em direção à tragédia, já que devoram o que está pelo caminho.
Antes de morrer, Shouko envia a foto que tirou de Satou com Shio para Asahi. O destinatário, já no seu limite, só tem uma pessoa a confrontar e interrogar: Taiyo Mitsuboshi. O contato entre eles é tenso, violento. Os olhos injetados de Asahi deixam transparecer sua perturbação. Com um bastão, ele nocauteia Taiyo. O passo seguinte é amarrá-lo e inquiri-lo sobre o que o rapaz sabe. É desconfortável ver a ameaça de Asahi em quebrar a unha de Taiyo, recorrendo ao mesmo tipo de tortura que sofria do pai.
Senhor absoluto da situação, Asahi ordena a Mitsuboshi que descubra o endereço de Satou, que a cafeteria onde trabalham tem em seus arquivos. Assustado e aliviado, ele cumpre a missão. Porém, em vez de entregar o endereço de Satou a Asahi, Taiyo decide procurar por Shio e resgatá-la (ele acredita estar apto a exercer o papel de cavaleiro na estória).
Se, no fundo – mas bem fundo – havia a vontade de que Mitsuboshi conseguisse superar o trauma e percebesse que seu amor por Shio não passa de obsessão, de algo nocivo e revoltante (em seu desejo de ser purificado pela criança, há algo de impudico), ela morre com suas ações, falas e olhares nesse episódio. Ele se depara novamente com o seu inferno, uma adulta concupiscente.
Satou deixa Shio dormindo e procura a tia para pedir auxílio em seu plano de fuga. O diálogo entre elas é esclarecedor. Não que pensamentos e movimentos já não tenham sido elucidados. Sabemos que Satou não é esquizofrênica e é lúcida quando está diante de situações que podem levá-la a uma armadilha. E sua indiferença em combinação com sua razão quase instrumental é terrível. A sua noção de realidade e os valores são guiados pelo que é doce e amargo. E novamente a metáfora da jarra, que, dessa vez, precisa ser preenchida para que não falte amor. Se Shio vê a jarra no coração das pessoas, Satou a tem como algo a se guardar para si. É uma diferença importante. O amor de Satou é capaz de libertar?
A tia de Satou recebia todos os tipos de pessoa em sua casa, e o que acontecia era ouvido e talvez visto por Satou. E a tese sobre o amor da responsável pela criança proporcionou a ela apenas repúdio, um vazio gritante. Aparentemente, o abuso sofrido por Satou é psicológico, e moldou a sua visão distorcida sobre o amor. A lascívia doentia da tia gerou em Satou o desejo de pureza, de algo absoluto, único e indivisível. Ela é, sim, produto de seu ambiente, mas também uma psicopata, que age para manter o que tem, o seu tesouro. A pergunta, Satou ama mesmo Shio ou ama a consagração de uma ideia que Shio representa ainda é válida.
De qualquer modo, a convicção de Satou sobre o amor é assustadora. Na verdade, a sua moral. E é munida dela que Satou enfrenta a tia e exige que ela se responsabilize ajudando-a a fugir com Shio. A tia de Satou sai do limbo em que estava e torna-se peça-chave para o desfecho de Happy Sugar Life.
A mulher aceita ser cúmplice de Satou, ela ouve atentamente a confissão da sobrinha sobre o assassinato de Shouko – ela não diz quem matou, mas a tia sabe – e colabora nos preparativos para a fuga. Um senão na sequência do planejamento da evasão é a presença de Su-chan – resgatada dos episódios 4 e 5 –, que arranja passaportes falsos para Satou. Ela pode ter seus meios para isso. E Satou, manteve contato com ela esse tempo todo, enquanto lutava para preservar sua vida feliz açucarada?
E quando se trata de parceiros no crime, Satou não é uma perita acima de qualquer suspeita. Kitaumekawa-sensei ainda pode ser um obstáculo. Ao colocar Taiyo na equação, ela permite a Asahi uma pista considerável sobre o paradeiro da irmã. E ao recorrer à tia, talvez tenha acionado a sua maior disputa, já que o amor e seus significados entram em choque.
Com a união entre Satou e Shio selada com o beijo, o que poderá desfazer o vínculo que se fortaleceu entre elas? Asahi olhou demasiadamente para o abismo. E o seu gesto, a sua única e última chance, será o que trará o inferno definitivo a Happy Sugar Life? Como adverte Friedrich Nietzsche, “Aquele que luta com monstros deve acautelar-se para não se tornar também um monstro. Quando se olha muito tempo para um abismo, o abismo olha para você” (Para Além do Bem e do Mal). Eis o dilema de Asahi, delimitar a fronteira entre o amor e o ódio, a justiça e a vingança, o certo e o errado.
O episódio 11 é consistente e a arte continua a oferecer um visual aflitivo e fascinante, como o devaneio de Satou com Shouko, em que ambas caem de um desfiladeiro e a jovem é praticamente engolida por um vazio escuro. Com pessoas quebradas como agentes à procura de alguma felicidade, o lado B da humanidade executado por Happy Sugar Life nos oferece como consolo apenas o desejo de que tudo poderia ser diferente. Mas a vida é tão absurda, que, um dia, o absurdo se revela na vida de modo tão inesperado, que parece ficção, invenção, talvez um anime.