O Shin só vai encontrar sua almejada liberdade ao se defrontar com o irmão, ou com o que sobrou de sua mente, e lidar com seus fantasmas do passado, para assim poder partir em paz em seu plano de morte esperado. É triste, mas é poético, não? E sabe o que é mais legal? A convicção desses personagens, que perderam ainda mais companheiros ante da derradeira batalha, mas não se perderam do objetivo.

86 fala sobre o que de pior e melhor tem o ser humano, e se você tinha alguma dúvida disso, tenho certeza de que chegou a mesma conclusão que eu nesse episódio. Annette sente inveja da Lena por ela fazer o papel de heroína que ela não consegue? Os mandachuvas da República acham mesmo que podem varrer tudo para debaixo do tapete? O Shin acha que a Lena não vai se conectar? É hora de 86 no Anime21!

Foi pelo menos um pouco bombástico tudo que a Annette revelou nesse episódio, mas concorda comigo que a única amiga da heroína ser justamente a cientista filha do cara que inventou o Para-RAID não teria como ser por acaso, né? Sim, soa um pouco coisa do “destino” essa conexão entre ela, o Shin e a Lena, mas, convenhamos, a vida real também não comporta esse tipo de coincidência que parece saída da ficção?

Eu acho que sim, é claro que isso não justifica a conveniência narrativa, mas me faz ver o copo meio cheio, que é toda a frustração que a Annette sente por ter sido medrosa quando criança e ter agido mal com seu amigo. Me parece muito claro que ela joga todas as suas frustrações na Lena por não conseguir ser como ela, por sequer tentar lutar contra a corrente, o que eu compreendo, ainda mais por ser algo vindo da infância.

Não posso exigir de uma criança que tenha o discernimento e a coragem de um adulto, ainda que eu possa esperar que ela se toque de seu erro quando crescer, e é claro que a Annette se tocou, ela se culpa, a questão é, se suas atitudes seriam apenas uma gota no oceano, não tenho como julgar sua conivência. Digo, até tenho, mas sejamos sinceros, o que ela poderia fazer para mudar as coisas? O que a Lena pode fazer?

Na sequência, as verdades que o tio joga na cara da Lena esclarecem isso, que não importa o que ela faça, a situação já passou e muito do ponto em que esforços individuais terão algum efeito, e pior, mesmo que esses esforços se somem a outros e se tornem algo coletivo, não vai dar tempo de salvar as vidas que estão a sua frente e que ela insiste em proteger, que ela precisa proteger, que ela quer muito proteger.

Sendo assim, a verdade é que a Lena não pode fazer nada, ao menos nada que tenha real influência no destino dos Eighty-Six, ela no máximo lutará ao lado deles, como puder, ainda que não esteja ao lado deles de fato. E por que esse cenário existe? Por que esse genocídio estrutural é cometido? Para limpar os genes da falida República ou permitir a prosperidade desse povo? Ou seria os dois, um se aproveitando do outro?

Eu nem sei mais, só sei que sim, também entendo o ponto de vista do tio e as coisas que ele diz porque são verdade. Nações podem até ser construídas a base de ideais, mas logo a história prova que esses ideais podem muito bem ser jogados no lixo se houver uma soma de fatores, estes não necessariamente razoáveis. Vimos isso com a Alemanha na Segunda Guerra Mundial, fonte da qual 86 bebe sem dúvida alguma.

Ainda assim, a Lena segue em sua marcha solitária, que nós podemos até considerar hipocrisia pura, mas, convenhamos, o que mais ela poderia fazer? Se ela não fosse militar se descolaria da realidade, sendo uma militar ela acaba fazendo parte do lado que comete os crimes, que ela pode no máximo tentar atenuar, mas a verdade é que nem isso consegue fazer. Aliás, acho que dessa vez ela entendeu o buraco em que se meteu, né?

Não escrevo isso como se achasse que ela deveria ou poderia ter evitado chegar ao ponto de desespero em que chegou, a questão é que ela não sabia de tudo e tomou umas belas pancadas nesses dois últimos episódios. Em parte por ainda ser inocente sobre assuntos os quais estava na cara que não poderia se enganar, em parte por coisas que ela não teria mesmo como saber, como a história da amiga.

História essa que contextualiza a paranormalidade do Shin, assim como a culpa que o irmão depositava nele, mas que não justifica seu arroubo de raiva, contudo, o humaniza. O Rei pode não ter sido o herói que a Lena pintava, mas também não é só o irmão mais velho que tentou matar o caçula, há todo um contexto por trás de seu erro que eu acredito que será resolvido quando ele se “acertar” com seu irmão, o Undertaker.

Sério, não lembro bem do que acontece na light novel, só que os irmãos realmente se reencontram e a batalha final, tão hypada nesse episódio, é do caralho. Aliás, não posso deixar de elogiar o excelente trabalho da adaptação ao dar tanto tempo aos preparativos e a partida para a batalha final, estendendo assim um pouco o material original (algo que o mangá, que ainda não li, talvez tenha feito) com enorme sensibilidade.

É nesse tipo de episódio que a gente vê como tem gente competente e apaixonada por trás de um anime, capaz não só de transportar uma ideia de uma mídia para outra, mas a conferir personalidade suficiente para contar a história da melhor maneira possível dentro de sua nova realidade. 86 está de parabéns por sua adaptação em anime, pois se o episódio de transição para o clímax foi desse nível, mal posso esperar pelo final.

Eu sei que a Lena não vai atravessar a fronteira e fugir do país antevendo o avanço da Legion e a queda da República, não é do feitio dela fazer isso, como sei que não importa o que ela fizer, ela não conseguirá salvá-los. Sendo assim, do que adiantará lutar ao lado deles? Acho que ficou claro pela própria falta que demonstraram sentir dela. Os Albas e os Eighty-Six deveriam estar juntos nessa guerra desde o princípio.

A verdadeira vingança dos 86 não é permitir o massacre, mas não agir como aqueles que os impuseram uma luta que nunca deveria ter sido só deles. É uma questão de princípios, coisas pelas quais vale a pena morrer e nos esquecemos em nossas vidas cômodas, como o tio e a Annette bem fizeram. É por isso que o Shin fala com tanta convicção que está indo atrás de sua liberdade, pois irá morrer seguindo seus princípios.

E nesse momento ele e seus companheiros serão verdadeiramente livres, já estarão distantes do pior que o ser humano tem a dar para o outro, mas bem próximos do melhor que puderam ser em vida. Uma vida curta, é verdade. É claro que há uma outra perspectiva para esse desfecho, mas quer eles saiam vivos dessa ou não, isso talvez seja o que menos importa, pois, apesar de tudo, tenho convicção de que eles se sentirão vitoriosos no final.

Até a próxima!

P.S.: Agora que o Shin finalmente vai poder se reencontrar com o irmão, nada como uma música que fala de aplacar a solidão, né? Ouça a canção que dá título a este artigo e me veja ser bem-sucedido na empreitada de relacionar minha banda favorita a meu anime favorito de 2021.

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