O que chama a atenção no quarto episódio de Chio-chan no Tsuugakuro é a química entre Chio e Manana. Elas estrelam os três esquetes do episódio e a sintonia entre as garotas rende momentos hilários, comprovando que a série ainda tem o que revelar sobre suas personagens. Então há muito o que se explorar, e mesmo que haja repetição de um ou outro evento, a reação delas ou a solução para a cena podem ser algo inesperado.

Uma situação que gostaríamos de viver antes de morrer… A curiosa pergunta de Manana leva Chio a manifestar um inusitado desejo: o de jogar de volta para o carro o cigarro atirado na rua por um motorista. E a circunstância propícia para realizar essa estranha vontade surgi, mas Chio falha, ficando com a bituca do cigarro em seu poder. Depois de uma discussão sobre a legalidade da posse de um cigarro com sua ponta apagada (no Japão, menores de 20 anos não podem fumar sem autorização dos pais e existem áreas específicas para fumar, incluindo quando se está na rua), Chio e Manana decidem se divertir. Elas realizam uma sessão fotográfica em um beco. Chio faz várias poses enquanto Manana vibra com a oportunidade de zoar a amiga postando as fotos na Internet. Chio está realmente empolgada, e com as fotos se tornando cada vez melhores, Manana também entra na onda. Toda a cena é envolvente e engraçada, com as garotas em êxtase com as posições que fazem e com o que há de extraordinário nas fotografias, com pássaros e um gato a servir como plano de fundo.

Chio-chan com o objeto proibido. Só não vale dar um tapa.

Depois do ensaio no beco, Chio acaba levando o cigarro para a escola. Mesmo que seja uma bituca é um item proibido. Só que elas não contavam com o olfato do professor que sente o cheiro de tabaco. A situação revela como Chio-chan não é 100% contrária em estar em evidência, já que o fato do professor não acreditar que ela poderia ser fumante a faz protestar e criar um pequeno espetáculo constrangedor, dizendo-se ser uma garota má.

Caras e bocas em um ensaio fotográfico num beco desértico. Mais underground impossível.

Ainda que pregue o mínimo esforço, querendo e se dizendo pertencer a faixa das pessoas medianas, Chio não gosta que se tenha expectativa sobre ela ou que a definam. Por isso um rebuliço na entrada da escola é plausível quando ela passa o começo da manhã imaginando o quanto está atraente e parecida com os personagens enigmáticos do cinema e da TV (fumantes) e depois o professor a parabeniza por uma boa ação, por recolher um cigarro apagado da rua.

O interesse nisso é o apelo à contradição humana, que sempre gera a oportunidade de um bom esquete cômico. Chio já demonstrou ser preguiçosa e evitar o sucesso para continuar em sua confortável “mediocridade”, porém tudo que faz é mostrar o quanto é atlética, generosa e inteligente, possuindo todas as qualidades para ser popular. Então, é intrigante ver Chio sair de sua zona de conforto.

Nem Chio-chan resiste a um momento vergonha alheia.

E o cigarro em cena não é agressivo e nem apelativo. Pode-se dizer que há uma censura tácita, já que há uma preocupação em relação ao seu porte. E a última fala é de uma aluna (provavelmente a presidente do conselho estudantil) que se pergunta a si mesma se o professor deveria orientar uma estudante a pensar de modo positivo sobre as coisas – ou pelo menos não negativa –, mesmo que seja sobre cigarro, já que ela é menor de idade.

A segunda parte do episódio temos novamente Andou entre as pessoas que cruzam o caminho de Chio-chan para a escola. O ex delinquente entra de gaito em uma aposta de Chio e Manana sobre o grau de felicidade que o trabalho pode proporcionar. Cem ienes em disputa.

De ex líder de gangue de motoqueiros a entregador de jornal, Andou lamenta as dificuldades que vem encontrando em seu emprego, quando é surpreendido pelas garotas. Manana tenta tirar vantagem, mas Chio convence Andou a terminar a entrega e ainda envolve a amiga no serviço. A grande piada dessa sequência envolve o comportamento de alguns dos clientes do jornal para o qual Andou trabalha, que foram educados durante o Período Showa, iniciado em 1926 e encerrado em 1989. Como a educação era mais rigorosa, com punições físicas, as pessoas que frequentaram a escola nessa era são extremamente severos quanto à impontualidade e o não cumprimento das regras. O mundo contemporâneo de estudantes preguiçosos por convicção em colisão com uma educação austera (até mesmo doutrinária). Chio e Manana sentem isso na pele, sofrendo com a desaprovação dos velhinhos. O cliente mais irritadiço e desagradável fica por último e Chio mostra toda sua a habilidade atlética para realizar a entrega.

O agora trabalhador Andou, presença constantes nas aventuras de Chio.

Um ponto positivo da segunda parte é notar o quanto Chio se esforça para ganhar a aposta. Ela encoraja Andou, fazendo-o acreditar no valor do trabalho e em seu potencial com o objetivo de faturar os cem ienes e tripudiar de Manana em seguida. É uma atitude mesquinha e tem uma boa dose de manipulação em seu comportamento. Mas a personagem não é perfeita, carrega em si as contradições de ser humana. O que Chio faz renova a confiança de Andou, leva-a a ter dinheiro no bolso e proporciona a ela desfrutar de uma oportunidade de debochar de Manana.

Andou realmente admira Chio, que o fez abandonar a contravenção e seguir no caminho da honestidade. Já é a sua terceira aparição, o que pode se tornar cansativo, já que tem o risco de soar forçoso sucessivos encontros.  Ainda há a possibilidade de que sua estima por Chio, demonstrada também pelos infalíveis momentos em que o rosto fica vermelho, evolua para um interesse romântico. Qual será a idade de Andou? Ele liderava uma gangue e os seus membros pareciam ser jovens (episódio 3), o que pressupõe que tenha um pouco mais de 20 anos.

A atlética Chio-chan antes de “pagar” calcinha.

Já Manana não perde nenhuma ocasião de levar Chio ao limite. Ela é do tipo amiga-rival. Enquanto Chio faz de tudo para não aparecer, mas revela suas habilidades em todas as situações em que elas se envolvem, Manana deseja ardentemente a popularidade, mas não tem as qualidades que Chio possui. Há um pouco de inveja e um pouco de ciúme. Principalmente quando ela acredita que Chio possa estar interessado em Andou (é evidente a sua preocupação e descontentamento). Mas quando descobre que a amiga joga simplesmente com o que tem em mãos para vencer, tem a certeza que Chio pode ser ordinária quando quer. E é a mesma percepção que Chio tem de Manana. E as garotas estão bem assim. A química entre elas se refina a cada episódio, elevando o medidor de comicidade.

Poderia ser um momento romântico… Mas, no meio do caminho havia uma aposta.

O último segmento é a prova disso. Infelizmente, a sua duração é bem curta. Recorda o episódio de quando Chio conhece Yuki Hosokawa. Na dúvida, se a popular estudante a cumprimentava ou não, a garota se atira em uma lixeira para verificar se há alguém atrás dela. Manana tenta ensinar uma expressão a Chio que reúne um aceno e um disfarce. Só que a mesma situação se repete. A diferença é que a colega de classe de Manana acredita que ela está passando mal. Manana, constrangida, finge estar com dor de estômago. Entre a vergonha alheia e o apoio a uma amiga em situação vexaminosa, Chio opta pela primeira, abondando Manana. Amigos, amigos, humilhações à parte.

Um episódio que reúne o que Chio-chan no Tsuugakuro vem mostrando de melhor (e ainda revela a calcinha de sua protagonista. Um fanservice desnecessário? Inocente? Uma questão irrelevante?): aventuras absurdas, uma protagonista esperta e simpática, em despudorada sintonia com sua parceira, situações cômicas que mantêm o ritmo (satisfatório do início ao fim) e resoluções que contribuem para a caracterização das personagens.

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