Mahou Tsukai no Yome (OVAs) – E como os tijolos do passado sustentam nossas essências
A ambientação inicial e os detalhes tornam tudo muito interessante sem deixar de ser um pouco caricato (do jeito bom). O clima de magia e a música confluem bem e me levam a uma espécie de déjà vu (no maior estilo de FMA Brotherhood e da alquimia/magia no ar de um jeito atraente). Os personagens apresentados inicialmente são bem marcados por características individualizadas e são até bem heterogêneos, mas apenas do jeito que permite uma boa mistura e não do tipo que atritam (não muito, pelo menos). A estratégia inicial é baseada em muita música épica e demonstrações do universo, tudo muito restrito ainda, mas com bons ares de novidades e surpresas. O nome? Mahou Tsukai no Yome (até rimou, rsrs).
A exploração patente e bem feita dos chamados “vazios” (no maior estilo Miyazaki) só me dão ótimas impressões sobre tudo. O ímpeto de fazê-la aprender (por parte do magus) é notável e parece ser algo muito relevante no arco da jovem. O leve e bem esporádico alívio cômico é muito agradável. Demonstrando uma faceta muito madura por parte da obra.
O livro traça um breve passado: anormalidade, problemas familiares e afins; a aura pesa e os flashbacks continuam funcionando muito bem e bastante rápido. O fato de ela poder ver “coisas” desde pequena com certeza contribuiu para o crescimento dela (e principalmente no modo como as outras pessoas conviviam e lidavam com ela). Fugir me parece ser seu verbo por excelência. Esse arquétipo narrativo da criança me lembra, vagamente, da menina de Inai Machi, mas bem melhor trabalhado e sem aquele nível apelativo (sem ofensas a quem curte, rsrs).
Até que ela encontra alguém que além de poder ver o que ela via, introduzindo-a à Biblioteca da Floresta, ao som de mais músicas instrumentais (elevando todos os sentimentos por lá). Mas como tudo não pode dar certo, senão não haveria nem anime para começo de conversa, outros conflitos começam a envolver a menina e a contrariar suas expectativas. Assim como as do carinha da biblioteca.
As perspectivas e as tomadas dos vastos ambientes naturais também são muito impressionantes. A interação entre os dois nessa segunda parte das OVAs tem basicamente duas funções: criar empatia pela dupla e quebrar nossas expectativas quando a tênue linha se romper completamente. Essa mesma interação desabrochou nela grande parte de sua índole. Esse tipo de pessoa consegue absorver o que há de melhor (mesmo quando isso é o realmente muito ruim). Esse nível de complexidade só dialoga mais uma vez com as intenções dessa série: instigar todos a acompanharem o que com muita certeza um belíssimo anime.
Mahou Tsukai no Yome me faz perceber como uma história tão rica pode ser contada por meio de atitudes ou motivos narrativos simples e dos mais variados. A dinâmica relacional trazida pela obra é bem pautada e consegue mesclar todos os movimentos que precisam ser relatados para mover a trama até onde ela tem que ir. As relações são fluidas, apesar da (dita por alguns) “escassez” de personagens, o que apenas salienta o potencial do anime de maximizar momentos e emoções, prendendo quem assiste. A direção de fotografia faz uma obra à parte. Uma palheta de cores combina muito com a proposta madura de Mahou Tsukai.
Outra importante inferência que pode ser feita está atrelada à paixão da jovem pela leitura e como ela utilizou isso para impulsionar sua jornada e superar os ambientes mais adversos. A cena das criaturas invadindo a biblioteca da floresta e enegrecendo, fazendo perecer toda e qualquer palavra, traça esse paralelo que pega carona numa das intenções primárias do autor: o poder transformador da informação e do conhecimento; mesmo que em um contexto fantasioso, mas nem por isso totalmente inverossímil.
O início da terceira parte traz o peso das decisões e promessas do passado ao presente (em toda sua factualidade e cabalidade). A perspectiva da idolatria (e consequentemente se tornar um prisioneiro de suas intenções/consciências) também é retratada da forma mais “mundana” possível; e os flashbacks concisos e funcionais elencam tudo isso de maneira muito interessante.
Era impossível a não romantização do que ocorreu ao final daquele combate, mas a qualidade permanece alta e atrativa mesmo depois disso. As novas possibilidades que de repente se abrem diante da jovem já a carregam para um novo diálogo com o passado: tempo que rege a obra a essa altura. O encontro no hospital nos traz uma boa amostra do comprometimento do autor com o entrelaçamento detalhado dos eventos compartilhados nessa unidade narrativa. Esse tipo de intricamento aumenta em muito as minhas opiniões sobre a relevância do roteiro.
A estreitíssima relação que Chise cria com seu livro (e o motivo gerador de toda essa retrospectiva, ao colo do magus) alarga-se de uma maneira inteligente e curiosamente molda boa parte da personalidade da jovem aos nossos olhos. O enredo perpassa por desprendimentos, culpas, condutas e escolhas que nos lembram, a todo momento, quem somos e quem queremos ser; a mudança, o progresso e os cenários que levaram Chise a ser quem ela é nós ainda não sabemos (afinal, vender essa perspectiva – e as possibilidades decorrentes desta – é a função dessas OVAs), mas a sutileza disso tudo me envolveu de uma forma muito interessante e surpreendentemente sofisticada.
Essa pequena narrativa me provou que a simplicidade pode ser sinônimo de eficiência (do velho: “menos é mais”); esse prequel eleva o sentimento de desprendimento e alarga nossa curiosidade sobre os rumos que a levaram ao encontro de seu mestre e como a “boa sorte” deixada pelas circunstâncias de seu passado vai encará-la. Para essa possível pérola em forma de anime, minhas mais sinceras 4,0 estrelas (pode não transmitir a realidade factual da qualidade da obra, mas vindo de mim – com relação a esse tipo de anime mais estático – representa muito). E é por essas e outras que pretendo trazer semanalmente pra vocês minhas humildes considerações sobre essa rica animação (esse tipo de coisa que está realmente escassa nos dias de hoje…). Espero que curtam!!!
2 comentários sobre “Mahou Tsukai no Yome (OVAs) – E como os tijolos do passado sustentam nossas essências”