Ataque dos Titãs 3 – ep 9 – Nasce uma rainha
Bom dia!
Ataque dos Titãs não é Ataque dos Titãs sem abusar da nossa suspensão de descrença. Eu perdi quando foi que isso foi dito ou veio mesmo do nada a informação de que titãs anômalos buscam aglomerações humanas?
Sem falar nas várias “apostas” do Erwin, que são na verdade um monte de chutes construídos em cima de outros chutes e excesso de pensamento positivo e que, quando fazemos isso na vida real, sempre dá errado em algum ponto. Porque são muitos pontos para dar errado.
Com o Erwin sempre dá certo e o anime ainda romantiza isso. O Erwin é legal de verdade, mas não seja temerário e imprudente como o Erwin.
Mas qual grande história que não se constrói dessa maneira, não é? Os temas sérios do anime brilham em cima desse pano de fundo quando bem desenvolvidos.
E esse episódio encerrou apenas o seu melhor arco de desenvolvimento de personagem até agora. Então, no que me diz respeito, o Erwin pode continuar fazendo as apostas insanas que ele quiser.
Eu escrevi “melhor arco de desenvolvimento”, mas acho que seria mais preciso ter escrito primeiro arco de desenvolvimento.
Exceto por desenvolvimento de nível de poder, o Eren havia passado antes por qualquer tipo de desenvolvimento? Alguém passou por um arco de desenvolvimento?
Quem chegou mais próximo disso foi a Ymir. E verdade seja dita, foi ela que colocou a Historia em seu próprio arco de desenvolvimento pessoal, o que por sua vez nessa temporada levou ao desenvolvimento pessoal do Eren. Finalmente.
As histórias de Eren e, er, Historia, são contadas de forma similar, deixando os paralelos entre elas em evidência. Os dois são especiais. O Eren pelo poder físico, a Historia pelo poder simbólico. Ambos herdaram o poder de seus pais, sem nada ter feito para merecer. Como não poderia deixar de ser, isso moldou suas vidas.
Eren um dia descobriu que era um titã. Desde criança ele odiava os titãs. Desde antes de sua mãe morrer na boca de um titã ele já achava que a humanidade não podia viver presa dentro dos próprios muros, com medo dos titãs. Sua mãe morrer apenas lhe deu um motivo pessoal para sua crença ideológica.
E esse é o ponto. Eren não estava errado sobre querer que a humanidade fosse livre. Mas o que ele fez para isso, e como ele fez? Já no artigo sobre o episódio anterior eu explico como, no mais das vezes, Eren até agora foi inútil. Muitos morreram por causa dele.
Mas o ponto é justamente esse: frequentemente, quando acreditamos muito em alguma coisa, quando achamos que estamos certos, perdemos todo o resto de vista e deixamos de nos preocupar com efeitos e vítimas colaterais.
Os mais cruéis diriam que, afinal, é preciso quebrar os ovos para fazer um omelete. Os mais cínicos subiriam em cima da pilha de cadáveres que criaram e diriam estar lutando para vingá-los.
Eren desejava matar cada titã, até o último deles. Descobrir que amigos próximos, que Reiner, que considerava como um irmão mais velho e que já havia lhe salvado a vida, era um titã, o confundiu. Enquanto isso, a pilha de cadáveres continuou crescendo.
Quando aprendeu sobre a origem de seu poder ele ficou abalado. Seu pai era um assassino. Ele era uma criança ainda quando viu sua mãe morrer devorada por um titã. Para uma criança, seus pais são o mundo. Quando sua mãe foi assassinada, seu próprio pai se tornou um assassino.
E só por isso Eren tem o poder que tem. O qual nunca conseguiu usar para grandes feitos. O qual, ele descobriu, ele sequer era capaz de usar em sua plenitude. Porque seu sangue, o sangue de seu pai, não presta para isso. Eren atingiu o fundo do poço.
Historia era só uma menina que vivia em um rancho quando criança. Só saiu daquele rancho quando descobriu que seu pai era importante, e que por isso ela também era importante.
Tudo isso aconteceu depois dela assistir a mãe definhar por anos, e finalmente ser morta, abatida como um animal, bem na sua frente. Historia gostava de sua irmã mais velha, mas sua irmã mais velha não estava ali.
Quem estava ali era Rod Reiss, seu pai. Alguém importante. Alguém que nunca deu atenção para Historia e que apareceu naquele dia para matar sua mãe.
Historia se rebelou contra o destino, assim como Eren se rebelou contra os titãs. Ao contrário de Eren, que queria ser alguém, um caçador de titãs, Historia queria ser ninguém. Apenas uma aldeã comum, apenas Christa.
Historia era por direito herdeira do trono, destinada a um dia se tornar rainha, e ela rejeitava isso. Conheceu sua primeira amiga em Ymir, que um dia já havia sido uma pequena rainha de uma pequena seita de malucos de pedra. Em comum, as duas tiveram tudo arrancado delas.
Historia, agora Christa, vivia sua vida contente ao lado de Ymir. Sua vida de pessoa qualquer, uma que poderia muito bem nem ter nome. Elas entraram juntas para a Tropa de Exploração e ela não se preocupava em morrer.
Para Christa, não teria sido ruim se Historia morresse dessa forma. Então ela conheceu a Ymir de verdade, que não lhe mandou viver, mas seu exemplo de perseverança a confundiu. Enquanto isso, as engrenagens do destino giravam.
Historia ficou muito feliz quando Eren disse, com outras palavras, que ela continuava sendo Christa. Nesse momento seus destinos se alinharam e os dois foram raptados e levados para Rod Reiss, pai de Historia.
Quando aprendeu a verdade sobre os titãs e a família Reiss ela ficou abalada. Sua família não era apenas a linhagem real, mas uma linhagem de titãs. E que tinham o poder de controlar todos os titãs. O poder para salvar a humanidade.
Nesse estado, Historia se tornou presa fácil para o discurso de seu pai. Para suas demonstrações tardias de afeto. Afeto sincero? Acredito que sim, talvez não fosse mas acredito que era. Ainda assim, veio tarde. Para Historia, porém, na confusão mental em que se encontrava, bastou.
Ela tinha agora uma família e uma missão! Depois de tudo o que viveu, quem pode culpá-la pelo entusiasmo que sentiu? Quem irá censurá-la por ter desejado ser uma boa menina e fazer tudo o que o papai mandou?
Ymir não censuraria, com certeza. Mas as memórias de Ymir a tiraram daquele transe e fizeram entender o que realmente estava acontecendo. Historia rebelou-se contra seu pai pela segunda vez.
A primeira vez que Historia renegou o pai foi para se transformar em ninguém. Agora, foi porque queria ser alguém. A roda do destino deu mais uma volta e exigiu dela que fosse aquilo que havia recusado antes: uma rainha.
Ela aceitou. Mas em seus termos. Historia aprendeu, afinal, que ela não pode apenas herdar um poder. Precisa ser digna dele. E ela saiu para tornar-se digna desse poder da única forma que sabe fazer: lutando.
Como ela havia dito antes para o Eren, Historia saiu para lutar para salvar as pessoas. Cada uma delas e todas que ela puder. Eren olhou para Historia e reconheceu a verdadeira força nela. A força que sempre lhe faltou.
Não é o caso de que para lutar é preciso estar disposto a dar a vida. Isso é só uma consequência da luta, não a sua moral ou o que a qualifica. Eren queria “libertar a humanidade”, mas muitos morreram por ele, muitos mais do que os que ele salvou.
Talvez fosse chegada a hora de, como Historia, colocar seu poder para bom uso e lutar para salvar as pessoas. Historia inspirou Eren a entender o que ele realmente deveria fazer.
Esse é o papel da realeza: inspirar. Antes mesmo de sentar no trono, Historia já está colocando seu poder para bom uso. E em Ataque dos Titãs não há nada melhor do que fazer Eren, o protagonista, deixar de ser mero soldado e se tornar em herói. Salve Historia Reiss, salve a Rainha!
K
Me pergunto o que é desenvolvimento de personagens pra ti. Assim que Eren morreu, Armin percebeu que era sempre protegido pela Mikasa e pelo Eren e teve que tomar rédeas da situação mais tarde. Assim que Jean viu Marco morto, ele percebeu que entrar pra Polícia Militar seria um ato egoísta, e decidiu ser um herói anônimo. Devo lembrar de como Mikasa desistiu de viver e logo depois recuperou a esperança, assim como no passado, no presente, justificando a obsessão dela? Sem falar na responsabilidade que o Eren ganhou junto com os novos poderes, sendo o “Ás” da humanidade, e que mais tarde influenciaria nas suas escolhas de “acreditar” nos nakamas e não em si mesmo. Tudo isso só na primeira temporada, sem contar dos outros personagens, que desde sempre revelam os temas centrais da obra. Na verdade, agora, nesta terceira temporada, é que a série está mostrando pro que veio. Não à toa há quem diga que esse arco é um dos piores simplesmente por não ter titã, mas é o que sedimenta as ramificações futuras da história e retoma sutilmente alguns pontos temáticos de antes sob outros prismas. Tem de ser muito desapercebido pra alegar que não há desenvolvimento de personagem, ainda mais do protagonista, que só então escancarou a insatisfação com um eu anterior, mas essa insatisfação sempre esteve presente, sutilmente, mas sempre esteve lá. Talvez, deva-se dizer, essa problemática da impotência do Eren tenha se sofisticado ao ver em outros o que falta nele? Não digo nem na questão da Historia. Tem um detalhe no anime que não tem no mangá, mas reforça a ideia de que já pontuou no texto: ele começa a se bater depois de lembrar do fato que se dependesse da Mikasa, ela poderia ter salvo a Carla sozinha; que ela, diferente dele, possui uma força que não é externa, mas dela mesma. Que o Armin, Levi, Mikasa e afins sempre o ajudaram e ele sempre foi dependente deles, até mesmo dos inimigos, nas vezes que o Reiner e o Bertholdt o ajudaram. Isso pra ele é que é inadmissível: o que ele tem não é por ganho próprio, mas graças ao seu pai. Ele mesmo é um ninguém que calhou de ser filho de alguém que tinha capacidade de fazer algo diferente, mas ele não é especial por isso. Em Shingeki no Kyojin, onde qualquer um pode morrer a qualquer hora, de fato, nenhuma vida vale menos ou mais que outra. Tá no refrão da Vogel Im Kafig. Também em “Beautiful Cruel World”, primeiro encerramento, “tese” da Mikasa, mas que é na verdade o grande tema de toda a obra. Guarde-os. Eles serão retomados ao final desta temporada se o Araki chegar lá. Ademais, o Eren que vemos aqui, também o da difamada abertura desta temporada, já prenuncia todo o desenvolvimento que ele teve e terá ainda mais com o decorrer da trama. É só querendo não ver pra não ver.
Fábio "Mexicano" Godoy
Eu nunca disse que os demais personagens nunca tiveram seus momentos. Mas são só isso: momentos. Não são arcos inteiros de desenvolvimento, como o Eren e a Historia tiveram agora (e no caso do Eren é correta a interpretação de que começou na verdade junto com o próprio anime). Antes desse arco, o ponto alto nesse quesito havia sido a Ymir, mas talvez tenha sido má vontade minha com o anime na época, só que não me pareceu algo tão completo e com profundidade como foi agora com esses dois.
Claro que um personagem mudar por algum motivo bem definido e coeso é, em sentido amplo, “desenvolvimento de personagem”. Mas no caso estou falando de “arco de desenvolvimento de personagem”, uma série de mudanças para atingir um fim, não uma mudança pontual.
O caso do Eren é ainda um pouco mais complicado. Ele teve sim desenvolvimento ao longo de toda a série (portanto, seu arco sempre existiu), mas por ser protagonista em alguns momentos sua história se entrelaça com as demais histórias e a parte específica que lhe cabe não parece muita coisa. A sensação é que ele estava apenas ganhando poderes mesmo, o que, convenhamos, é apenas o mínimo esperado em um battle shounen.
Por fim, essa temporada tem conseguido ser boa justamente por ter tido até agora pouco a ver com titãs, e não apesar disso. Eu sei que o que falam sobre o mangá é diferente, mas não é à toa que o próprio Isayama pediu para a produção do anime mudar. Não leio o mangá, mas se esse arco é como dizem, o Wit Studio está fazendo um trabalho excelente. Até agora Ataque dos Titãs era muito “2edgy4u”, por assim dizer, e parecia ser só um conto de como a humanidade é depressivamente atacada por monstros gigantes canibais de aparência engraçada, se levanta contra eles mas daí aparecem mais monstros gigantes canibais de aparência engraçada e eles voltam à estaca zero porque não conseguem combatê-los. Personagens novos são apresentados e morrem em seguida – mas aqueles que sobreviveram no começo e constituem o núcleo da história continuam vivíssimos, o que com o tempo torna a ideia de que “qualquer um pode morrer” apenas uma lenda distante. Os sucessivos fracassos do Eren (que na verdade, descobre-se agora, são fundamentais para seu desenvolvimento) só contribuem para a sensação de que é apenas mais um gorefest. Alguns momentos nas primeiras temporadas se destacam positivamente, claro, mas é a partir do final da segunda temporada e, definitivamente nessa terceira, que Ataque dos Titãs finalmente justificou porque existe, na minha opinião (como todo o resto que escrevo, naturalmente).
Obrigado pela visita e pelo comentário =)
Kondou-san
Poderá parecer estranho, mas eu gostei deste episódio da terceira temporada de Ataque dos Titãs.
Grande parte desse gostar, deve-se à barragem de artilharia vista neste episódio. Me questiono, como as tropas que ficaram fora da muralha, queriam fazer dano no Lorde Reiss, com canhões Basilisk, que eram canhões especificamente para atacar infantaria ligeira. Mas em compensação. os canhões no topo da muralha, esses sim eram a real thing, foi satisfatório ver aquelas dezenas de canhões dispararem ao mesmo tempo. Fica a questão, do porquê de nenhum dos soldados ficar com os ouvidos a sangrar, a terem vómitos e hemorragias nasais, já que em tal ataque de artilharia o som deveria romper os tímpanos e chocalhar os órgãos internos dos soldados.
Na questão dos personagens, gostei bastante da forma de como a História evoluiu, o povo das muralhas, em dezenas de anos de governação da família Reiss, terá agora uma rainha de verdade.
O Eren, eu nunca o suportei, sempre achei os outros personagens muito mais interessantes do que ele, mas neste episódio, ele finalmente entendeu o quão inútil e insuportável ele era, isso para mim já é alguma coisa.
Por fim, o Kenny, o raio do velho não quer bater as botas, aquela caixa de Pandora que ele mostrou no final, com a seringa mágica dos titãs, ainda vai dar mau resultado.
Como sempre, mais um excelente artigo de Ataque dos Titãs Fábio.
Fábio "Mexicano" Godoy
Sem dúvida a Historia foi o ponto alto do episódio. Chega até a ser uma pena pensar que logo ela deve abandonar as linhas de frente e portanto irá aparecer bem menos, mas todo esse arco foi para isso, para dar a ela uma “morte honrada”.
Quanto ao Eren, eu não desgostava dele, mas que ele irritava quando abria a boca e irritava quando se metia em encrenca e dava trabalho pros outros de novo, ah irritava. E acho que foi isso: ele ficou irritado consigo mesmo nesse episódio. Até o anterior ele estava apenas deprimido, mas agora, forçado a viver, porque não dá para ficar parado (foi literalmente o que a Mikasa disse a ele antes de começar a se socar), ele se irritou consigo mesmo. Se socou também para “matar” seu velho eu. Vamos ver em que ele muda.
Aquelas salvas de canhões foram muito bonitas mesmo. E do Kenny preferi não falar nada porque aquilo foi só um gancho pro próximo episódio, esse foi da Historia e do Eren, e só deles.
Obrigado pela visita e pelo comentário 😁
Kondou-san
O Kenny vai dar o que falar no próximo episódio/artigo (isto se o Levi, não o matar antes).
Ainda espero que o anime mostre mais um pouco do passado do Kenny, o personagem mesmo tendo estado no lado duvidoso do conflito, ele é um personagem interessante.
Espero que agora o Eren se torne mais útil e independente, afinal a Mikasa não o poderá defender para sempre (ainda espero o dia em que o Eren, se aperceba que a Mikasa gosta dele).
Fábio "Mexicano" Godoy
Quero saber mais sobre o Kenny. Entendê-lo parece ser importante para entender a família Ackerman, a mesma do Levi e da Mikasa, e aparentemente muito importante nesse mundo.