The Night Beyond the Tricornered Window – O que dá medo, dá medo – Primeiras impressões
The Night Beyond the Tricornered Window (Sankaku Mado no Sotogawa wa Yoru) é um anime do estúdio Zero-G (Grand Blue, Tenkuu Shinpan, Tsugumomo, Doukyonin wa Hiza, Tokidoki, Atama no Ue, Battery, One Room, Rinshi!! Ekoda-chan) programado para 12 episódios que adapta o mangá de Tomoko Yamashita, uma proeminente autora de mangás BL (Boys Love). Segue a sinopse da Crunchyroll (streaming oficial do anime).
“Mikado, empregado de uma livraria sempre tem uma tendência a ver coisas assustadoras. Ele passava sua rotina fingindo que não via nada, mas teve um encontro com um exorcista chamado Hiyakawa que marcou sua vida. Mikado é obrigado a ajudar com exorcismos e precisa lidar com a vergonha de que realizar esses exorcismos com Hiyakawa é realmente prazeiroso. Levado para lidar com esse tipo de caso corriqueiramente, eles encontram um homicídio à sangue frio. Divirta-se com um novo tipo de mistério e terror criado por completos opostos.”
Quem nunca viu um encontro predestinado em uma livraria que envolvesse um fantasma, um médium suspeito, um funcionário tenso e uma aproximação um tanto erótica? É com essa roupagem um pouco diferente do clichê boys meets girl (nesse caso, boy meets boy) que o anime se apresenta contando uma história que realmente é muito mais do que apenas o erotismo que a gente já podia esperar.
Como explicado um pouco mais a frente no episódio, a abordagem erotizada do médium Hiyakawa existe para facilitar a conexão com o meio intermediário que ele utiliza para seu trabalho, e este é Mikado, um jovem que vê espíritos nitidamente, um sensitivo. O encontro dos dois rapidamente inicia uma interação que dá vazão a várias fantasias eróticas que fazem a cabeça das fãs e dos fãs de BL.
Mas sabe o que é melhor? Mesmo sabendo que histórias desse gênero se propõem a explorar esse erotismo, há formas e formas de fazer isso. Por exemplo, a história poderia não fazer sentido algum ou não ser interessante, mas não é o caso aqui, não fica parecendo que as provocações do Hiyakawa são o objetivo, apenas um elemento que atrai público. Como muitas vezes é usado o ecchi ou o gore.
É claro que seguir dicas de internet para agir de forma invasiva força um pouco a barra, mas vendo como a parceria flui positivamente dentro do propósito de exorcizar espíritos não consigo deixar de pensar que esse é um preço que dá para pagar, até levando em consideração o interesse do próprio protagonista na questão. A ele é dada a oportunidade de não se envolver e seguir sua vida como antes, coisa que ele não aceita.
Ao mesmo tempo em que também entendo a personagem se ver encurralada. Sozinho Mikado não entende e não sabe lidar com os espíritos que vê, junto de Hiyakawa ele pode faturar uma graninha enquanto ajuda outras pessoas e compreende melhor a profundidade dos próprios poderes. Porque sim, a roupagem é bem de superpoderzinho mesmo, ainda que eu entenda que ambos são sensitivos em espectros diferentes.
Hiyakawa sabe os caminhos para sincronizar seus sentidos ao de outro sensitivo e usa isso para realizar seu trabalho, o que cai como uma luva e me faz pensar em como ele operava antes de encontrar o protagonista. Já Mikado pode até se incomodar com a “mão boba” do parceiro e as palavras picantes que fala sorrateiramente em seu ouvido, mas esse parece um preço que ele está disposto a pagar pelo bônus.
Por mais que a assertividade do Hiyakawa possa ser questionada, não consigo me aprofundar em uma problematização da interação entre eles visto que o Mikado pode até ser mais delicado (seria ele o uke da relação?) que o Hiyakawa, mas ele também é adulto e um que aceitou esse tipo de dinâmica. Sendo assim, só podemos torcer para a parceria vingar e motivos para o sim e para o não vi um bocado nessa estreia.
Um problema no trabalho que os dois fazem é a impressão de que o Mikado é apenas uma ferramenta que o Hiyakawa passar ao acessar o corpo do colega sempre que vê necessidade, mesmo quando não o prepara devidamente para tal intimidade. Imagino que isso possa provocar atritos no futuro, algo que pode ser evitado ou suavizado, por exemplo, com a inversão da dinâmica comum de utilização da sensitividade.
Se no modo normal é Hiyakawa quem mergulha nos sentidos de Mikado e com isso passa a ver nitidamente os fantasmas que antes conseguia apenas sentir, invertendo esse modus operandi é Mikado quem passa a sentir o que seu chefe sente, se abrindo a possibilidade de conhecê-lo melhor. Mudança de perspectiva essa que só foi possível graças ao desenvolvimento da relação dos dois e da gravidade dos casos.
Nesse aspecto, acho que o anime foi muito bem, pois tanto conseguiu “vender seu peixe” por meio do caso mais pesado que toma a segunda parte dessa estreia, quanto dispôs o fanservice de maneira orgânica ao longo das atividades da dupla, que pode até desenvolver uma relação amorosa propriamente dita, mas acho que seria muito rápido se fizesse isso em um episódio, ainda mais topando com a Erika Hiura.
Outra escolha bem legal e que deu mais seriedade a trama foi a pronta apresentação da vilã, que se só apareceu de fato naquela angustiante cena pós-créditos, esbanjou influência nos rumos do submundo sobrenatural ao se envolver em um caso digno da deep weeb. Esquartejar três pessoas e juntar os pedaços retirados para formar um corpo foi uma reinterpretação moderna do Frankstein também bastante perturbadora.
Mas o melhor nem foi isso e sim o algo a mais que veio com o fechamento desse caso. Com o corpo encontrado não esperava que o Hiyakawa ingeriria alguma coisa na cena do crime, o típico movimento não necessariamente de um vilão em pele de herói, mas talvez de um anti-herói que se não é igual a vilã, também não é flor que se cheire. E por que não me surpreendo com essa construção narrativa da personagem?
De cara o Hiyakawa me pareceu alguém muito a par da situação que tem em frente, muito consciente de seus arredores, alguém que gosta de dominar (olha o seme aí gente), que parece estar sempre guardando uma carta na manga. Será que é por isso que mesmo antes de encontrar o Mikado ele se virava? Não é como se ele dependesse do parceiro, ele o usa mais para expandir seu leque de possibilidades.
No fim, acaba que gostei bastante da roupagem dada as personagens e da interação entre elas, além da pegada, da periculosidade dos casos, ter crescido gradativamente. Okay que o caso do corpo esquartejado é bem mais pesado que os outros, mas, convenhamos, não foi incoerente o trabalho surgir na mesa do Hiyakawa enquanto ele “treinava” seu assistente novato. Ele deve lidar com isso frequentemente.
Se não lidasse não saberia quem é Erika Hiura e o perigo que representa, não à toa parece que ela já matou muita gente, mas ainda se encontra a margem da justiça. Eles seriam os Warren do BL? Eu sei, tenho visto filme de terror demais. Mas mais terrível mesmo foi aquela mão em um péssimo CG já lá pelo final, justificando a celebre frase do Hiyakawa, com a qual não poderia concordar mais, “O que dá medo, dá medo”.
Não precisa de muito para comprar essa ideia, assim como não precisei de muito para gostar desse anime. Sankaku teve um início promissor, tendo no caso dos corpos esquartejados uma amostra instigante do seu potencial. Gostei das personagens, do misterioso médium e do perspicaz sensitivo que pode até ter se metido em uma roubada (afinal, já tem sua primeira inimiga), mas está tentando superar seus medos.
Até a próxima!
P.S.: A título de curiosidade, Don’t Cry, Girl♥ (mangá que aparece em um cartaz em uma cena do episódio) é da mesma autora de Sankaku, só que esse não é BL e sim um romance voltado para o público feminino (meio óbvio, né), o que me dá a impressão de que a autora também é versada em escrever personagens femininas (além de ser mulher, isso ajuda). Só eu que estou empolgado para ver o que apronta a Erika Hiura?